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Erros de estratégia

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Por: António Santos

A atual situação pandémica veio pôr a nu algumas fragilidades do nosso sistema. Eventualmente, poderia ter sido menos penoso para o Estado cabo-verdiano, tanto a nível sanitário como a nível financeiro, se tivesse sido feito um trabalho de preparação para uma situação que, todos nós, sabíamos que, mais tarde ou mais cedo, chegaria a Cabo Verde. Deveríamos ter adquirido, a tempo e horas, equipamentos para que as Forças Armadas de Cabo Verde, nomeadamente a nível aeronáutico, pudessem ter ocorrido, prontamente, a esta «guerra global»..

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É, por isso, que não se entende a posição do comandante da Guarda Costeira, o comandante Santana, que se vangloria da grande missão prestada pelas Forças Armadas no combate à Covid-19, esquecendo que o alastramento da doença se deve, em parte, à ineficiência demonstrada no transporte dos testes e de equipamentos de proteção individual, bem como na evacuação dos doentes. Tudo por causa do meio de transporte utilizado, o “navio” que, por natureza, não é suficientemente rápido para uma emergência deste tipo.

Todos estamos de acordo: em momentos de crise sanitária não nos devemos preocupar com os custos dessas missões. No entanto, é no mínimo estranho que se tenha optado pelos transportes marítimos em vez de optar pelo transporte aéreo. Poderia arriscar a dizer (pelas informações que tenho, mas que carecem de alguma tecnicidade) que uma missão de São Vicente/Praia/São Vicente, por via marítima, pode custar cerca de 2.000.000$00 CVE. Quando a mesma missão, se fosse usada uma aeronave do tipo Dornier, não ultrapassaria, talvez, os 200.000$00 CVE.

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“Se o Guardião estiver envolvido no transporte de testes ou outro equipamento necessário para minimizar os riscos de contágio pelo Covid-19, que meios vão ser atribuídos à patrulha/vigilância do litoral da Boa Vista em consonância com o litoral da ilha de Santiago?

Contudo, a mensagem que estão a tentar passar é que não é preciso uma aeronave porque o navio Guardião, da Guarda Costeira, dá conta do recado. Compreende-se que o comandante da Guarda Costeira não reivindique um avião, por “ter olhos” só para os meios navais. Até aqui, tudo bem. Agora, já não se compreende e nem se entende que o responsável pela Guarda Costeira não “enxergue” o quão útil é uma aeronave no cumprimento das missões, muitas delas navais, designadamente as de busca e salvamento.

Bom, a inexistência de meios para o patrulhamento coloca em causa, também, a soberania nacional. Se o Guardião estiver envolvido no transporte de testes ou outro equipamento necessário para minimizar os riscos de contágio pelo Covid-19, que meios vão ser atribuídos à patrulha/vigilância do litoral da Boa Vista em consonância com o litoral da ilha de Santiago?

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Voltando à “vaca fria”. Um dos calcanhares-de-Aquiles deste Governo, e que ainda está por resolver, é o “negócio CASA”, em que só um lado saiu a ganhar em todos os aspetos, incluindo o equipamento hospitalar (maca de transporte de doente) que foi montado no avião da SeveNair à conta do erário público cabo-verdiano. A pergunta que se impõe é sobre as razões que levaram o Governo a entrar «nesta fria».

A resposta pode ser encontrada na escolha do assessor militar, (Capitão de Patrulha), que estava autorizado a assinar um protocolo em representação do Governo/FAS de Cabo Verde, tendo feito uma viagem a Portugal para negociar um avião para transporte de doentes (Ambulância Aérea) e o conserto do Dornier de Cabo Verde pela empresa SevenAir.

“Um dos calcanhares-de-Aquiles deste Governo, e que ainda está por resolver, é o ‘negócio CASA’, em que só um lado saiu a ganhar em todos os aspetos, incluindo o equipamento hospitalar (maca de transporte de doente) que foi montado no avião da SevenNair

Este negociador teve uma visão histórica digna da sua competência. Conseguiu propor/negociar a troca de um avião (Dornier) no momento operacional, mas que carecia da revisão das hélices, por dois Aviocar Casas 212-100, da Força Aérea Portuguesa entre 1973 e 1975, mas desativados há pelo menos 12 anos e ainda por cima «descontinuados» em termos da sua fabricação.

O senhor Ministro da Defesa, pelos vistos, não se deu ao trabalho de analisar o curriculum desse individuo, que já demonstrou não ter nenhuma competência em aconselhar o MD ou o CEMFA nessa matéria e que já encobriu as coisas maléficas desse negócio para o Estado de Cabo Verde. Não relatando ao Ministro que a dita empresa não tinha nenhum contrato de trabalho com forças aéreas a nível da aviação militar, e muito menos aval da EADS Casa, fabricante dessa aeronave que há muito foi “descontinuada a sua produção”.

Mas, o pior desta situação, no mínimo caricata, foi a ida a Portugal de quatro militares para participar nos trabalhos de overhal (fachada) para confundir a nação cabo-verdiana e mostrar que os negócios/trabalhos estavam indo bem. Algo confirmado pelo próprio Ministro e, posteriormente, desmentido.

Sabemos que esse Capitão de Patrulha conseguiu realizar formações junto da SevenAir, usando os recursos do Estado. Já que, conforme explica um técnico da Força Aérea Portuguesa, um piloto militar não precisa de fazer formações a nível de piloto comercial para obtenção de uma licença comercial para pilotar aviões militares, sendo que essa empresa forma pilotos civis para o trabalho aéreo comercial. Pilotos militares são formados nos exércitos ou nas Forças Aéreas.

“O Dornier sempre que esteve operacional deu prova de ser um grande equipamento, mas a sua gestão sempre foi um fracasso, também muito por culpa da Autoridade Aeronáutica Civil Cabo-verdiana…”

E, pelo que apuramos, o curso do JetStream que o mesmo fez em Portugal não traria nenhum beneficio a nível operacional, visto falar-se na aquisição de aviões de natureza militar para as Forças Armadas. De propósito, usou como argumentos para confundir o MD da Defesa que havia uma necessidade imperiosa dos pilotos da Guarda Costeira fazerem a habilitação na aeronave Jetstream. Formação que, ao que sabemos, custou muito ao Estado de Cabo Verde, que não retirou nenhum proveito.

Mas não fica por aqui, o ex-Diretor Nacional da Defesa foi exonerado do cargo por não ter o mesmo entendimento do MD sobre o Capitão de Patrulha.

Sabemos que o coronel Miranda foi o escolhido do Ministro para dar corpo ao negócio fachada dos Casas, tendo o mesmo liderado a vinda a Portugal de uma equipa de “navegabilidade e inserção de frota” pouco tempo depois da sua tomada de posse. Pergunta-se inserção de frota ou destruição de frota? Mostrando também que a falta de competência o fez entrar num “campo onde a bola para ele é quadrada”.

Sim porque o Dornier sempre que esteve operacional deu prova de ser um grande equipamento, mas a sua gestão sempre foi um fracasso, também, muito por culpa da Autoridade Aeronáutica Civil Cabo-verdiana, que tomou para si – a pedido de algum “intelectual militar” – a tutela inspectiva e navegável do avião, como se tratasse de um avião para uso comercial; quando na verdade esse avião é para uso militar não obstante o seu registo, não poder estar inserido no sistema da aviação civil nacional e ter de cumprir com os mesmos requisitos de uma aeronave para fins comerciais. Isso é inconcebível, só gera mais custos ao Estado e limita a missão de natureza espontânea e pontual, mas também confidencial.

Claro que sabemos que os aviões para navegarem precisam todos de certificados de navegabilidade, mas cada um com a sua especificidade. Militar e civil são campos de atuação diferente mesmo que, em termos de tráfego aéreo, cumprem com os mesmos requisitos estabelecidos na Organização Internacional da Aviação Civil.

“Se o Governo quer ter uma aviação que ajude na segurança das nossas ilhas, na salvaguarda dos nossos recursos marinhos, no patrulhamento das nossa águas, no combate ao narcotráfico, entre outras ameaçastem de parar de pensar como amador.”

Sendo assim, desde que esteja em condições de voar, sem pôr em perigo a segurança em termos de navegação aérea, pode voar, sem problema, para cumprimento das missões militares ou do Estado. Um avião para uso militar não tem fins lucrativos. Logo não lhe é exigido seguro para terceiro, sabendo que o Estado acautela, em caso de acidente ou incidente, os custos. O pagamento de seguro incide obrigatoriamente nos aviões de companhias aéreas comerciais principalmente. Pelo que sei e investiguei não encontrei uma força aérea que pague seguro dos seus aviões de transporte, de combate, de projeção de tropas, de lançamento, etc.

Se o Governo quer ter uma aviação que ajude na segurança das nossas ilhas, na salvaguarda dos nossos recursos marinhos, no patrulhamento das nossa águas, no combate ao narcotráfico, entre outras ameaças, de parar de pensar como amador e fazer as coisas certas, que é ter como parceira as Forças Aéreas dos países com quem nos relacionamos, assim como tem sido feito com as marinhas dos países amigos no apetrechar da Esquadrilha Naval.

É obrigatório elaborar um projeto que vise servir o Estado e não elaborar projetos de fachada para politiquices e realização de fantasias de alguns amadores armados em assessores.

Tenho dito.

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Kimze Brito

Jornalista com 30 anos de carreira profissional, fez a sua formação básica na Agência Cabopress (antecessora da Inforpress) e começou efectivamente a trabalhar em Jornalismo no quinzenário Notícias. Foi assessor de imprensa da ex-CTT e da Enapor, integrou a redação do semanário A Semana e concluiu o Curso Superior de Jornalismo na UniCV. Sócio fundador do Mindel Insite, desempenha o cargo de director deste jornal digital desde o seu lançamento. Membro da Associação dos Fotógrafos Cabo-verdianos, leciona cursos de iniciação à fotografia digital e foi professor na UniCV em Laboratório de Fotografia e Fotojornalismo.

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