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Para onde vamos?

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Por: Nelson Faria

Já disse e reafirmo, sem a nesga de esperança que me alimenta não consigo viver. Não desisto! Vou resistir! Mesmo que tudo pareça e dê esta sensação de turbulência, de pântano, de um lamaçal, sem a “terra bufa bufa” de Ribon di Cal onde não há amigos, há família, segundo a autora da música, dizia, a sensação de tudo estar envolto em interesses, jogos e conveniências pessoais e de grupos, porém nunca do coletivo na sua integridade.

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Num tempo onde todos nos questionamos, quase que constantemente, onde vamos parar? Num tempo onde a angústia, o medo e a insegurança tendem a apoderar-se das nossas preocupações diárias, onde muitos já desistiram da pouca esperança e já zarparam para outras latitudes… e muitos que ainda não foram apenas cá estão porque não há abertura de onde pretendem migrar… Aguardam a sua “bez”.

Dentre as muitas preocupações que me afligem nesta conjetura, três em particular têm-me levado a questionar se continua válida a minha esperança:

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1.            A insegurança – tema inevitável nos dias de hoje cujos discursos de conveniência não satisfazem minimamente a perceção e a realidade vivida pelas pessoas. De facto, a insegurança não é um produto da circunstância, é sim resultado de uma caminhada, perda de valores, de retrocesso na educação, em todas as frentes, quer da família, quer da escola, quer da sociedade. Qual a responsabilidade histórica de cada cidadão, das famílias e do Estado na realidade que temos hoje? Todos têm certamente. Como ultrapassar isto? Apenas a repressão policial é suficiente? Duvido. Enquanto a raiz do problema subsistir, pode-se prender alguns que novos irão surgir.  A atuação policial, por mais bem-sucedida que seja, parece-me que será sempre paliativa.

2.           Os jovens na política – A política é uma atividade nobre que apoia na construção das sociedades, considerando o seu historial, atuando no presente com objetivos de futuro. Quantos jovens, na política partidária, estão deveras preocupados com o futuro? Quantos têm voz efetiva nos partidos para mudar algo? Salvo honrosas exceções, vejo muitos repetidores de discursos e balelas convenientes para se manterem como “os preferidos” dos chefes eternos que estiveram, estão e estarão no comando do país por, pelo menos, mais duas décadas. Como mudar este cenário? Como ter jovens que de fato marcam a agenda política construtiva de um futuro diferente para todos, para eles e seus filhos, não entrando nas discussões ocas dos seus pais e avós e muito menos nas discussões sem nexo da partidarite conveniente? Óbvio que a experiência e o percurso feito até aqui não devem ser descurados, pelo contrário, contudo de nada serve a continuidade das “guerrilhas” históricas com a manutenção e gestão do poder com base no passado. A visão e a construção de um futuro são imperativas, sim, preferencialmente por quem provavelmente fará parte dele, direta ou indiretamente. 

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3.           Retrocesso nos valores – Há dias numa conversa, dizia-me um colega que muitos foram os fatores que têm sido incrementados na nossa realidade desde a independência, no sistema político, passando para a economia, pela educação, na sociedade, porém, o que se nota é que este incremento de fatores tem-se revelado inverso à evolução dos valores que têm registado um retrocesso visível. Cada vez mais há gente cujo propósito é apenas o seu ego ou o seu umbigo, onde “tudo ê bada” para a satisfação dos prazeres e vontades, muitas delas circunstanciais.  O respeito, a tolerância, o bom senso e o sentido de coletividade tendem a desaparecer. Isto se respalda em todas as esferas da nossa vivência. Já são poucos os que conseguem vislumbrar os seus propósitos de vida e os da coletividade. Há gente que declara não ter nada a perder, sem norte, sem direção, capazes de tudo, o que preocupa… Uma pergunta pertinente sobre esta constatação foi colocada por outra colega e partilho: quem educa e educou os jovens de hoje? Será que quem reclama da realidade vivida hoje não tem responsabilidades? É verdade, a responsabilidade é coletiva e histórica. Como inverter este cenário? Países sem uma cultura de valores, sem propósito, sem união no essencial dos princípios e finalidades, sem projeto de desenvolvimento consensual, sem maturidade intelectual, sem base na ciência não vai se desenvolver por mais que seja o seu crescimento económico. Por mais que façamos, por mais que tenhamos, se não soubermos quem somos enquanto país e para onde pretendemos ir, todos juntos, vamos manter nisto, ou coisa pior.

Dito numa das peças de teatro do grupo Juventude em Marcha, em outro contexto, mas que aqui se aplica, mais ou menos isto: “Antes de tudo e mais o quê, o problema é o base”. É verdade, os nossos alicerces estão corrompidos e correm o risco de falhar. Não pretendo alimentar a desesperança, espero, pois, que a pouca esperança seja convertida em ações coletivas que nos tirem deste pântano e desta sensação de não saber quem somos e para onde caminhamos.

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Kimze Brito

Jornalista com 30 anos de carreira profissional, fez a sua formação básica na Agência Cabopress (antecessora da Inforpress) e começou efectivamente a trabalhar em Jornalismo no quinzenário Notícias. Foi assessor de imprensa da ex-CTT e da Enapor, integrou a redação do semanário A Semana e concluiu o Curso Superior de Jornalismo na UniCV. Sócio fundador do Mindel Insite, desempenha o cargo de director deste jornal digital desde o seu lançamento. Membro da Associação dos Fotógrafos Cabo-verdianos, leciona cursos de iniciação à fotografia digital e foi professor na UniCV em Laboratório de Fotografia e Fotojornalismo.

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