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“Gourmetização” de Pedra d’ Doca

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Por: Aléxis Neves Almeida*

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 “Pedra d’ Doca” (na ilha de São Vicente), que há alguns anos era considerada, por todos, um lugar sujo e cheio de ratos, com exceção dos moradores da zona de Chã de Alecrim, que desde sempre tiveram uma ligação com este sítio, atualmente é frequentada por muitas pessoas e até considerada um lugar especial.

 A “gourmetização” de Pedra d’ Doca deve-se à grande e forte adesão da classe média-alta ao local, que antes era visto como um lugar para gente “pobre”.

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Neste local a população de Chã de Alecrim pratica diversas atividades desde um simples banho de mar, a pesca e logo de seguida o tratamento do pescado, o mergulho, e ainda há quem realize algo de diferente aos fins–de–semana desfrutando do seu sábado ou do seu domingo no local, cozinhando numa fogueira improvisada e bebendo para passar o tempo e relaxar.

Para quem não sabe, “Pedra d’ Doca” é uma zona balnear localizada em Chã de Alecrim, mais concretamente em frente à Cabnave (empresa de manutenção e reparação de navios) e a Sodigás (empresa de oxigênio e acetilenio). Como já devem ter percebido pelo nome, em vez de areia, esta instância possui pedras de grandes dimensões moldadas pela água do mar e, assim sendo, a maior parte tem formas ovais e são planas facilitando assim o acesso à parte mais rente ao mar.

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A sua dimensão não é explícita, mas há quem diga que tem cerca de 70m de comprimento. Contudo, o espaço para o “refreska meii comp” (expressão utilizada pelos jovens de Chã de Alecrim para definir o banho de mar) é vasto. Pode-se chegar até a praia da Lajinha. Aliás, há nadadores que aproveitam para fazer essa travessia diariamente, mas não devemos esquecer também que a profundidade é grande por causa da Cabnave para evitar possíveis problemas à chegada de navios ao estaleiro da empresa.

Uma das características mais notáveis de “Pedra d’ Doca” é a sua beleza natural, proporcionando uma vista deslumbrante do mar, com águas cristalinas e pequenas ondas inofensivas que quebram suavemente nas pedras. Para quem gosta de apreciar o pôr do sol, este é um ótimo lugar para realizar tal contemplação. É algo indescritível quando o sol chega ao nível da água do mar, modificando a sua cor e das nuvens para tons mais alaranjados.

Não tem muita vegetação, mas aqui, em Cabo Verde, não é muito comum encontrar vegetação junto das praias ou instâncias balneares. No entanto, esta zona oferece um campo útil para a prática de algum exercício físico como jogar futsal, algo muito praticado na ilha.

A zona balnear apresenta uma diversidade de espécies marinhas desde peixes, águas – vivas, crustáceo e até caranguejos. Existe uma lenda oral de que há muito tempo, um tubarão branco atacou um mergulhador, de nacionalidade italiana, que explorava o litoral à procura de novas espécies marinhas. Infelizmente o mergulhador não resistiu aos ferimentos e acabou por falecer no hospital da ilha.

No entanto, para Benito Lopes (Tupec) ir à “Pedra Doca” é uma terapia, assim como para os nativos da zona de Chã de Alecrim. Isto porque relembra a infância feliz, visto que era ali na Matiota* (antigo nome do local), onde muitos da sua geração se reuniam para brincar, jogar futebol ou realizar outras atividades que sempre terminavam com o banho de mar. Desta forma, foi, é e sempre será um dos principais pontos para as suas aventuras. Atualmente na idade adulta, Benito Lopes e outras pessoas, fazem disso um verdadeiro ritual de reconexão com o seu verdadeiro ser.

A antiga Matiota ou, agora Pedra d’ Doca é uma subdivisão da cidade do Mindelo na ilha de São Vicente, Cabo Verde. Situa-se a 1,2 km a noroeste do centro da cidade, ao longo da Baía do Porto Grande. Os loteamentos adjacentes incluem Chã de Alecrim a leste e Fortinho a sul e, ainda, a Praia da Lajinha.

Apesar de a paisagem trazer paz à alma dos visitantes, nem tudo o que aconteceu neste local são boas recordações, visto que alguns jovens já perderam as suas vidas nesta área. O último caso ocorreu no último domingo do mês de Março (26/03/2023). Segundo o exame médico, o jovem morreu devido à demora no salvamento visto que estava no fundo do mar e, quando foi resgatado, a água do mar já tinha alcançado os pulmões. É importante relembrar que esta zona não possui vigilância de nadadores-salvadores, que é indispensável em qualquer local onde as pessoas costumam tomar banhos de mar.

Para Helton (Bontch), o local também necessita urgentemente de contentores de lixo por causa da constante presença de banhistas que geram bastante lixo, principalmente aos fins de semana, quando alguns aproveitam para cozinhar em fogueiras improvisadas. Como não há contentores, o lixo fica em qualquer parte, acabando no mar e já sabemos que isso é muito prejudicial para todos.  “Por isso, mesmo que vá sempre relaxar no local, regresso a casa com uma bolsa de lixo. Sendo amigo do meio ambiente, tento preservá – lo sempre que possível,” explica Bontch.

Ambos os entrevistados compartilham a mesma opinião sobre essa “gourmetização”, sugerindo que o principal culpado são as redes sociais dado que sempre que pessoas da classe média / alta frequentam o local fazem fotos para depois postar nas redes sociais, nomeadamente no Instagram. E, através destas, a “fama” vai-se alastrando uma vez que todos querem sentir a paz que o local proporciona.

Já a população de Chã de Alecrim, na voz de William Neves (Neness), é contra esta “gourmetização” praticada pelos jovens de “morada”. Alegam que são um grupo que age de forma muito superficial, irresponsável e sem considerar as consequências das suas atitudes ou palavras. Neness afirma que estes jovens, não respeitam a presença de outros banhistas no local, principalmente no momento em que consomem certas substâncias ilegais que, muitas vezes, alteram o seu comportamento.

Por isso, defende que esses jovens deviam continuar a frequentar as praias que estavam habituados antes dessa “gourmetização”, nomeadamente Lajinha, São Pedro e até Baía das Gatas.

Tendo em conta a mudança de opiniões sobre este lugar, da desvalorização e preconceito à designação de “nha lugarzin” por muitos dos jovens com algum poder monetário, importa conhecer a história por detrás deste local e apetrechá-lo do que é necessário para ser, sobretudo, um espaço de lazer seguro.

E tu, já te tinhas apercebido desta “gourmetização”?

** Estudante do 2º ano da Licenciatura em Ciências da Comunicação da Uni-CV (polo do Mindelo). Trabalho realizado para a disciplina de Português IV Intermodal.

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Kimze Brito

Jornalista com 30 anos de carreira profissional, fez a sua formação básica na Agência Cabopress (antecessora da Inforpress) e começou efectivamente a trabalhar em Jornalismo no quinzenário Notícias. Foi assessor de imprensa da ex-CTT e da Enapor, integrou a redação do semanário A Semana e concluiu o Curso Superior de Jornalismo na UniCV. Sócio fundador do Mindel Insite, desempenha o cargo de director deste jornal digital desde o seu lançamento. Membro da Associação dos Fotógrafos Cabo-verdianos, leciona cursos de iniciação à fotografia digital e foi professor na UniCV em Laboratório de Fotografia e Fotojornalismo.

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