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ICIEG apresenta estudo sobre percepção social sobre pessoas LGBTQI+

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O Instituto Cabo-verdiano para a Igualdade e Equidade de Género (ICIEG) apresentou esta sexta-feira, na cidade da Praia, os resultado do estudo sobre “Perceção da população cabo-verdiana acerca da comunidade LGBTIQ+”, no âmbito do projecto “Nu Sta Li” da Fundación Triângulo, financiado pela Cooperação Internacional para o Desenvolvimento_ Cooperação espanhola.

O estudo com 157 páginas visou examinar percepções sociais em termos de conhecimento e atitudes, identificar crenças e estereótipos, compreender as relações entre a comunidade LGBTIQ+ e a sociedade, e contribuir para estratégias de inclusão e comunicação. Diz que 67% dos cabo-verdianos possuem conhecimentos básicos sobre LGBTIQ+, enquanto apenas 23% demonstram uma compreensão profunda dos conceitos relacionados a género e orientação sexual. “Esses resultados evidenciam a lacuna de informação inclusiva, muitas vezes dificultada por normas heteronormativas prevalentes. A teoria queer e a ideia de género como construção social reforçam a necessidade de campanhas educativas para expandir o entendimento”, lê-se no relatório. 

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Em termos concretos, a pesquisa indica que concelhos urbanos como Praia e São Vicente apresentam maior conhecimento e aceitação, enquanto São Filipe e Sal têm níveis inferiores, refletindo a influência do ambiente cultural e do acesso à informação. “As diferenças entre a autoapreciação da população geral e a hétero apreciação perceção sobre aceitação, revelam discrepâncias importantes: 54% dos inquiridos avaliam que a sociedade cabo-verdiana é pouco ou nada tolerante com pessoas LGBTIQ+, enquanto apenas 38% percebem que eles próprios têm atitudes de baixa aceitação”, detalha, frisando que essa dissonância sugere que os indivíduos tendem a considerar as suas próprias atitudes mais positivas do que as da comunidade em geral.

A relação entre conhecimento e aceitação indica que a educação e a informação são ferramentas cruciais para reduzir preconceitos, aumentar a aceitação da diversidade e as diferenças por fatores como idade, instrução e local de residência apontam para a necessidade de estratégias específicas. “A maioria dos respondentes discute raramente a temática LGBTIQ+ (42,3%) ou nunca discute (28,4%), enquanto uma menor proporção a discute ‘frequentemente’ (8,1%) ou ‘alguma vez’ (20,6%)”, refere. Por faixa etária,  indica, os jovens de 18 a 24 anos são os mais envolvidos, com 81,4% discutindo o tema em algum grau, seguidos pelas faixas de 25 a 29 anos (76,3%) e 30 a 34 anos (78,1%). Relativamente à religião, os crentes nazarenos (81,5%) declaram que fazem discussão sobre a temática, seguido dos católicos (73,6%). Já a comunidade islâmica apresenta menor interação, 16,7%. Já as pessoas que não têm religião (69,7%) afirmam que abordam essa questão.

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Preconceito

As atitudes relativamente à comunidade LGBTIQ+ variam significativamente: 45% dos inquiridos têm uma aceitação moderada, enquanto 34% demonstraram preconceito subtil. “A grande maioria (87,6%) afirma conhecer pessoalmente alguém LGBTQI+, sendo mais comum nos contextos de vizinhança (67,5%) e amizades (32,3%). No entanto, apenas 14,5% indicaram relações familiares próximas, sugerindo que o reconhecimento na família ainda é um desafio”, pontua, indicando que a maioria descreve a suas interações como naturais e abertas, com 72,3% dispostos a aceitar convites de pessoas LGBTQI+ e 61,8% relatando que se sentem confortáveis em conversar abertamente. 

Diz ainda que o sexo masculino apresenta maior proporção de respostas neutras (indiferença), indicando um distanciamento emocional em relação à questão. “A indiferença e o desconforto relatados por pessoas do sexo masculino, com idade mais avançada e menos escolarizadas revelam barreiras subtis à inclusão plena. O ambiente familiar permanece como um espaço de tensão, com barreiras evidentes entre gerações e níveis educacionais e a prevalência de atitudes neutras ou indiferentes reflete um distanciamento emocional que pode perpetuar a exclusão social”, sublinha. 

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O estudo demonstrou, por outro lado, haver uma correlação positiva entre o nível de relacionamento direto com pessoas LGBTIQ+ e o grau de aceitação, pois, 63% daqueles que afirmaram ter amigos ou familiares LGBTIQ+ relataram maior aceitação, enquanto essa taxa cai para 41% entre os que não possuem contato próximo. Revela ainda que apesar do apoio significativo à igualdade de direitos (73,9%), as percepções específicas sobre casamento (51,2%) e adoção (51,9%) mostram dissonância entre a aceitação geral e a aceitação de direitos concretos. 

“As principais justificativas de resistência são variadas, vão desde razões religiosas até questões sobre impacto social e psicológico para crianças adotadas. Há uma clara preferência por modelos tradicionais de família e uma perceção de que a presença de um “pai e mãe” é essencial para o desenvolvimento saudável de uma criança”, constata, acrescentando que “uma parte da população reconhece a existência de leis de combate à discriminação, mas apenas 8% considera essas leis adequadas para promover a inclusão.”

Reforço das leis

O estudo informa que a maioria acredita que as leis precisam de reforço (25,6%) ou de expansão, dado que alguns entrevistados (15,8%) consideram que essas leis são insuficientes ou inexistentes. Diz ainda que há um apoio substancial (76,2%) à importância das políticas públicas para promover a igualdade de direitos LGBTIQ+ e apenas 31% acreditam que as medidas implementadas foram eficazes. “Este cenário valida as críticas teóricas sobre a desconexão entre legislações progressivas e a sua aplicação prática.”

“As variações demográficas evidenciam preconceitos, sobretudo no seio do sexo masculino, pessoas mais velhas e grupos com menor escolaridade que tendem a atribuir menor importância ao tema. A inclusão de temas de diversidade sexual e de género nos programas educativos foi bem-recebida, com 62,7% dos inquiridos a favor. Pessoas do sexo feminino, jovens e pessoas com maior escolaridade mostraram maior aceitação, enquanto grupos religiosos específicos e indivíduos mais velhos apresentaram resistência.”

A pesquisa prossegue dizendo que cerca de 60,1% dos entrevistados acreditam que essa discriminação ocorre “algumas vezes”, enquanto percentuais menores apontam que ela ocorre “raramente” (12,7%) ou “nunca” (9,8%). Já 17,5% dos respondentes preferiram não opinar ou não souberam responder. “Na Praia, 67,2% acredita que as pessoas LGBTIQ+ enfrentam discriminação, seguido por Ribeira Grande, onde esse percentual é ainda mais alto (75,4%). Já em São Vicente, uma proporção considerável da população (28,7%) acredita que pessoas LGBTIQ+ ‘não enfrentam discriminação’, o que se destaca como uma das maiores proporções nesse tipo de resposta, talvez refletindo uma visão menos sensível à questão ou um contexto sociocultural particular”, analisa. 

Em termos globais, indica o estudo, cerca de 5 em cada 10 indivíduos relataram que já presenciaram atos discriminatórios devido à orientação sexual ou identidade de género, enquanto 37% ouviram falar sobre tais atos por meio de relatos de terceiros. Na análise dos tipos de discriminação enfrentados por pessoas LGBTIQ+, observa-se uma clara predominância de formas de violência verbal, com 85% dos inquiridos indicando essa experiência. “Este dado sugere um padrão de agressão e exclusão verbalizado contra essa comunidade. A discriminação nas instituições de ensino, como bullying ou assédio (65%), também se destaca como uma preocupação significativa, refletindo um ambiente muitas vezes hostil para essas pessoas em contextos educacionais.”

Violência física

O relatório relata ainda outros tipos de discriminação, com prevalência menor, como violência física (41%) e dificuldades em formar relacionamentos ou a perda de apoio familiar (40%), retratando o impacto emocional e social da marginalização. Revela ainda que a busca por inclusão no mercado de trabalho também é desafiadora, com 32,3% dos inquiridos enfrentando dificuldades de obtenção de emprego devido à sua orientação sexual ou identidade de género.

Dificuldades adicionais no acesso à saúde e bem-estar, designadamente lacunas ou áreas críticas para a população LGBTIQ+ como terapia hormonal são igualmente referidos no documento, exemplificando com números: 61,4% dos respondentes desconhecem a existência ou adequação destes serviços. “Também a saúde mental aparece como insuficiente, sendo avaliada como adequada por apenas 32,7%, enquanto 18,9% consideram os serviços inadequados. 39,2% não responderam ou desconhecem esses serviços, evidenciando a necessidade de maior divulgação e acessibilidade.”

Esses são alguns dos tópicos constantes desta pesquisa abrangente que identifica ainda vários outros factores que influenciam e moldam as percepções sobre a comunidade LGBTIQ+. Relativamente aos ganhos, destaca um aumento do conhecimento e conscientização, uma visibilidade crescente, possibilitando que esta temática possa ser cada vez mais discutida publicamente e abrindo espaço para a inclusão e a normalização dessas identidades.

Em jeito de exemplo, cita a realização de eventos como as “Paradas do Orgulho Gay” e as campanhas promovidas por organizações como o ICIEG, além do apoio de ONGs nacionais e internacionais que tem criado oportunidades de conscientização pública e fortalecido o ativismo LGBTQI+ em Cabo Verde.

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Constanca Pina

Formada em jornalismo pela Universidade Federal Fluminense (UFF-RJ). Trabalhou como jornalista no semanário A Semana de 1997 a 2016. Sócia-fundadora do Mindel Insite, desempenha as funções de Chefe de Redação e jornalista/repórter. Paralelamente, leccionou na Universidade Lusófona de Cabo Verde de 2013 a 2020, disciplinas de Jornalismo Económico, Jornalismo Investigativo e Redação Jornalística. Atualmente lecciona a disciplina de Jornalismo Comparado na Universidade de Cabo Verde (Uni-CV).

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