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Mais uma vez a culpa não arranja noivo

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Por: António Santos

É uma verdade universalmente reconhecida que um Chefe de Estado Maior das Forças Armadas precisa de um bom adjunto. Porém, um bom adjunto não é fácil de encontrar.

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Se, em Cabo Verde, a culpa costuma morrer solteira é porque não lhe arranjaram um responsável para casar. Por isso, antes de quaisquer proclamações programáticas, antes mesmo de aceitar o convite, o Chefe de Estado Maior das Forças Armadas, assim como o ministro da Defesa, deve certificar-se de que leva para o gabinete um adjunto de confiança, que o mantem informado sobre o dia-a-dia dos militares e a “administração” das Forças Armadas.

Mas, como mais uma vez ficou provado, e nós temos sido (há já vários meses) uma das principais vozes a denunciar a “bagunça” que se vive no seio das F.A., a culpa, mais uma vez, não vai encontrar “responsável com quem se casar, morrendo solteira”.

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No dia do meu aniversário, 8 de Maio, fui agradavelmente surpreendido com dois artigos de opinião, um do ex-ministro da Defesa do PAICV, Jorge Tolentino, e outro do oficial da Polícia Américo Faria Medina, que vieram dar razão aos meus artigos sobre o “lamentável” estado a que chegaram a gestão das nossas Forças Armadas. Sem demagogias e exageros e, também, sem as dúvidas que sempre nascem do remorso de terem “tido” algumas “atitudes” menos agradáveis durante o tempo que exerceram cargos de responsabilidade, os dois articulistas responsabilizam as Forças Armadas e o Governo por ainda não estarem apuradas as responsabilidades das mortes dos militares que “iam” para um incêndio na Serra da Malagueta. Américo Medina, corroborando o que escrevemos há dias sobre o “estado mecânico” do camião, é claro, passo a citar: “Em Cabo Verde, no passado dia 02 do mês de Abril, numa estrada pública, num ‘camião-sucata’ e de caixa aberta – dizem pertencer às FACV -, que transportava mais de 30 (trinta) pessoas, morrem, de um golpe, 08 (oito) jovens mancebos. Passado todo esse tempo, nada aconteceu. Que se saiba, apenas 8 (oito) cerimónias fúnebres, uns quantos discursos de ocasião, uma fastidiosa repetição de frases feitas, anúncios de pagamento de pensões, juras de amor aos quartéis e promessas de ações políticas alvejando prestigiar as FACV…, INCROYABLE!!”.

No mesmo sentido vai o escrito de Jorge Tolentino que espera “que o esquecimento não deixe recordar, e dormir à sombra da bananeira até que… até que ocorra outra tragédia. E outra. E mais outra…” Pois, tradicionalmente, é assim em Cabo Verde, que espera que responsáveis militares e governamentais enfrentem este caso em concreto, divulgando, com toda a transparência que se exige, as causas profundas, verdadeiras deste acidente.

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Para lá de eventuais falhas mecânicas neste ou naquele veículo, o que importa, na nossa perspectiva, é colmatar as debilidades nos terminais mais remotos na cadeia de comando. A árvore não pode esconder a floresta. Confirmando deste modo, o que já tínhamos escrito. Mas, enquanto nós e mesmo Jorge Tolentino pedimos um inquérito à atuação dos responsáveis governamentais e militares, o antigo comissário da policia vai mais longe e recusa, passo de novo a citar, “a placidez da Procuradoria-Geral da República e autoridades policiais frente a uma tragédia de tamanha proporção, bem como opacidade no tratamento da ocorrência que favorece um sentimento de uma sinistra anomia jurídica e moral que está povoando os peitos de todos nós, quando conjugamos isso com outros fenômenos por aí em desenvolvimento!”.

Estamos também de acordo , quando afirma: “Este low profile por parte das autoridades competentes, em que o protagonismo e responsabilidades forenses, de investigação criminal, peritagens etc. são ilegitimamente ‘endossadas às FACV que deveriam, sim, serem objeto de um inquérito-crime por parte da PGR”.

Um facto é que este acidente veio “clarificar” a posição do Governo: os nossos governantes não respeitam os cidadãos. Mentem e omitem com uma gratuidade surpreendente. Nunca assumem a responsabilidade por nada. Nem por eles próprios, nem entre eles, têm respeito. Não admira.

Há anos que banalizam a (sua própria) autoridade, não se preocupando com o preço que a sociedade paga devido a vulgarização da autoridade. Por isso é que se afirma perentoriamente na sociedade cabo-verdiana que a culpa morre solteira entre os políticos. A prática demonstra-o.

Então, de quem é a culpa da culpa morrer solteira? Infelizmente, é dos cabo-verdianos. Repito para que não haja dúvidas. A culpa de Cabo Verde ser governado por medíocres é da maioria dos cabo-verdianos, devíamos exigir aos nossos governantes trabalho e resultados em prol de um país mais rico, em vez de se resignarem às habituais promessas vazias de intenção.

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Kimze Brito

Jornalista com 30 anos de carreira profissional, fez a sua formação básica na Agência Cabopress (antecessora da Inforpress) e começou efectivamente a trabalhar em Jornalismo no quinzenário Notícias. Foi assessor de imprensa da ex-CTT e da Enapor, integrou a redação do semanário A Semana e concluiu o Curso Superior de Jornalismo na UniCV. Sócio fundador do Mindel Insite, desempenha o cargo de director deste jornal digital desde o seu lançamento. Membro da Associação dos Fotógrafos Cabo-verdianos, leciona cursos de iniciação à fotografia digital e foi professor na UniCV em Laboratório de Fotografia e Fotojornalismo.

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