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Lamento de um emigrante! Lamentamos juntos…

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Por: Nelson Faria

Imaginemos, por hipótese, que, de tão descontentes, e na impossibilidade de compatibilizar férias com a vida que têm nos países de acolhimento – quer por preços quer por imprevisibilidade de viagens – simplesmente os emigrantes começarem a mudar a rota dos destinos de férias e Cabo Verde deixar de constar prioritário?

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Provavelmente temos esquecido de parte importante desta ilha e deste país – ao menos não a valorizamos corretamente fora do meio familiar e círculo de amizades – reparado há muito, bastas vezes, o descaso nos serviços que nos requerem, quer nos burocráticos, sobre documentação, quer nos práticos, no transporte para o país e inter-ilhas, de pequenas encomendas ou outros relacionados a investimentos pessoais e empresariais que querem fazer no país. Ao menos esta é parte das intervenções reivindicativas crónicas. Isso sem contar que, apesar de serem em maior número que os residentes – tendendo a ficar cada vez mais com a perda de população interna -, a sua expressão política e eleitoral é marginal, quase nula.

Obviamente, falo dos emigrantes. Já agora, sempre me questionei o porquê de um emigrante que também tem residência em Cabo Verde, que visita o país regularmente, paga impostos pelo seu património, não poder votar nas eleições municipais… Espero que não seja pela consciência livre que muitos demonstram sem apego a clubite partidária, ou a consciência manipulável que assistimos por razões diversas.

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Baseado em premissas erradas, muitas vezes negligenciamos o papel do emigrante na economia nacional, quer pelas remessas, quer pelas expensas que tem nas suas visitas regulares ao país, em habitação própria no seu torrão, entre tantos outros itens igualmente relevantes, sem descurar a vertente intelectual, onde conhecimentos adquiridos pela formação académica, pelas experiências e know-how de outras latitudes são ignorados em vez de utilizados para nos catapultar para outros patamares. Preferimos os nossos milagreiros “santos da casa”.

Dizia, o peso económico é substantivo, quer estruturalmente, quer no apoio familiar, e não só, para vestuário, alimentação, educação, saúde e isto, per si, merecia outra empatia das nossas leis, normativos e atuação institucional, particularmente das entidades envolvidas no desalfandegamento e entrega de pertences aos nossos concidadãos.  É um privilégio nosso ter ainda a disponibilidade e apoio dos que se sentem apegados a terra, a sua gente e as suas causas de desenvolvimento da ilha e do país. Porém, com este andar, elucidativo no transporte inter-ilhas, com o trato que temos assistido e a descrença de muitos, sabendo que as gerações descendentes poderão não ter este mesmo sentimento de pertença, questiono: continuaremos a ter este mesmo apoio? Mais, sem este apoio seremos autossuficientes? Resumidamente, conseguiremos andar sem apoio dos nossos emigrantes? Imaginemos, por hipótese, que de tão descontentes, e na impossibilidade de compatibilizar férias com a vida que têm nos países de acolhimento, quer por preços quer por imprevisibilidade de viagens, simplesmente, os emigrantes começarem a mudar a rota dos destinos de férias e Cabo Verde deixar de constar prioritário?

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Posto isto, achei imensamente pertinente e oportuna a manifestação do emigrante Odair Dias, disposto a fazê-lo sozinho se fosse necessário, iniciado a partir da frustração de não poder receber a tempo e horas pequenas encomendas necessárias para a sua estadia e da sua família, despoletando também a sua empatia e assunção das causas dos demais emigrantes e das nossas agruras: a centralização excessiva, a necessidade de sairmos do comodismo, de unirmos em torno dos desafios, sendo a política um meio e serviço públicos e nunca um fim para apropriação do Estado e suas instituições, da necessidade de boa gestão municipal, as questões laborais, ao transporte inter-ilhas, entre muitas outras bem espelhadas nos cartazes e na sua voz determinada.

E se todos os emigrantes interviessem de forma reivindicativa e ativa para as causas comuns? Se os emigrantes tivessem mais participação cívica e política ativa ajudaria na melhoria das nossas debilidades? Não duvido. Todos contamos! O país precisa de todos nós, os que estão dentro e os que estão fora, de todas as cores, partidária inclusive, com sentido de missão e passagem de testemunho para a melhoria das condições de vida e desenvolvimento. Nunca pela apropriação conveniente do que é de todos e muito menos pela segregação e exclusão das partes inconvenientes do todo.  

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Kimze Brito

Jornalista com 30 anos de carreira profissional, fez a sua formação básica na Agência Cabopress (antecessora da Inforpress) e começou efectivamente a trabalhar em Jornalismo no quinzenário Notícias. Foi assessor de imprensa da ex-CTT e da Enapor, integrou a redação do semanário A Semana e concluiu o Curso Superior de Jornalismo na UniCV. Sócio fundador do Mindel Insite, desempenha o cargo de director deste jornal digital desde o seu lançamento. Membro da Associação dos Fotógrafos Cabo-verdianos, leciona cursos de iniciação à fotografia digital e foi professor na UniCV em Laboratório de Fotografia e Fotojornalismo.

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