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Rosário Luz: “Se os partidos nos impuserem bandos de demagogos é óbvio que o povo vai ficar sempre lixado”

Por Kim-Zé Brito/Constânça de Pina

Conhecida pela sua frontalidade, Rosário Luz analisa nesta entrevista o estágio da democracia e da “demagogia política” e pede à sociedade cabo-verdiana para estar atenta às contradições entre os discursos e o comportamento dos partidos. Residente agora na cidade do Mindelo, essa ´opinion maker` acredita que S. Vicente será o centro das grandes mudanças políticas em Cabo Verde, enquanto ilha líder no combate ao centralismo. Neste processo, atribui particular importância ao Sokols, movimento cívico que, lembra, tem enfrentado o status quo, teve a coragem de bloquear a comitiva do PM e empoderar a sociedade mindelense. Para Rosário, as manifestações acontecem com mais facilidade em S. Vicente porque a sociedade mindelense sempre teve uma atitude mais reivindicativa e independente do poder estatal, ao contrário do que acontece, por exemplo, em Santiago, onde o grosso da população trabalha na Função Pública e está sob o controlo do poder político. A nossa entrevistada fala ainda da “incompetência” do Governo em negociar os transportes aéreos com a Binter e a Icelandair, dos impactos da concessão marítima atribuída à Transinsular e da “miragem” da Zona Económica Marítima. Sobre esta matéria, ela acusa o deputado João Gomes de ser um “peão insignificante” no aparelho do MpD, alguém que apenas repete aquilo que a cúpula o autoriza a falar. Só dessa forma, diz, se pode entender que Gomes admita a possibilidade de votar a favor do EE da Praia e acredite que o Estatuto Especial de S. Vicente é a prometida Zona Económica Marítima.

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Mindel Insite – Qual o estado de saúde da democracia em Cabo Verde?

Rosário Luz – Formalmente a nossa democracia está óptima; as instituições funcionam. Há relatos de falcatruas nas mesas de voto nas eleições, mas isso acontece em todo o lado. No entanto, o facto de haver alternância pacífica significa que a democracia funciona. Os governos e câmaras municipais são mudados, pode haver birras, mas depois aceitam os resultados. O problema reside na oferta política e no grau de cidadania. Se todos os partidos nos impuserem bandos de demagogos desonestos, sem ética e sem visão sobre o que precisamos, é óbvio que o povo vai ficar sempre lixado porque não tem por onde escolher.

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MI – Os políticos estão mais preocupados em ver para o seu próprio umbigo do que para o interesse do país?

RL – Os políticos.cv não têm qualquer outro interesse – e vou dizer isto devagar – além dos pessoais e de carreira e os das suas corporações. E falo isso em relação à maioria dos políticos profissionais, os que estão ligados ao partido no poder. Não podemos viver sem política, precisamos é viver sem a má política.

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MI – Estamos perante uma encruzilhada alimentada pelos partidos?

RL – Exactamente, alimentada pelos partidos, mas suportada pelos cidadãos. A culpa não é dos partidos.

MI – O que podem os cidadãos fazer para driblar essa “tirania” partidária?

RL – Revoltar-se, boicotar as eleições se elas não trouxerem escolhas válidas. Os cabo-verdianos já estão mais do que convencidos de que as escolhas válidas não são o MpD e o PAICV. Acontece que a bipolaridade política é enorme: votas PAICV porque votas PAICV; votas MpD porque sim. Se nem os partidos respeitam as suas “ideologias” muito menos se pode esperar do eleitorado. Temos corporações políticas que agem como empresas, pagam os salários aos seus membros com emprego do Estado, com contratos e consultorias. O que o pessoal faz é capturar o sistema para benefício próprio e para pagar salários aos seus fiéis.

MI – Os votos estão a funcionar como apólice de seguro? Dou-te o voto e pagas com um emprego público?

RL – É o clientelismo puro e duro, é isso que se passa em Cabo Verde. Há uma hierarquia de ofertas que vai da cesta básica à consultoria de 3-4 mil contos, mas estas são reservadas às empresas amigas do Governo. Sou consultora e sei das máfias que acontecem com os recursos do Estado. Falo de casos em que se escolhem técnicos sem a devida competência, mas que são amigos do poder. Há pessoas que são sempre amigas do poder: antes, agora e no futuro.

MI – Como tem conseguido manobrar-se nesse mundo se não tem receio de criticar o poder?

RL – Consigo safar-me com competência profissional: a comunicação que eu faço funciona. Depende das instituições – das suas necessidades do seu plano e do seu mercado. Há determinadas instituições que estão muito mais interessadas em vender o seu produto do que preocupadas em serem amigas ou não do poder; outras não. Um exemplo: mantive uma coluna no jornal Expresso das Ilhas entre 2012 e final de 2014 que, modéstia à parte, era a coluna mais lida da imprensa cabo-verdiana. Chegamos a um certo ponto e o jornal declinou os meus serviços e demos um fim ao contrato. Acontece que nenhum outro jornal me quis contratar. Se fosse num mercado normal, onde a imprensa sobrevive das vendas, a primeira coisa que iria acontecer era a concorrência me agarrar, uma vez que ajudo a vender jornais. Isto não aconteceu porque o problema é a garantia dos subsídios do Estado. Há muitas poucas publicações que são de facto independentes. Estou a falar com uma que tem sido excepção. A nossa encruzilhada é que está tudo partidarizado. O pessoal é demagogo, clientelista e o cidadão adapta-se porque sabe que todos são iguais.

MI – O que aconselha ao cidadão comum porque, por aquilo que diz, os partidos estão a fechar de tal forma o cerco que não resta quase nenhum espaço de manobra à sociedade.

RL – Eu aconselhava as pessoas a olharem com mais atenção para aquilo que os partidos fazem. As pessoas precisam entender esta simples mensagem: quando eu voto, não estou a votar no MpD, na UCID, PAICV ou noutro partido. Estou a votar na escola dos meus filhos, na segurança pública, no sistema de saúde…; portanto, as pessoas precisam entender que estão a votar na sua vida e no futuro dos seus filhos, e não nos partidos. A partir do momento que tomarem essa consciência e aparece um partido com uma lista repleta de incompetentes que não votem, senão vamos continuar nessa encruzilhada. A educação cívica  e liderança terão de partir do lado da sociedade civil.

MI – Se tivesse capacidade para levar milhares de pessoas a fazerem exactamente aquilo que pensa, o que faria?

RL – Levaria as pessoas a estudarem a política nacional para que tenham a consciência das suas decisões. E não estou a falar da elite. Há uma amiga minha que diz o seguinte: “há gente que não sabe o nome das coisas, mas sabe o que elas são.” Gente que pode não ter a capacidade de falar sobre a política, mas que sabe quando é enganada. Pode não falar de conceitos económicos, mas sabe o que é o desemprego. Não podemos continuar a eleger os políticos pelos seus discursos. No momento, temos um cenário político completamente corrupto. Portanto, qualquer terceira via que surgir será nova.

MI – Sublinha a necessidade de as pessoas estarem atentas ao comportamento dos partidos. Poderias ser mais específica?

RL – Quando o PAICV fala, por exemplo, da necessidade de descentralização e aponta o dedo ao MpD, temos de nos lembrar que esteve no poder 15 anos e não trouxe descentralização alguma. E ainda temos de nos lembrar que foi o partido que começou a centralização nos 10 anos que esteve no poder logo o pós-independência. No entanto, não colocaria as culpas no partido. Acho que isso tinha a ver com a dinâmica do Estado. Porque vivemos da captação de ajuda externa, o centro de todo o poder está na Praia; quer-se que toda a decisão esteja debaixo do controlo clínico do Governo.

O nosso primeiro governo depois da Independência tinha apenas um membro que era natural de Santiago; portanto é uma injustiça acusar os naturais de Santiago dessa opção pela centralização. O problema não é Santiago, S. Vicente ou qualquer outra ilha, o problema é o Estado.cv que quer ter o dinheiro que arrecada do exterior todo debaixo do seu controlo.

MI – Como é que a situação de S. Vicente se enquadra nesse processo?

RL – Se S. Vicente alavancar a sua economia portuária como antigamente significa que muita gente ganha o seu dinheiro longe dos olhos do Estado, logo está livre para ter uma postura de questionamento e revolta. Isto constitui um perigo para o Estado central porque não quer dar poder a quem não se alinhe com o sistema. Então, qualquer iniciativa empresarial capaz de conferir poder e independência à ilha tende a ser bloqueada.

“É mais fácil o Estatuto Especial para Praia do que a Regionalização”

MI – Entretanto, o PAICV e o MpD aceitaram o princípio da Regionalização, que é uma das velhas reivindicações dos mindelenses. E a Regionalização pressupunha a atribuição de poderes às regiões.

RL – Em 2015, o MpD era a maior defensora da Regionalização. Tornou-se algo mesmo aflitivo, a ponto de ter prometido ao Grupo de Reflexão para a Regionalização de Cabo Verde que, se ganhasse as eleições, iria aprovar a Regionalização e ainda fazer de S. Vicente uma experiência-piloto. A verdade é que o Grupo foi enganado como se engana uma criança. Os membros do grupo deram o seu contributo nas campanhas, ficaram contentes com a vitória do MpD e este partido prometeu que S. Vicente seria alvo de uma experiência de Regionalização no ano seguinte. E o que aconteceu? Nadica de nada. Aliás, o que há é uma maior probabilidade de a cidade da Praia ganhar o seu Estatuto Especial do que qualquer tipo de descentralização.

MI – Responda com sinceridade, alguma vez o MpD e o PAICV quiseram a Regionalização?

RL – Nunca, o Estado de Cabo Verde sente, por princípio, que a Regionalização é um arrancar do poder das suas mãos. E disso não quer saber. A Regionalização é apenas um instrumento de estratégia eleitoral. Por isso volto a dizer, o que temos de fazer é parar de olhar para aquilo que essa malta diz e olhar para o que faz.

MI – Há quem diga que, quando o MpD levou o projecto de Regionalização ao Parlamento para aprovação na generalidade, estava à espera que seria chumbado pelos votos contra do PAICV. Mas, ao ser aprovado, da forma como foi, acabou por ser uma facada desferida no coração dos dois partidos. Qual foi a sua interpretação da jogada de alguns deputados do PAICV no Parlamento que viabilizou a votação na generalidade?

RL – Aqui só posso falar mesmo é de interpretação e especulação. É plausível que o MpD tenha torcido para o PAICV chumbar a proposta. Não tendo qualquer interesse na Regionalização, só a prometeu como manobra eleitoralista e populista, para calar a boca às ilhas do Norte. Para mim, o grande mistério é o PAICV. O que acontece? É que são necessários dois terços dos votos dos deputados presentes na sala para a aprovação da proposta. Entretanto, saem alguns deputados da sala e votam os números precisos para a lei passar.

MI – Admite que estejamos perante algo combinado?

RL – Este tipo de coincidência não pode ser acidental. É muito improvável que assim seja. O que estará por detrás? Temos de ver que a Regionalização representaria um alargar do Estado, a criação de mais cargos, mais “jobs for the boys”… A única coisa certa é que os dois partidos iriam concorrer aos cargos. E temos de nos lembrar que, enquanto o PAICV estava no poder, o MpD conquistava as eleições autárquicas. Ou seja, o PAICV, que perdeu o poder central, agora vê que a Regionalização – com 10 regiões administrativas e mais 400 mil contos de orçamento – também é uma oportunidade de poder e de negócio. E o ónus administrativo iria recair sobre o governo do MpD, que está endividado até o pescoço. Aqui as coisas não dependem de ideologia, mas sim se estás na situação ou na oposição.

MI – Esse acontecimento terá visado colocar em cheque a autoridade de Janira Almada enquanto presidente do PAICV?

RL – É algo que não saberia responder.

“A lei da Regionalização era péssima para o Estado”

Depois houve o debate na especialidade e a iniciativa foi chumbada. Estava à espera desse desfecho?

RL – Na realidade não estava à espera, mas confesso que estava curiosa para ver o que iria acontecer. E em verdade vos digo que ainda bem que essa lei não passou porque é uma péssima lei para o Estado. A palavra Regionalização já está suja, sou sim a favor da Autonomia política e económica para as ilhas e regiões porque não há política sem a económica.

Olhemos um pouco para o acordo de concessão das ligações marítimas. Feitas as contas, S. Vicente ficou com linhas apenas para Santo Antão, S. Nicolau e Santiago. Se alguém da Boa Vista precisar fazer uma consulta de especialidade não vem a S. Vicente, mas sim para Santiago. Se um operador quiser importar géneros frescos vai escolher entre nove dias para São Vicente ou apenas um dia para Santiago? Ora, Sal e Boa Vista são os maiores mercados turísticos e ficaram mais ligadas ao de Santiago. Esse acordo marítimo impediu que algum dia fosse São Vicente. Se houvesse autonomia regional, cada região seria capaz de concessionar rotas isoladas, SV/BV/SN, por exemplo; e os operadores nacionais até poderiam concorrer…

Qual o motivo de alguém de S. Nicolau ter de passar primeiro por Praia antes de chegar a S. Vicente? Metade das pessoas do Sal tem origem em S. Nicolau e outra metade na Boa Vista, por que razão estas ilhas hão de ter a sua relação mediada pela Praia? Isto é absolutamente revoltante. Mas tudo é feito de forma a impedir a autonomia e o crescimento económico das ilhas. E neste quadro económico, não há lei de regionalização administrativa que resolva o problema das ilhas periféricas, muito menos aquela aberração.

Estatuto Especial da Praia

MI – O Governo prometeu levar a proposta do Estatuto Especial da Praia ao Parlamento agora em Julho. Acha que a cidade da Praia precisa mesmo desse status para resolver os seus problemas ou estamos perante mais uma estratégia de sucção de subsídios para a Capital?

RL – Para mim, o problema não é a aprovação do EE para a Praia, muito pelo contrário: precisamente porque tem concentrado o grosso da migração nacional, há pressões sobre a cidade que têm que ter um tratamento diferenciado. O que eu acredito é que, pela mesma razão deve haver um estatuto especial para a outra capital regional – o Mindelo. Mesmo com uma economia estrangulada pelo poder central, o Mindelo não deixa de ser uma capital regional. E a cidade também lida com pressões desproporcionais aos investimentos que recebe: a migração, o aumento da insegurança, as pressões sobre os serviços do Estado, etc. O problema é que, enquanto a Praia se encontra cada vez mais próxima de receber o tal EE, o Mindelo move-se na direção oposta: está sendo progressivamente descapitalizada pelo Estado. Estão reunidas todas as condições para um Estatuto Especial para a Praia: um Primeiro-ministro que foi Presidente da Câmara da Praia por 8 anos; um Governo favorável; e uma elite política dominada pelos interesses que estão cada vez mais concentrados na Capital, o que significa que os deputados, independentemente dos interesses dos seus círculos de origem, votarão favoravelmente.

MI – O governo do PAICV tentou a aprovação do EE, mas o MpD chumbou a iniciativa. O que mudou, além da saída de José Maria Neves da liderança do PAICV, para garantir agora a aprovação dessa lei?

RL – O MpD chumbou quando era Oposição porque aprovar seria dar uma vitória ao governo do PAICV no maior circulo eleitoral do país. Mas será que o PAICV faria o mesmo agora? Mais uma vez, só podemos especular. Mas uma das coisas que acho importante perceber é a imprevisibilidade deste novo PAICV. O PAICV votou a subida da taxa alfandegária para produtos concorrentes aos da Tecnicil e tornou possível a passagem dessa lei idiota sobre a regionalização administrativa; porque não votar a favor do EE para a Praia? Não saberia dizer nem porquê nem porque não.

MI – Que consequências políticas, sociais e económicas prevê com a aplicação desse estatuto tanto na Praia como no resto do país?

RL – Um quarto da população do país mora na Praia, e a cidade é utilizada por todos os habitantes de Santiago. Portanto, parece evidente que a aplicação desse Estatuto obtenha um alto nível de aprovação a nível demográfico, como é natural. Mas também é natural que cause enormes ressentimentos à outra metade da população, que não vê o EE como uma necessidade e sim como um privilégio, numa cidade que acreditam já gozar de privilégios a mais. Uma grande parte dos cabo-verdianos – muitos dos quais de Santiago – veem as suas localidades serem desertadas a favor da Praia e ressentirão, certamente, o EE. Portanto vai ser um cálculo difícil para os promotores desse processo.

João Gomes, um “peão insignificante” no MpD

MI – O deputado João Gomes defende que o EE está na lei e deixa entender que deve ser aprovado. Entretanto diz que o seu EE é a Zona Económica Marítima Especial para S. Vicente. Como interpreta esta posição de um deputado nacional eleito por uma ilha que tem contestado a atribuição do EE à cidade da Praia?

RL – Eu acho que o deputado João Gomes não passa de um peão insignificante na estrutura do partido, que não pode dizer nada senão aquilo que lhe mandam dizer. O MpD já tornou claro que não tem qualquer interesse em concretizar a autonomia e os investimentos que prometeu na campanha, tal como a Zona Económica Marítima Especial para S. Vicente. Muito pelo contrário: se houvesse qualquer interesse em estabelecer a ZEEM, o Governo tão teria feito um acordo com a Transinsular que basicamente isola São Vicente. Os efeitos nefastos já se fazem sentir, com empresas a transferir as suas operações comerciais para a Praia, porque em São Vicente não têm garantias nem para importação nem para escoamento. TODA a economia da ilha vai sofrer, a muito curto prazo com essa concessão e ela prova que promessas como a ZEEM são completamente virtuais.

O deputado João Gomes insiste em repetir essa falsidade porque é o que lhe mandaram fazer e ele não se atreve a contrariar os poderosos do partido. Como já disse, os nossos deputados não defendem os eleitores e os interesses do circulo que os elegeu e sim os seus partidos. Nem o PAICV nem o MpD algum dia levou a sério qualquer compromisso com São Vicente.

MI – O Governo não deveria socializar a proposta de lei do Estatuto Especial em todos os municípios tal como fez com a lei da Regionalização?

RL – Todos esses atos de socialização que são encenados pelo Governo não têm o objetivo de informar os cidadãos; não passam de teatro para construir uma imagem de democratas. Era o caso do PAICV e é agora o caso do MpD. Na verdade, as decisões já estão tomadas e nunca são feitas de acordo com os interesses da  população. Portanto não interessa ouvir a sua opinião.

Da Regionalização à Autonomia

MI – Há pessoas que querem a Regionalização e outras que defendem a Autonomia. Se não foi possível alcançar a regionalização administrativa pior não será a autonomia?

RL – Nem por isso, para mim o país ganhou tempo para pensar agora numa regionalização completa. Falemos de outra matéria essencial: a tributação, o que significa a autonomia orçamental! Porquê o IVA é determinado e cobrado pelo Governo Central? Nos EUA, por exemplo, o “sales tax” e impostos sobre álcool e tabaco são determinados pelas estruturas estaduais. Uma lei de Regionalização de facto dá aos governos locais a capacidade de legislar determinados impostos. Imagine que S. Vicente decida que o seu IVA é 10% em vez de 15%. A autonomia pode significar um operador de São Vicente não precisar ir à Praia para falar com o ministério das Finanças porque a delegação regional é competente para resolver todos os seus problemas.

Outro exemplo é a gestão de alguns programas de emergência. Por exemplo, Santiago e Santo Antão foram as ilhas mais afectadas pela seca nestes últimos dois anos. Havia um subsidio de ração, entretanto um agricultor do interior de Santiago dizia que, para receber o subsídio, precisava tomar um carro para ir ao posto onde estava a ração e que só o transporte lhe “comia” o valor. Isto porque o esquema de apoio aos criadores de gado em Santa Cruz foi decidido num gabinete na Praia, em coordenação com a UE. É evidente que não funciona, porque a maior parte da capacidade de decisão nestas matérias deveria pertencer a estruturas locais.

MI – A centralização estará a afectar os laços da unidade nacional?

RL – Acho que a nossa unidade é tão óbvia que sequer deve ser questionada. Felizmente a unidade nacional está acima disso. Gostaria de desafiar alguém a apontar um recanto do país onde não se come a cachupa, não se fala o cabo-verdiano e onde não se celebram os mesmos santos católicos com os mesmos tambores. O que há é uma exploração política de rivalidades regionais. Por exemplo, o José Maria Neves costumava vir da Praia lançar discórdia no Norte; dizer ao pessoal de Santo Antão que não têm porque depender de S. Vicente?! Ora, há uma relação umbilical entre as ilhas, que dependem uma da outra. Assim como S. Vicente não tem grande produção própria e precisa de Santo Antão para ter o que distribuir, Santo Antão não tem um mercado local desenvolvido e precisa dos consumidores do mercado de S. Vicente. Mas, o Governo tem um interesse directo em semear discórdia entre as duas ilhas.

MI – Com que objectivo?

RL – Dividir para reinar; se de repente S. Vicente e Santo Antão descobrirem que têm enormes sinergias e que, se os seus deputados se unirem, podem não só promover como inviabilizar qualquer legislação, o centralismo do governo estará seriamente ameaçado.

S. Vicente, uma ilha líder; Santiago sob dependência do Estado

MI – Como vê o papel de S. Vicente na luta pela descentralização e autonomia?

RL – Como líder. Esta é a única ilha que já deu mostras de dar passos concretos nesse sentido, de ter um discurso e gente a votar com esse objectivo. Eu não tenho qualquer confiança no Grupo de Reflexão para a Regionalização e vou explicar: acreditaram no Ulisses Correia e Silva quando era óbvio que a sua intenção era eleitoralista. E, quando o Primeiro-ministro transfere um ministério sem qualquer relevância para Mindelo, esse grupo fica todo contente e convencido que o Governo está a olhar para S. Vicente. E o que acontece? O Governo, esperto como é, passa a dialogar só com esse grupo para passar a ideia de que São Vicente está satisfeita. S. Vicente deu o seu voto ao MpD, mas não fecha os olhos; e perante as evidências de engano, sai à rua.

MI – O que explica essa “vocação” dos mindelenses para a manifestação? As outras ilhas, nomeadamente Santiago, não têm também motivos de queixa?

RL – Em Santiago, as pessoas estão muito ligadas ao Estado. A proporção dos cidadãos da Capital que trabalham para o aparelho do Estado é muito maior do que em S. Vicente. Há que se levar em conta que, entre as ilhas urbanas, S. Vicente, Sal e Boa Vista, são onde as pessoas estão menos dependentes do Estado. Apesar da decadência económica, S. Vicente ainda tem uma economia portuária, comercial e artesanal, além das remessas dos emigrantes. Portanto, há uma economia que está proporcionalmente muito mais longe do Estado, do que a economia da Capital. O que confere às pessoas maior liberdade para se manifestar.

MI – E isto propicia um pensamento mais independente?

RL – Tanto pensamento como capacidade de acção. Se um trabalhador não é dependente do Estado muito mais facilmente sai à rua para dizer o que pensa e contestar o que está errado. Mas isto não é novo em S. Vicente. Sempre foi assim. Quando a ilha tinha uma economia portuária florescente, o que aconteceu é que o panorama cultural explodiu porque ninguém devia nada ao Estado colonial. As pessoas não trabalhavam perto da administração e não eram pobres agricultores sem instrução. Residia aqui uma malta instruída que trabalhava nas casas comerciais. Nessa época, ter quarta classe era garantia de entrada na função pública; o cidadão formado era norma, desde a quarta classe ao sétimo ano dos liceus, os tais setemanistas.

O antigo liceu Gil Eanes funcionou na verdade como uma universidade. Porque era o único sítio que tinha massa suficiente para oferecer serviços de educação ao país. O pessoal de Santiago da década de 40 e 50 veio todo estudar em S. Vicente. O centro educativo e logístico era S. Vicente e a Praia não ficou mais pobre por causa disso. O problema é agora que se implementou uma universidade estatal e, em vez de se deixar que os institutos tradicionais de formação em S. Vicente, como o Isecmar, continuem a funcionar de forma autónoma, centraliza-se tudo sob a UniCV. Isto não é acidental, é deliberado, com o objetivo de centralizar todas as decisões na Praia, próximo do Poder Central. Este é um exemplo dos actos concretos de centralização que estão a sufocar a ilha e a que ela, naturalmente, reage.

“Governo ética e tecnicamente incompetente”

MI – S. Vicente tem criticado as medidas de estrangulamento da sua economia e entretanto a ilha volta a ser afectada pela insuficiência de linhas aéreas e marítimas. É uma atitude propositada que visa isolar a ilha? Há alguma estratégia por detrás?

RL – Não, nada disso. A estratégia, como se viu, é centralizar, mas não com essa intenção propositada de prejudicar S. Vicente. É certo que a ilha acaba por pagar uma factura horrível no processo. Mas acho que o pessoal não se reúne nos gabinetes e conselhos a imaginar formas de chatear S. Vicente. O que acontece é que, porque os interesses eleitorais e as empresas amigas estão concentradas na Praia, convém manter ali o centro do poder e das decisões. Se de repente um grande investidor no Sal ou na Boa Vista pode tratar de todos os seus negócios com as estruturas locais, na sua ilha, o poder central deixa de ter a possibilidade de fazer as coisas acontecerem consoante o seu interesse.

MI – Acha então plausível ou compreensível não haver linhas aéreas que satisfaçam as necessidades do mercado e da população de S. Vicente?

RL – Em relação a isto o buraco é um bocado mais em baixo. Em primeiro lugar, acho que este Governo não é só eticamente incompetente, mas também tecnicamente. O pessoal é incapaz de negociar um acordo como deve ser. É impressionante. A Binter chega e estabelece o mau serviço que conhecemos, mas o problema não é a Binter. O problema é o Governo não ter sabido que estava a lidar com uma operadora comercial estrangeira num sector extremamente especializado e ter mandado gente que não percebe nada daquilo negociar um acordo desta importância. Resultado, a companhia fica com o monopólio de facto, o que lhe permite ter o comportamento abusivo que tem demonstrado. Se a Binter não tem que competir com ninguém, não tem motivo para ter uma política de preços competitiva; se a Binter sabe que  o país depende do seu serviço, mesmo sendo mau, não tem razões para o melhorar. Não há bilhete entre S. Vicente e Santiago que não seja menos de 10 contos e não há hipótese de se fazer a deslocação S. Nicolau – S. Vicente sem se passar pela Praia.  É absolutamente ridículo…

Mas acho que isto não acontece porque o Governo é mau; acontece porque não teve previdência; não percebeu que uma companhia como a Binter agiria assim com o monopólio. Se Cabo Verde fosse um território contínuo mandava-se a Binter à fava, metia-se num carro ou num comboio e cada um ia para onde quisesse. Mas somos ilhas e estamos nas mãos da empresa. O Governo tinha a obrigação de garantir um acordo de concessão a sério.

MI – Na sua perspectiva, porquê ainda o Governo não obrigou a CV Airlines a voar para S. V?

RL – Porque não quer, porque o pessoal não tem o Estado de Cabo Verde em primeira linha de conta. O PAICV não fechou a TACV por razões eleitoralistas. Foi terrível. Levou aquele barco afundado até as eleições e deixou aquilo nas mãos do MpD. O PAICV foi baixo na sua gestão. Quando o MpD recebeu a empresa, encontrou uma sangria financeira, pelos encargos que a situação representa. Teve de resolver o problema. Aliás, o Banco Mundial tinha estipulado que só daria ajudas ao Governo quando este saneasse a empresa. O Executivo sentiu-se obrigado a tomar uma decisão, mas esqueceu-se que a função do Estado é garantir determinados serviços públicos. E, da mesma forma que fez um acordo inepto com a Binter – que nem sequer garante a evacuação de doentes das ilhas – manda gente incompetente para negociar o acordo com a Icelandair, uma companhia muito maior e mais experiente do que a Binter. Resultado, Cabo Verde ficou com os passivos dos TACV e mesmo assim só conseguiu vender a empresa por pouco mais de 1 milhão de dólares. Há prédios na Praia que custam mais que isso. Isto não pode ser só maldade; é incompetência.

Agora, o facto é que não assegurou os voos para o aeroporto Cesária Évora porque o interesse de S. Vicente não contou minimamente na transação.

Apostar ainda mais nas “festas” em S. Vicente

MI – O INE divulgou dados estatísticos que mostram que houve uma maior facturação por trabalhador em S. Vicente, com grande diferença em relação ao resto do país. Para si, o que estas estatísticas traduzem?

RL – Em primeiro lugar traduzem o tipo de sociedade que é a mindelense, uma sociedade profundamente urbana. Há pequenos focos de produção rural na Ribeira d’Vinha, Calhau, Mato Inglês, uma importante faixa piscatória, mas é uma ilha onde o grosso da sociedade é urbano. Santiago, por sua vez, é uma ilha profundamente rural. Não há pior desemprego actualmente em Cabo Verde do que o desemprego rural. O trabalhador rural de Santiago está sem opção de trabalho, principalmente nos últimos dois anos de seca. E a produtividade desse trabalhador imagino que seja muito menor do que a de um trabalhador portuário. Este, imagino, ganha bem para a classe, tem protecção social – como deve ser – e trabalha a sério. O seu horário tem funções descritas. Pode haver um outro preguiçoso, mas é uma classe que trabalha. É só passearmos pelas imediações do Porto Grande e ver esse pessoal a ir e a vir do cais com as mochilas às costas e um ar determinado. A mesma coisa acontece nas oficinas da periferia… E um outro factor importante para a economia de S. Vicente é a emigração. Uma das coisas que os emigrantes fazem é construir a moradia para a reforma. Há ainda um sector de construção civil enorme, como as oficinas que fornecem as portas, janelas, canalizações, pinturas… O pessoal trabalha, sim.

MI – A verdade é que as pessoas ficaram surpresas com o resultado do inquérito porque o centro dos principais investimentos é a Capital e alimenta-se a ideia de que, se S. Vicente está mal, é porque a malta só quer festejar.

RL – Muito bem, vamos escolher uma festa como exemplo: o Carnaval. Quanta economia é gerada em torno deste evento? Quantas costureiras, ferreiros, técnicos de som, artistas plásticos, músicos, condutores, lojas e boutiques, vendedeiras de balaio, hotéis e residenciais, transportes aéreos e marítimos tiram proveito económico dessa manifestação? Quanto trabalho está envolvido na criação do traje de uma rainha? Quanta gente está envolvida, não no Carnaval, mas na indústria carnavalesca?

Passemos para o festival Kavala Fresk: quantas pessoas essa actividade consegue congregar? Quantos restaurantes aumentam a sua exploração? Quantos prestadores de serviços são solicitados? Quantos pescadores e peixeiras garantem a colocação do seu pescado? Enfim, para mim, essa economia de festa devia era aumentar porque é uma parcela expressiva da base económica de S. Vicente.

MI – Então não ficou surpresa com estes dados?

RL – Fizeram-me pensar, digamos assim, mas o que eu acho é que há muita construção falsificada, muitos estereótipos na cabeça das pessoas; um deles é que se trabalha na Praia e não em S. Vicente, que aqui é só festa. Mas, para eu festejar, houve alguém que foi comprar bebidas, que fez pastéis, transportou os aparelhos sonoros, ornamentou o espaço, construiu a minha fantasia… Nós temos de entender melhor o que é a economia de S. Vicente e quais são as suas bases. Uma delas é industrial.

O meu pai diz uma coisa importante para quem quiser entender Mindelo. Ele lembra que S. Vicente foi o primeiro proletariado do país, onde surgiu a primeira classe trabalhadora portuária com dinheiro líquido na mão, a comprar serviços no espaço urbano; gente a comprar na loja e não a produzir na horta. A cabeça do mindelense é urbana e é preciso entender isso; suas vocações são urbanas. S. Vicente sempre foi o centro da sua região e isso não tira nada à Praia.

Onde é que se industrializou a água em primeiro lugar? Onde nasceu a primeira fábrica de tabacos? Onde começou a exportação de frutas e de peixe? A ilha foi palco das primeiras experiências industriais e culturais no país. Isto resulta em capital social e histórico. O povo pode estar maltratado, mas é dotado de referências que lhe permite continuar a trabalhar de forma produtiva e a olhar para frente.

“Sokols é um dos capitais mais valiosos de S. Vicente”

MI – S. Vicente foi palco de um acontecimento inusitado quando elementos do Sokols cortaram o caminho à caravana do Primeiro-ministro na estrada do aeroporto. Como é que viu essa intervenção?

RL – Acho que o Sokols é um dos capitais mais valiosos que S. Vicente tem neste momento a nível cívico. O grupo conseguiu assumir uma intervenção cívica destemida. Quanto à manifestação que refere, as pessoas podem dizer que foi falta de educação ou provocação, mas a verdade é que foi uma demonstração firme dos cidadãos sobre a sua insatisfação com o status quo. O Sokols conseguiu organizar a população para dizer claro e em bom som que já não suporta as coisas como estão. Para mim, de todas as vitórias dos Sokols a principal foi a manifestação do dia 5 de Julho de 2017, quando conseguiram levar 10 mil pessoas à rua. Isto é brutal, isso só poderia acontecer aqui e devemos entender que possui um poder especial nesse aspecto.

MI – Porquê diz isso?

RL – O mesmo não aconteceria na cidade da Praia porque metade da população trabalha para o Estado, outra parte tem dependências (in)directas do Estado e não iria barafustar. A população é maior, mas está sob a palma da mãozona firme e directa do Estado. O Estado não mata e nem tortura, é um Estado democrata porque respeita a opinião individual. Eu sou prova disso, já disse horrores do Estado e ainda estou viva. Podem não me dar emprego, mas nunca me ameaçaram. O problema é que, para a maioria das pessoas na Capital, esse poder de empregador detido pelo Estado é suficiente para as calar.

MI – Que efeito psicológico essa intervenção terá despertado no estado de espírito do Governo central e do próprio Sokols?

RL – Medo! Provocou medo ao Governo central, enquanto que deu ao mindelense um rasgo de empoderamento. Se fizemos isso uma vez porque não fazer uma segunda vez?! E isto cria receios num Estado que não está habituado a lidar com uma sociedade civil viva, reivindicativa. Quando S. Vicente sai à rua dessa forma, o poder central começa a entrar freneticamente numa série de manobras. A primeira é dizer que os Sokols são fantoches da oposição. Eu sei que isso é mentira porque também o fizeram em relação a mim, apenas para desvalorizar a minha opinião. Antes das eleições, quando eu criticava o PAICV, diziam que era fantoche do MpD. Agora que critico o Governo do MpD dizem que sou fantoche do PAICV. Fingem não perceber que o interlocutor da sociedade civil é quem está no poder. É simples. Temos de perder a mania de achar que qualquer crítica é porque és do outro lado. O Governo usa essa estratégia apenas para desvirtuar as críticas que lhes fazemos.

MI – Por aquilo que diz, o Sokols tem uma grande força sociopolítica em mãos. Como rentabilizar esse capital?

RL – Tudo depende da cidadania, da capacidade das pessoas de ver as oportunidades que lhe surgem para transformar este sistema.

MI – E vê o Sokols a transformar-se em partido político?

RL – Não, o movimento tem uma missão cívica muito bem traçada. Mas será uma força que vai acordar o resto da população para fazer uma boa escolha política ou, possivelmente, boicotar as próximas eleições, se as listas não lhes trouxerem soluções.

MI – Poderá ser um veículo de esclarecimento/orientação nas campanhas?

RL – Acho que já é e não podemos esperar as campanhas para esclarecer as pessoas. Tem de ser já. Mais importante que o papel que irão desempenhar nos 15 dias de campanha é o trabalho de sensibilização que andam a fazer desde 2017. S. Vicente foi perdendo a cultura do protesto e tinha-se instalado a mentalidade de “deixar passar”. O Sokols sacudiu isso. Foi capaz de interromper a comitiva do PM, de levar gente à rua, de brigar, e deu uma referência ao povo.

Regresso a S. Vicente, o centro das mudanças políticas

MI – Estará em S. Vicente nas campanhas?

RL – Estarei em S. Vicente a partir de agora.

MI – O que a levou a trocar a Capital por Mindelo?

RL – Eu tenho uma empresa de consultoria que pode funcionar em qualquer sítio. Assim como viajo muito da Praia para S. Vicente, posso fazer o inverso. Já me considero residente, já comprei fogão e frigorifico (risos), aluguei um apartamento e vou viver uma vidinha de estudante nos próximos tempos. Fiz a mudança porque acredito que aqui é que vão ser decididas muitas coisas nos próximos tempos.

MI – A sua presença aqui tem algum objectivo político, tem algo a ver com as próximas campanhas eleitorais?

RL – A minha presença tem a ver por agora com aspectos puramente analíticos. Eu já percebi que Cabo Verde tem de mudar. Isto é visível em todo o país, inclusive na Praia. Já percebi com as frequentes viagens que faço para Mindelo que o provável núcleo dessa mudança será S. Vicente e logo de seguida as ilhas do Sal e da Boa Vista.

MI – E qual será o seu papel nesse processo?

RL – Primeiro analítico, não farei nada antes de entender os processos políticos que se desenrolam em S. Vicente. Por razões profissionais, a minha perspetiva diária da política tem sido a partir da Praia. Quero agora quero sentir e ver com mais proximidade o que se passa na esfera sociopolítica em São Vicente. Daqui a uns meses, podem voltar a perguntar-me o que acho que as pessoas estão a fazer aqui e o que eu posso fazer aqui.

MI – Estamos perante um caso do retorno da filha à casa?

RL – As minhas raízes familiares estão em S. Vicente e Santo Antão; S. Vicente pelo lado materno e S. Antão pelo lado paterno. Pela vida que levei, pelo tempo que estive no estrangeiro e o que vivi na Praia, a minha casa é Cabo Verde. Mas toda a minha linhagem vem daqui, logo posso, sim, dizer que é o retorno da filha à casa.

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Kimze Brito

Jornalista com 30 anos de carreira profissional, fez a sua formação básica na Agência Cabopress (antecessora da Inforpress) e começou efectivamente a trabalhar em Jornalismo no quinzenário Notícias. Foi assessor de imprensa da ex-CTT e da Enapor, integrou a redação do semanário A Semana e concluiu o Curso Superior de Jornalismo na UniCV. Sócio fundador do Mindel Insite, desempenha o cargo de director deste jornal digital desde o seu lançamento. Membro da Associação dos Fotógrafos Cabo-verdianos, leciona cursos de iniciação à fotografia digital e foi professor na UniCV em Laboratório de Fotografia e Fotojornalismo.

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27 Comentários

  1. A ROSARIO LUZ TEM DE EXPLICAR SE É CONTRA OU NÃO A INDEPENDENCIA DE CABO VERDE, NUNCA TECEU CONSIDERAÇÕES SOBRE ISSO, CABO VERDE FICOU REFÉM DESDE 1975 POR ESSES BANDOS QUE VIERAM DO MATO DA GUINÉ, DEUS PAGOU A MAIOR INTELEIGÊNCIA VIVA DE CABO VERDE DE TODOS OS TEMPOS O PROF.DR BALTAZAR LOPES DA SILVA. PORQUÊ QUE A ROSÁRIO NÃO CANDIDATA A CAMARA DE SONCENT?

  2. ENQUANTO SE GASTAM RIOS DE DINHEIRO NOS JOGOS NA ILHA DO SAL E DEPOIS INTER ILHAS EM SANICOLAU O POVO SOFRE DE FOME EM PORTO NOVO, SUL DA ILHA DO FOGO ANIMAIS MORREM NA BOAVISTA, MAIO, UM POUCO POR TODAS AS ILHAS, EM SÃO VICENTE HÁ MISÉRIA E FOME NOS SUBURBIO O DESANIMO É TOTAL.

  3. Excelente analista politica, pena é peca quando faz de analista social.
    Mindelo ganhou uma excelente analista mas uma “brega” que declarou que em Mindelo veste-se mal.
    Bem vida ao paraíso !

  4. Uma análise concisa da realidade cabo-verdiana atual, a meu ver quem não concorda, ou está alinhadíssimo com o sistema ou não é filho de boa gente, por mim tiro o chapéu e faço vénia.

  5. Uma capacidade de análise excepcional. Aborda os assuntos de uma prespetiva que só um conhecedor da realidade mindelense consegue. Uma entrevista muito esclarecedora.

  6. Eu possa nao concordar com tudo o que ela diz, mas que tem uma grande capacidade de ananise, ninguem pode duvidar. De uma coisa nao tenho duvidas: Se o pais tivesse tres ou quatro Rosario Luz (a dessa entrevista) desde a instalacao do sistema pluripartidario em Cabo Verde, hoje, a nossa democracia estaria noutro patamar de desevolvimento. Nao eh que nao existam outros cabo-verdianos com igual ou maior capacidade de analise. Infelizmente, a filosofia de muitos dos nossos, e bons, analistas, alinha-se com a filosofia politica dos seus partidos. Nao sei qual tem sido o posicionamento politico de Rosario Luz ao longo destes anos, porque nao tenho seguido as suas analises, mas que apreciei a sua postura nessa entrevista, apreciei.

  7. Nao sei como é que voces nao se cansam dessa forma tao humilhante de participacao.
    1) Ficaste chateadíssimo com a Rosario Luz só porque nao te agrada o facto dela querer ser honesta com e sobre Caboverde;
    2) Mas como, daquilo que ela diz, tu nao tens por onde pegar para a atacar e dar vasao ao teu ódio contra a honestidade dela;
    VĒ ENTAO A TUA CRIATIVIDADE!!
    3) Tens de encontrar urgentemente alguma coisa (mesmo que seja uma patetice qualquer) para a atacar;
    4) E entao, tens a ideia de ir descobrir atraves do buraco da agulha (imagine-se), que ela é BOA analista “politica” (o rato sempre sopra primeiro) mas….(para depois poder morder covardemente é claro) MÁ analista “social”.
    Ou seja, usas o adjetivo “boa” (um elogio), só como tapete para poderes depois usar o adjetivo “má” (para tentar descredibilizar o que ela diz).
    5) Mas como nem assim ainda te sentes seguro de que tenhas conseguido desferir um golpe de morte, entao, do mesmo modo que tantas vezes (como é vossa estrategia habitual) já tentaram fazer riola para dividir S. Vicente e Santo Antao ou S.Vicente e S.Nicolau, agora gostarias de poder dividir S.Vicente e Rosario Luz, isto é, colocar S.Vicente contra a Rosario, ao vir tentar levantar o defunto do titulo do artigo ” Mindel brega”.
    (Aquilo ja foi mais do que debatido homem!!!! Nao estavas em caboverde na altura??? Nao participaste??? Entao perdeste a oportunidade!!!).
    ISSO SÓ PROVA QUE
    6) Nao consegues entender nem a mente nem a alma da Rosario Luz, e por isso, nao entendes o que ela diz e, tambem nao consegues entender a cultura do mindelense, e por isso, nao entendes que nós nao somos nenhuns nėscios, e que a nossa atitude e comportamento nao estao disponiveis para serem conduzidos pelos ralos e rolos por onde desejas.
    Mas caramba, é preciso estar mesmo numa situacao de muita falta de argumentos, e viver numa completa cultura das trevas, para ter recorrentemente a ideia de ter esse tipo de iniciativas (destrutivas, maldosas, ridiculas, covardes, pobres, mendingantes e pior de tudo…que arrastam o nosso país para uma cultura de atraso civilizacional).

  8. Para fazer a sua montagem, dá “bem vinda” à brega a Mindelo.
    Ou seja, pega numa expressao que ela usou num determinado contexto de analise e com um determinado proposito, ressuscita-a e descontextualiza-a para daí tentar insultá-la, mas…fazendo-se passar por mindelense.
    Decadente até mais nao!!!

  9. Parabens Mindelinsite.
    Este jornal está cada vez mais a Voz do Cidadão. Continuem ! Força.
    Á Rosário Luz eu deixou aqui um repto: tudo bem tem razão que Jon Gomes (Jãoo Gomes do MpD) é um peão no seu partido. Mas tal como foi Alcides Graça há pouco mais de 3 anos. Ou seja com o seu partido no poder eles são CONTRA S.VICENTE. Com o seu partido na oposição S.Vicente para eles é a menina de olhos. Como acabar com isso Rosário ? Seremos condenados a viver com esses manhentos eternos ou podemos rebentar com essa armadilha de uma vez por todas e tomar o nosso destino nas nossas próprias mãos ?

    O João Gomes aqui localmente ele parece um leão. Em S.Vicente é vê-lo a andar de peito aberto parece um tigrão. Na Praia, nas reuniões do seu partido, no parlamento é um tchutchuca. Mansiiiinho. Voltando a questão : o repto que deixou a Rosario é como é uqe podemos contrarir isso. O que fazer ? Se lembrarem bem até 2016 quem é que estava neste papel ? Alcides Graça/João do Carmo. Eles é que para eles em S.VIcente vivia-se num paraiso e quem ousassse dizer o contrário era poruqe estava a ser manipulado pela oposição. Exactamente mas exactamente o que se passa agora com o o peão da vez João Gomes. Portanto João Gomes é o Alcides Graça de há quatro anos. Ou se quiserem Alcides Graça de hoje é o João Gomes de há quatro anos.
    Questão é como é que nós podemos quebrar esse ciclo ?

  10. Esta entrevistada e os mm jornalista preenchem nossos porquês no ponto exacto ,mais …. apresentada no formato de Palestra , seria óptimo !!!!! A analista não e’ frontal ,não necessita , tem capacidade para expor temas complexos em qualquer patamar sem aquecer os que discrepam pois ela “não humilha ” e sim faz refletir , somado ao coragem dos jornalistas com o povo em directo participando numa Palestra ,nos faria estar mais unidos e mais ciente do trilhado e do que falta . ABRAÇOS .

  11. 1º quando que S.V. era centro educativo de cabo verde, impediu que muita gente em santiago, tivesse acesso á educação porque muitos, não podiam estudar em S.V. por isso baixa taxa de alfabetização principalmente na população rural.
    2º santiago não é uma ilha profundamente rural, há santiago norte onde o fonte de rendimento vem, da agricultura,pesca e criação de gado e no sul onde está a capital onde o modo de vida é completamente diferente, totalmente urbana essas são as características da ilha de santiago dois modo de vida diferente.

  12. Quando SV era o centro educativo de Caboverde, muita gente de todas as ilhas tinham obviamente mais dificuldades de acesso à educação.
    Portanto, não se entende (alias, é mais outra manifestação do tal pensamento centralizador) essa tendência de exigência exclusiva para Santiago.
    E as gentes de Santo Antão, ou de S.Nicolau, ou do Fogo, não contam? Também não tinham mais dificuldades de acesso à educação?
    Não teriam os mesmos direitos que a população de Santiago?

    Entretanto, colocada a questão da forma como o “realidade” a colocou, acaba por distorcer a substância do assunto porque assim, pode-se até perguntar também e legitimamente, se não teriam os mesmos direitos que a população de S.Vicente..

    A SUBSTÂNCIA
    (temos de partir do contexto e do processo)
    Na verdade, o assunto em pauta é o “CENTRALISMO” e suas consequências.
    Mas, é aqui neste ponto de partida que há que se fazer a diferença.
    Não estamos a discutir o facto de um determinado local ser ou não, um pólo centralizador (que centraliza) porque isso é normal em qualquer lugar. E não faz sentido posicionar-se contra este facto.
    Portanto, é preciso compreender que, o que está em discussão (razão de todo este debate/polémica em torno do centralismo/regionalização/autonomia/estatuto especial) é o facto de se estar a contestar essa tentativa a todo o custo, de transformar um determinado local (neste caso, Praia), em pólo centralizador (desproporcionalmente centralizador), em detrimento dos outros locais.

    E colocadas as coisas nestes termos, verifica-se que aquele centro ecucativo que foi Mindelo, pelo modo natural, sem descriminação das outras ilhas como atingiu esse estatuto, naturalmente não seria motivo para polémica e reclamações
    Enquanto que, já o modo (peocesso) como se vem transformando a Praia no centro único de tudo o é.
    E é isso é que temos andado a discutir.
    Portanto, não distorçamos as coisas.

  13. Em poucas palavras digo apenas:
    É de se tirar o chapéu a forma dela ver a realidade de um país que muitos negam em ver.
    Precisamos de mais pessoas iguais a ela

  14. Subscrevo tudo o que disse a Rosário Luz entretanto, gostaria de explorar uma referência que ela fez.
    Ela fez referência de que, “são injustas as acusações feitas ao santiaguense”.
    Vou fazer o meu enquadramento a partir de duas situações e momentos:

    1º momento (tempo do partido único):

    Tempo de Parido/Estado (ou Estado/partido)
    Naquele periodo, qualquer critica, reclamação, reivindicação ou manifestação feita contra o governo ou instituições do Estado, era assumida pelo PAIGC/CV, como critica dirigida a ele próprio.
    Porquê?
    Por causa dum grave erro:
    Porque o PAIGC/CV se considerava, se sentia e se auto-intitulava com o estatuto de, e como sendo ele próprio, o próprio “Estado”.
    Uma critica dirigida ao governo ou às instituições do Estado, era uma critica dirigida ao PAIGC/CV.

    2º momento (tempo de pluripartidarismo)

    O centralismo em Caboverde já ia bem avançado e por isso acorreram-se dois fenómenos:
    a) Com o pluripartidarismo como seria lógico, o PAICV perdeu aquele estatuto de ser Estado.
    b) Mas paralelamente, e em virtude desse centralismo já bem implantado na terra, o santiaguense passou a sentir-se como se ele próprio fosse o próprio Estado.
    A convicção de ser detentor e representante do estatuto de Estado, foi transferida do PAICV para o santiaguense.

    E é por isso que acontecem coisas insólitas e inimagináveis no nosso país.

    Vejamos:

    Em todo o mundo, quando as populações se manifestam contra os governos ou contra as instiruições do Estado, quem decide ou não em responder, são precisamente os respectivos governos e/ou as instituiçõe s do Estado visados.

    Mas em Caboverde, acontece precisamente o contrário.
    Sempre que acontece qualquer manifestação contra o governo, este diz que, “não comenta manifestações”.
    E quem reage??
    Precisamente o santiaguense.
    Porquê??
    Porque o centralismo já chegou a tal ponto no miolo dos caboverdeanos, que ele o santiaguense já se vestiu com o estatuto especial de governo, de Estado.
    O santiaguense sente as dores do governo e do Estado como se fossem ele próprio, quando estes são criticados pelas outras ilhas.
    Pelo processo do centralismo, pelas mensagens dos políticos, pelo serviço da TCV, que chegaram a tal ponto no país, hoje o santiaguense se considera (sente-se) governo do país, se considera Estado, se sente na pele de Estado e por isso, vivemos essa situação bizarra e talvez única no mundo, que é o facto duma parte da população, responder em nome do governo e do Estado, por se auto-considerar com um poder tal e com direitos que se confundem com governo ou com Estado, e como defensor destes (na sua ideia, “dele próprio”) contra o restante da população que não tem esse estatuto, que não tem essa condição de ser nem Estado, nem governo..

    E é essa permanente reação do santiaguense, às manifestações das outras ilhas contra os governos, que conduz às também reações que parecem injustas dos outros caboverdeanos relativamente ao santiaguense.

  15. Um coisa e’ certa o povo de Santiago não leva desaforo pra casa ,eles não dão sorrisinho nem engolem em seco ,fazê-se justiça . Nada que contradiga o artigo ,que fique claro. Tiro chapéu pra RL desde ha muito tempo

  16. Uma entrevista notável a todos os títulos. Uma radiografia sociopolítica do país com densidade q constitui uma plataforma útil para quem quiser aprofundar as várias áreas referidas ou eventualmente interpelar a entrevistada. Gostei bastante.

  17. Eu me lembro bem dele.
    Ele não levava desaforo p’ra casa.
    Qualquer siruação em que ele estivesse em desacordo, não havia lugar para diálodo e procura de entendimento.
    Agarrava da sua faca e espetava ao primeiro que lhe aparecesse pela frente.
    Acabou por morrer com vários tiros, disparados por outro que como ele, também não levava desaforo para casa.

  18. Estou impressionado. Não concordo com toda a análise, principalmente porque generaliza e acaba por alijeirar dados importantes. O MpD herdou a questão TACV é um facto, mas o MpD – leia-se Governo – sabia porque não podia deixar de saber que deixar os vôos internos nas mãos de uma companhia estrangeira era não só prejudicar o país mas o povo e, de caminho, transferir de facto riqueza para um país estrangeiro. Mas não só sabia isto como repetiu a dose vendendo os TACV à Icelandair mantendo no estado cabo-verdiano o passivo. Ou seja vende a uma companhia estrangeira o que a empresa tem de bom por coisa nenhuma e fica com a parte ruim. Esta empresa não quer saber de serviços públicos para coisa nenhuma, o seu interesse é transformar a companhia num serviço lucrativo cujas receitas vão directas para o bolso dos investidores islandeses e o serviço da dívida permanece em mãos cabo-verdianas. De caminho São Vicente que recebe do Estado central menos em investimento do que a receita que produz, só pode ser secundarizado pois não é um destino altamente vantajoso para os “turistas”. De caminho perde tambem competitividade com menor atracção de empresas e investimento, donde perda de receitas proprias.

  19. Muita parra, pouca uva!!!
    A Dra, Rosario Luz em tempos passados, já esteve melhor, ultimamente as suas analises parecem caído um pouco de qualidade e argumentação. Muitas das questões colocadas na entrevista, requerem um domínio de base económica e de mercados. Mas ela responde numa perspetiva politica e partidária basicamente.
    E como é possível, em um momento ela recomenda os cidadãos a “revoltar e boicotar”, e no momento seguinte fala de “educação cívica” e manda as pessoas “estudarem a politica nacional”??!!
    Sobre a TACV, quem acha que algum parceiro externo, iria comprar os passivos da empresa falida, nos regabofes e mordomias de longos anos?? É lógico que não, o negócio não foi o ideal para CV, mas um melhor cenário era quase que impossível.
    Trata-se de um negocio de nível internacional e com muita complexidade, por isso os resultados serão de médio e longo prazos. SV de certeza que vai retomar os seus voos da CVA, no tempo certo!!

  20. Afinal, estas totalmente de acordo com a Rosario Luz.
    Assim, nao entendi porque é que estás impressionado.

  21. Querias participar mas, não tinhas o que dizer?
    Apercebi-me disto mas….
    É, às vezes acontece.
    Pronto mas, de todas as formas, mesmo sem nenhum fundamento com alguma substância, acabaste por dizer (escrever) alguma coisa.
    Acho que já dá para ficares contente não é?
    Ou não??
    Se for não, então escreve mais. Não há problemas nenhuns.

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