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Um curral como bancada…

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Por: Xazé Novais

Tinha-me prometido que não iria falar das bancadas do Carnaval e ainda menos de um carnaval de bancadas… que deixaria as coisas rolarem, os Grupos/Ligoc-SV darem livre curso à sua vontade (será que é mesmo vontade genuína dos Grupos?) e aguardar tranquilamente o retorno do Povo de Soncente sobre este carnaval. Para que ninguém diga que lá venho eu com as minhas esquerdisses.

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Tinha-me prometido que não reclamaria dos preços exorbitantes das bancadas a 1.000CVE mínimo, onde, seja para qual for família mindelense com filhos, se torna de facto impossível ver o Carnaval nas bancadas. Que justamente não reclamaria do facto de que, havendo tantas bancadas por tudo quanto é sítio, ficará impossível para aqueles (certamente 80-90% da população vicentina que não conseguem pagar o bilhete) ver com um mínimo de dignidade, prazer e satisfação esta que é uma Festa deles.

Que não comentaria tantas ideias no mínimo estranhas que circulam por aí, tal como ter data fixa para o carnaval mindelense (eleito pois ao estatuto de festa mundial maior), ou de se espalharem écrans gigantes pelas ruas para “compensar” o Povo pela sequestração da sua participação efetiva na festa, sacrificado no altar da monetização/mercantilização do nosso Carnaval.

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Que não opinaria sobre a diferença fundamental entre a necessária sustentabilidade financeira da Festa do Rei Momo vicentino (profissionalização dos artesãos e demais métiers que constroem peça a peça a folia que todos admiramos, construção de estaleiros e demais locais propícios ao desenvolvimento desta profissionalização, comunicação e venda durante o ano inteiro do produto Carnaval do Mindelo, organização e qualidade dos desfiles, protocolos com as entidades responsáveis pelo qualificação do destino Cabo Verde, tais como o Fundo do Turismo, para que o financiamento desta festa extraordinariamente qualificante para todo o pais não se esmere em esmolas dadas com pompa e circunstância entre outros aspetos) e a sua mercantilização desenfreada, que retira participação popular, retira autenticidade, retira atratividade e finalmente acabará por esvaziar o Carnaval do Mindelo daquilo que faz desta festa aquilo que é, um sentimento global de pertença e união de todo o Povo de São Vicente e demais visitantes que aqui acolhemos durante o carnaval. O Carnaval do Mindelo é uma festa do Povo e não uma festa de Ricos versus Pobres.

Mas era sem contar com a gritante falta de visão (será ganância a mais e de quem?) que enforma a decisão de literalmente se cercar a Praça Nova de bancadas ainda mais altas que as demais e como as restantes tapadas de redes e outros ocultantes, impossibilitando qualquer cidadão de ver o carnaval da Praça Nova, comprimindo as pessoas no centro da praça, transformando este local de descompressão urbana de particular importância neste dia num verdadeiro curral de carnaval…

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E pensar que em 2020, quando finalmente acabou por imperar o bom senso que traduzia nada mais nada menos que a esmagadora vontade popular vicentina e se retirou as bancadas da Praça Nova, tinha ficado clara esta imperiosa necessidade de deixar livre o pulmão do Carnaval de Mindelo!

Ao contrário, desta feita, ao invés de limitarem a colocação das bancadas a um só lado da Praça (isso eu posso entender como parte da sustentabilidade do Carnaval), arrancaram a colocação das bancadas por todos os lados da Praça, cercando-a literalmente, emprisionando os carnavalescos e demais espetadores num beco sem vista e quase sem saída… a meu humilde ver, a maior aberração de toda esta organização que se quer de melhorias para uma cada vez melhor festa do Rei Momo em Mindelo. Aberração urbanística, social e mesmo organizacional! Só não será certamente uma aberração económica. Mas que tem o Povo a ver com isso?

Porque a grande questão são as alternativas, as alternativas de assistência igualmente dignas para todos aqueles que não podem pagar e mesmo para aqueles que não querem pagar. O Carnaval é do Povo de São Vicente, que ninguém se engane, sem esse povo será a morte do nosso Carnaval. E não haverá bancadas que o possam fazer ressuscitar!

É nesse âmbito que surge a questão de um necessário equilíbrio na colocação de bancadas na Praça Nova. Srs. Promotores, Sr. Presidente da CM, será que pensaram bem esta última questão? Será que pesaram todos os prós e os contras de tal decisão? Será que têm poder legitimo para tomar tal decisão? Praticamente fechar ao publico um espaço publico, fechar ao Povo o coração do nosso Carnaval?

E aqui insisto mais uma vez, Carnaval só vale com o Povo, para o Povo. Tudo o resto é conversa para inglês ver e por pouco tempo… Ainda vamos a tempo de permitir que o Povo de Mindelo não se veja relegado a assistir ao seu Carnaval de bancada… em casa!

Porque, para além do ato simbólico em si, põem-se concretamente a questão da segurança dos transeuntes, dos festivaleiros, dos amantes do Carnaval que todos os anos descem em massa assistir à festa do Rei Momo no Mindelo e particularmente na Praça Nova. Aí estes se posicionam, a partir das 11h da manhã por forma a garantirem os melhores lugares, os mais estratégicos, esses mesmos que a atual colocação total de bancadas veio agora pura e simplesmente passar um risco vermelho por cima…

Mas é também ali que mais passeiam, que os encontros são marcados, único espaço publico urbano despressurizado durante as horas do desfile. Ali a corrente humana que tenta desesperadamente deambular pela cidade sem sucesso encontra o que chamaria de vaso de expansão urbano do Carnaval mindelense. Diz-se por aí que circulam por Mindelo durante as horas do desfile em torno de 30.000 pessoas. Há mesmo quem fale em 50.000!

Tendo bancadas para umas 4.000 pessoas, onde tencionam colocar as restantes 30/40.000 pessoas se tudo vedarem, tudo fecharem, deixando apenas alguns passeios para o Povo? Aqui repito, o Carnaval é do Povo antes de qualquer outra instituição ou organização! E a Praça Nova é também deste mesmo Povo, A Praça Nova é a BANCADA DE CARNAVAL DO POVO DE SONCENT! Tirar este espaço ao Carnaval de Mindelo é como que retirar os pulmões ao rei Momo.

Que tudo dê certo é o meu mais profundo desejo!!! Que o Carnaval regresse ao seu coração, regresse com o seu coração! E com ele e como sempre nha Pov!! ARIAAH Soncent !!!

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Kimze Brito

Jornalista com 30 anos de carreira profissional, fez a sua formação básica na Agência Cabopress (antecessora da Inforpress) e começou efectivamente a trabalhar em Jornalismo no quinzenário Notícias. Foi assessor de imprensa da ex-CTT e da Enapor, integrou a redação do semanário A Semana e concluiu o Curso Superior de Jornalismo na UniCV. Sócio fundador do Mindel Insite, desempenha o cargo de director deste jornal digital desde o seu lançamento. Membro da Associação dos Fotógrafos Cabo-verdianos, leciona cursos de iniciação à fotografia digital e foi professor na UniCV em Laboratório de Fotografia e Fotojornalismo.

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