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O povo da ilha das montanhas sente-se traído!

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Por: Helena Delgado


A sensação que temos é que “alguém” pensa que nós os Santantoneses somos idiotas. A verdade é que maioritariamente somos um povo camponês, mas não pobres de espírito e de capacidade de análise e muito menos idiotas.

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Que o aumento do preço dos serviços nas ligações marítimas e de muitos dos bens e serviços a nível mundial se justifica pelo impacto da pandemia e da guerra, isso todos nós sabemos e estávamos cientes que este momento chegaria também a Cabo Verde.

E chegou! Particularmente nos serviços marítimos, chegou cheio de barulhos, argumentos e justificativos desnecessários para algo que era e devia ser natural. Acontece, porém, que ficamos logo assustados e literalmente encolhidos num canto, quando, antes mesmo dos preços serem publicados, o concessionário prestador do serviço veio à comunicação social acompanhado do responsável máximo do executivo da área informar as razões que os levavam a fazer aumentos dos preços dos serviços.

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Normalmente, decisões óbvias não carecem de ser justificadas com holofotes, pelo que ficamos apreensivos com o que viria a seguir. Podem e devem, sim, as decisões óbvias, serem no mínino comunicadas de forma segura, clara e concisa para se poder confirmar a coerência e a conformidade das referidas decisões.

Todavia, no caso concreto dos aumentos dos preços nos transportes marítimos, não observamos nenhuma clareza e muito menos sensatez neste processo, devido a forma caótica e confusa como o mesmo foi apresentado.

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Por isso, começo assim por perguntar o que justifica duplicar e triplicar serviços sobre os quais nunca houve maiores reclamações seja dos prestadores de serviços, seja dos clientes, relativas ao valor a pagar e ainda quando a tendência/estatística mundial no último trimestre de 2022 e do primeiro de 2023 demonstra que os serviços marítimos voltaram a estabilizar, apresentando valores ligeiramente acima de antes da pandemia.

Qual é o elemento na composição do preço da rota que justifica tal aumento? Pois, para leigos como nós, na rota SV-SA-SV o aumento de preço agora poderia ser justificado pelo aumento do combustível e derivados tendo em conta que os dados apontam para uma diferença de 37%, se comparado a antes do período da pandemia. Qual é o peso que o combustível tem na composição do preço dos serviços marítimos que remete a essas subidas descabidas?

Se no caso do preço das passagens dos nacionais concordamos e achamos o aumento aceitável e suportável, o mesmo não podemos dizer relativamente ao preço de passagens para não residentes, dos carros de passageiros e de cargas, que chegaram a duplicar e a triplicar.

Precisamos entender porquê numa linha que é comprovadamente rentável, funcional e escrupulosamente cumpridora de horários, contrariamente às outras linhas existentes no país, de repente o prestador de serviço propõe aumentos de preços absurdos e injustificáveis que são de imediato ratificados pelo Governo, que os dá como certo e validos. Não é aceitável e não achamos justo.

Como que se justificam tais aumentos? Precisamos ainda entender se todas as rotas internas de Cabo Verde têm a mesma base de cálculo proporcional ao percurso e pressupostos bases inerentes a atividade. Será que nas rotas que já são deficientes por várias razões também temos aumentos nessa ordem de 200% a 300%? Porquê se está a destacar aumentos de 20 % a 80% quando temos serviços de grande volume na rota em que os aumentos estão acima dos 200 %?

A distância entre as rotas é um dos pressupostos a usar na base dos cálculos, mas não pode e não deve ser usada como a única base porque nunca foi em nenhuma parte do mundo e em nenhuma montagem de preços comercias porque há que ter em consideração parâmetros como frequência da rota, volume de circulação, entre outros do qual não está claro nesse processo. Pois, se a distância entre rotas fosse o parâmetro decisivo no custo de rotas, Cabo Verde decerto teria as melhores tarifas aéreas pela sua localização, não é? 

Precisamos urgentemente  ter acesso a mais dados que estarão na base da elaboração das tabelas de preços de rotas e serviços de todo o país para entendermos se a luta por solicitação de esclarecimentos e justificações agora é só nossa dos Santantonenses ou se é uma preocupação nacional. Precisamos com urgência afastar a sensação que nós, os Santantonenses, estamos a ser usados para colmatar problemas que não são diretamente os nossos.

Ou alguém acha que é só por acaso que a rota é eficaz? Somos uns sortudos, é isso? Não. É eficaz porque sempre foi rentável e isso sustentou todo e qualquer investidor que nela investiu, fazendo que mesmo a manutenção dos equipamentos no trajeto fosse impercetível, porque sempre houve capacidade financeira dos investidores, sustentada pela rota.

Mas isso não pode ser usado agora como razão para sermos explorados e usados para financiar seja lá o que for, procurando viabilizar o que seja e que por qualquer motivo não tem sido funcional ou viável.

Alguém pode explicar se entenderam a política de preço especial para não residentes? Qual é a posição dos nossos atores do Turismo de Cabo Verde? Criamos uma política de isenção de vistos para turistas que entram no País para atrairmos o turismo, mas os que querem ir para Santo Antão são sufocados com um preço de passagem diversificada pela penalização e validado pelo mesmo Governo?

Não há como justificar a política de diversificação de preços entre nacionais/residente e não nacionais usados a nível internacional porque isso vai em contra mão das nossas políticas gerais internas. Não tem como argumentar que essa política foi aplicada a todas as rotas nacionais, porque essa política não tem impacto nas outras rotas do País. As outras rotas não usam unicamente a ligação marítima para o turismo.

E que dizer do aumento absurdo dos preços das carinhas no percurso SV-SA-SV que certamente vai contribuir sobremaneira para estrangular as débeis economias de S. Vicente e Santo Antão? E assim, o impensável e impossível aconteceu.

Que tristeza ver o navio Chiquinho zarpar vazio do Porto Novo para Mindelo!

Neste quadro, a luta desencadeada pelos condutores de carrinhas de Santo Antão é justa e deve ser apoiada por todos nós.

Executivos, ajudem-nos a entender esses aumentos e políticas e, acima de tudo, ajudem-nos a lutar por preços coerentes porque estamos a sentirmo-nos injustiçados e inseguros.

Finalmente, senhores Presidentes das Câmaras de Santo Antão deem a mão ao vosso povo e sejam os nossos interlocutores. Façam o vosso papel.

CVI, não estamos contra vocês, queremos sim entender que os vossos preços e políticas são justos para a nossa ilha porque, neste momento, a primeira sensação que temos é de estarmos sendo roubados.

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Kimze Brito

Jornalista com 30 anos de carreira profissional, fez a sua formação básica na Agência Cabopress (antecessora da Inforpress) e começou efectivamente a trabalhar em Jornalismo no quinzenário Notícias. Foi assessor de imprensa da ex-CTT e da Enapor, integrou a redação do semanário A Semana e concluiu o Curso Superior de Jornalismo na UniCV. Sócio fundador do Mindel Insite, desempenha o cargo de director deste jornal digital desde o seu lançamento. Membro da Associação dos Fotógrafos Cabo-verdianos, leciona cursos de iniciação à fotografia digital e foi professor na UniCV em Laboratório de Fotografia e Fotojornalismo.

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