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A inflação, o “imposto” invisível…

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Por: Nelson Faria

Se todos temíamos o aumento do IVA no OGE 2022 sobre a tendência inflacionista que já se verificava no ano passado, constatamos hoje que, certamente, a mesma quantidade de dinheiro que tínhamos nessa altura, hoje, vale menos. Não por conta de aumento de impostos diretos ou indiretos, desconsiderando o IEC de duzentos mil escudos sobre determinadas viaturas que, apesar da relevância para o sector, se aplicará a um número menor de contribuintes,  preferindo focar, então, na inflação como “imposto” sobre o consumo de bens e serviços essenciais, na medida em que reduz os recursos disponíveis para consumo.

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Tentando explicar de uma forma simples, a inflação não mais é do que a o aumento generalizado do preço dos bens e serviços, facto verificado em Cabo Verde e no mundo pelos dados que nos são disponibilizados por todas as fontes que têm autoridade sobre o assunto e, sobretudo, vivido no quotidiano das nossas necessidades básicas. A situação mundial de aumento de preços por razões ligadas às quebras nas cadeias de produção e distribuição de matérias-primas, bens e serviços, por razões de transição energética e outras ligadas à geopolítica mundial no contexto de pandemia de Covid-19, tem levado à estupefação e dificuldades reais de muitos consumidores, num mundo onde Cabo Verde não é exceção. Sendo que em Cabo Verde também tem pesado o fator da seca severa que atravessamos, estando apontadas dificuldades extremas em vários quadrantes sociais e localidades do país, particularmente rurais.

Naturalmente, se associarmos o evidente ao óbvio, considerando que importamos a maior parte dos nossos bens de consumo e temos incapacidades reais de produzir alimentos em quantidade suficiente para todos, o fenómeno da inflação sobre bens de primeira necessidade não é, e não será, animador, quanto mais se verificarmos que em outras latitudes com outras capacidades produtivas a inflação é também uma realidade.

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A inflação pode ser “importada”, porventura, caso haja incapacidade produtiva, o nosso caso no imediato, pode ser provocada, com emissão de moeda superior à capacidade produtiva da economia local ou mesmo por especulação e açambarcamento nas cadeias de produção e distribuição. Independentemente das causas que levam a este fenómeno, sejam mundiais ou locais, certo é que, naturalmente, reduzirá o poder de compra e a capacidade de consumo das famílias, parecendo ser um “imposto invisível”, como referi, pela redução do poder e capacidade de consumo, levando também à desvalorização real da moeda. Se compreendemos a lógica tributária por ter regras definidas e claras, contudo, a lógica da inflação nem sempre é assimilada com a mesma clareza ou abertura e sequer temos onde reclamar, acabando as culpas no réu de sempre: o governo.

Um exemplo da nossa incompreensão sobre o “imposto invisível”, inflação, é visto quando o fenómeno acontece em valores assustadores e, geralmente, requerer-se, para as famílias, aumento nos rendimentos como se a simples emissão de moeda, aumento de salários, sem o correspondente aumento de bens e serviços, de produção efetiva, nada tivesse a ver com o fenómeno inflacionista e servisse apenas para colmatar o deficit do nosso poder de compra, sem interferir com a economia no seu todo e com a inflação em particular. Isto, numa lógica irracional de pensar que os recursos são ilimitados, sem considerar se o país e empregadores têm ou não recursos para promover esses aumentos. Errado!

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Em determinados contextos, a simples emissão de moeda, aumento de rendimentos, sem aumento de produção, levará à continuidade de aumento dos preços e uma escalada de inflação não controlada com efeitos indesejáveis sobre a economia e a vida das famílias, o que poderá arruinar um país. Creio ser ainda mais simples de explicar da seguinte forma: se aumentarmos a capacidade de consumo de forma descontrolada, simplesmente aumentando salários em valores que acompanham a inflação, apenas emitindo moeda sem o correspondente aumento de bens e serviços de consumo, sem aumento de produção, a procura de bens e serviços será igual ou superior à oferta, com mais moeda, logo a oferta de bens e serviços aumentará os preços e o aumento de rendimentos não se concretizará na capacidade de consumir mais bens e serviços ou no objetivo de se ter mais disponibilidade real de rendimentos. Basta ver o que foi a nossa vida nos últimos trinta anos no que o poder de compra e valor da moeda diz respeito.

Sou do tempo em que se comprava um pão por cinco escudos, depois, sete e aí por diante. Há quem seja do tempo que se comprava em tostões… Adiante, ou seja, o preço dos bens e serviços continuarão a senda de escalada em sucessivos aumentos. O que quero dizer é que o simples aumento de salários generalizado, neste contexto, pode não resolver o problema da escalada de aumento de preços e nem por isso fará com que aumente substantivamente o poder de compra já que o problema nas cadeias de produção e distribuição mantém-se e muitas delas não dependem de nós. Com certeza, atenua circunstancialmente algum déficit, porém, sem aumento de produção, contribuirá para a continuidade da escalada da inflação por mera aplicação da lei da oferta e da procura.

Mais do que nunca desafios e questionamentos nos são revelados pela realidade: como aumentar a nossa capacidade produtiva para gerarmos mais rendimentos com a produção, não somente pela via da exigência de aumento nos rendimentos? Em que sectores da economia intervir para ganharmos vantagem competitiva? Que potencialidades não têm sido devidamente exploradas? Qual a visão de desenvolvimento consensual entre todas as forças vivas para o desenvolvimento sustentável do país que não seja ao sabor do vento e apetites? Como encarar o contexto, que medidas sistêmicas e holísticas têm sido tomadas para atenuar a inflação e seus efeitos? O endividamento excessivo do país não terá o mesmo efeito na perda de rendimentos e exigência de sacrifícios futuros? Que comportamentos e exemplos temos tido e devem-se verificar nas lideranças de modo a que esta realidade seja melhor compreendida e enfrentada por uma nação unida nos sacrifícios? Não ter respostas permite-me refletir.

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Kimze Brito

Jornalista com 30 anos de carreira profissional, fez a sua formação básica na Agência Cabopress (antecessora da Inforpress) e começou efectivamente a trabalhar em Jornalismo no quinzenário Notícias. Foi assessor de imprensa da ex-CTT e da Enapor, integrou a redação do semanário A Semana e concluiu o Curso Superior de Jornalismo na UniCV. Sócio fundador do Mindel Insite, desempenha o cargo de director deste jornal digital desde o seu lançamento. Membro da Associação dos Fotógrafos Cabo-verdianos, leciona cursos de iniciação à fotografia digital e foi professor na UniCV em Laboratório de Fotografia e Fotojornalismo.

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