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João Santos, antigo armador, defraudado com concessão dos transportes marítimos

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O técnico naval e conhecido armador João Santos afirmou em entrevista ao Mindelinsite que está insatisfeito e se sente defraudado com a concessão dos transportes marítimos em Cabo Verde. Antes reservada aos armadores nacionais, este entende que o Governo decidiu entregar o sector a um operador internacional, no caso a Transinsular, que criou uma empresa de fachada – a Cabo Verde Interilhas – para poder disputar e vencer o concurso para a exploração dos transportes marítimos interilhas. No fundo, diz, quem explora este sector é uma empresa estrangeira, que não possui o know how, prática e nem especialistas na cabotagem nacional.

Para este técnico naval, o transporte marítimo no país está um caos devido a inoperância e gestão deficiente da CVI. E é com nostalgia que lembra o período colonial e pós-independência, quando a banca apoiava os armadores nacionais na aquisição das suas unidades. “Os armadores nacionais são capazes de fazer melhor. Fui o primeiro armador que trouxe um catamarã que navegava em mar aberto”, desabafa Santos, que diz ter sido surpreendido com o resultado do concurso que atribui a concessão a uma empresa estrangeira, que desconhece a cabotagem nacional.

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No seu entender, a maior prova do amadorismo foi a escolha dos navios para o tráfego interilhas. “Estão operacionais os navios Kriola, Liberdadi, Chiquinho e o Praia d´Aguada. São embarcaçoes que não conseguem dar vazão a demanda do país porque não estão preparados para trabalhar em mar aberto. Tirando o Praia d´Aguada, os outros são catamarãs construídos para navegar no litoral ou nos rios. O Chiquinho, por exemplo, é um navio de navegação fluvial”, refere este armador. Este afirma que as decisões técnicas têm sido suplantadas por outras políticas.

Santos alega que, quando soube que estavam a pensar adquirir os ferries Kriola e Liberdadi, alertou alguns responsáveis para o risco que estes representam, tendo em conta que não são adequados para navegar no oceano, mas foi ignorado. E desde que chegaram, diz, deram apenas prejuízos. “Pedi para fazerem espelho nos catamarãs da Moura, que nunca chegaram a operar no país. Mas ninguém levou em consideração os meus avisos”.

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Afirma que os armadores nunca pediram dinheiro ao Governo para comprar navios. Pediram sim avales para recorrer às instituições financeiras internacionais, que se comprometeram a financiar o sector privado. “Temos a possibilidade de adquirir navios com grande capacidade de carga e passageiros no Japão, país com quem temos uma boa cooperação desde sempre. Penso que Japão estaria disposto a ajudar Cabo Verde e os armadores a conseguirem novas unidades e mais adequadas.”

Portos sem sistema de carga e descarga

Santos critica também a ausência de um sistema de carga e descarga nos dois maiores portos de Cabo Verde: Porto Grande e Porto da Praia. Para este armador, é caricato nos dias de hoje a Enapor recorrer a empresas privadas com gruas para fazer este trabalho. “Seria mais útil neste momento equipar os portos. A Enapor tem de mudar a sua política porque os armadores nacionais estão a ter prejuízos. A empresa não quer saber dos armadores nacionais. A Enapor, junto com a Cabnave, estão a dar cabo das tesourarias dos armadores nacionais. Deveriam ser mais tolerantes.”

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Segundo este armador, estes foram alguns dos motivos porque não participou no concurso de concessão dos transportes marítimos. Todavia não reconhece competência a Transinsular, a coberto da CVI, para prestar este serviço. Admite que os tempos mudaram e as exigências também e hoje o sistema roll on, roll off é uma prioridade. Porém, tirando o Praia d´Aguada – que não é ro-ro, os restantes não são embarcações de mar aberto. “Veja o caso do Chiquinho, que liga S. Vicente a Santo Antão. As pessoas não têm noção do risco de fazer esta viagem num navio fluvial. Trata-se de um navio construído para navegar em águas mais calmas.”

Proprietário dos navios Mar Azul e Mar Novo, que durante anos ligaram estas duas ilhas e conhece todos os segredos do “canal”, Santos fala com conhecimento de causa. Lembra que, na altura, trouxe um catamarã junto com um amigo norueguês, mas não conseguiu autorização para operar. “Chegamos a fazer duas viagens experimentais, uma entre S. Vicente e Santo Antão e outra entre São Vicente e Sal com 300 passageiros a bordo. Foi uma pena terem bloqueado a iniciativa.”

Lidiane Sales (Estagiária)

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Constanca Pina

Formada em jornalismo pela Universidade Federal Fluminense (UFF-RJ). Trabalhou como jornalista no semanário A Semana de 1997 a 2016. Sócia-fundadora do Mindel Insite, desempenha as funções de Chefe de Redação e jornalista/repórter. Paralelamente, leccionou na Universidade Lusófona de Cabo Verde de 2013 a 2020, disciplinas de Jornalismo Económico, Jornalismo Investigativo e Redação Jornalística. Atualmente lecciona a disciplina de Jornalismo Comparado na Universidade de Cabo Verde (Uni-CV).

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