Dias consecutivos de operações, “sem direito a descanso”, começam a provocar um alegado desgaste no seio dos agentes da PNSV. Dois policiais e o presidente do sindicato Sinapol confirmam esse cenário e Rufino Lima fala mesmo num clima de “tensão” instalado dentro do Comando Regional.
O sentimento de segurança está regressando paulatinamente à cidade do Mindelo, onde a Polícia Nacional intensificou nas últimas duas semanas as operações diárias e a presença de agentes na rua. Estas medidas foram basicamente a resposta dada pelo Comando Regional às preocupações dos mindelenses devido ao aumento exponencial da criminalidade, marcada por roubos, furtos na via pública e residências e transgressões sistemáticas às regras de trânsito, em particular por motocicistas. Um quadro que, aliás, provocou uma manifestação pacífica da população no passado sábado, com centenas de pessoas a fazer uma corrente-humana pela paz social, na Avenida Marginal.
Porém, os agentes começam a dar sinais de desgaste por causa da sobrecarga de trabalho, como apurou o Mindelinsite junto de dois policiais e o presidente do Sindicato Nacional da Polícia – Sinapol. Conforme os seus relatos, os efectivos passaram a trabalhar todos os dias, sem usufruírem do tempo de folga a que têm direito, situação que está a provocar um clima de tensão dentro do Comando de S. Vicente. “Trabalhamos todos dias, sem um dia de folga. Mesmo assim, no intervalo do turno, ou seja, no dia em que saímos do serviço às oito da manhã, após uma pesada noitada, somos convocados novamente a comparecer no Comando para trabalhar”, comenta um agente, sob anonimato, que equipara essa imposição à escravatura.
Para outra fonte da PN, o nível da criminalidade em São Vicente é uma responsabilidade do Governo, que, diz, não tem vindo a aumentar os efectivos na ilha nos últimos tempos. “Como as coisas estão a piorar a olhos vistos, querem matar os agentes com sobrecarga de trabalho para dar resposta à sociedade civil”, desabafa, referindo-se indiretamente aos crescentes posts e comentários sobre a actuação da Polícia nas redes sociais.
Bastante contundente, critica a alegada postura do Comando da PN, pois, na sua opinião, o combate à criminalidade não terá sucesso com agentes desmotivados. Acontece, segundo este policial, que os comandantes querem apenas mostrar a presença da PNSV na rua, mas sem que os operativos tenham as condições físicas e psicológicas necessárias para executarem as suas tarefas.
“É preciso dizer à sociedade que não temos agentes suficientes para as demandas de São Vicente e muito menos viaturas”, afirma. Esta fonte deixa claro que os agentes querem trabalhar e que não se sentem bem com o nível da criminalidade instalada em S. Vicente, até porque as suas famílias também são vítimas desse fenômeno. Frisa, no entanto, que os resultados serão efémeros se não houver um aumento dos recursos humanos e materiais.
Presidente do Sinapol confirma tensão e agenda viagem para SV
O presidente do Sinapol confirma a existência de um clima de tensão no Comando Regional de S. Vicente. Adianta, aliás, que a direção do sindicato agendou uma deslocação à cidade do Mindelo na próxima semana, acompanhada do presidente da Central dos Sindicatos Livres, José Manuel Vaz, para debater essa situação com o pessoal da PNSV.
Segundo Rufino Lima, dirigente do Sinapol, o problema tem a ver com a forma como a Direção Nacional Adjunto de Operações resolveu enfrentar o “aparente pico criminal” em S. Vicente. Afirma que há uma clara e visível discórdia com os oficiais da PNSV, dada a sobrecarga de trabalho. Revela que a intensidade das operações tem sido vista como uma espécie de “castigo” aplicado aos agentes, como se fossem eles os culpados pelo clima de insegurança. “A instituição não pode passar para o pessoal essa lógica de ‘castigo’, mas sim estimular o sentido de missão no quadro constitucional”, entende Rufino Lima.
Pedido para opinar sobre as eventuais causas do aumento da criminalidade em S. Vicente, Lima diz que essa não é da sua competência, enquanto sindicalista. Enfatiza no entanto que as questões operacionais são da responsabilidade da Direção Nacional da Polícia Nacional e do Comando de S. Vicente. Cabe-lhes, diz, indagar e planear a melhor forma de prevenir o cometimento de crimes, ou, neste caso, agir para amenizar os índices criminais em todo o país.
O Mindelinsite conta ouvir o posicionamento e esclarecimentos da Polícia Nacional sobre o assunto.