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O cancro não é o fim

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Este texto não é novo. Talvez o seja para alguns e espero que sim, principalmente para aqueles que mais recentemente ouviram a frase “Tu tens câncer”. Talvez, esses, pensaram ou pensem que chegou o fim. Para aqueles que não sabem, pela graça de Deus e pelos bons cuidados médicos a que tive acesso, sou sobrevivente de cinco cânceres (bexiga, próstata, pâncreas e nas duas mamas)…

Por: Álvaro Ludgero Andrade

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Neste Dia Mundial de Luta Contra o Câncer quero abraçar a todos que por cá passarem e dizer-lhes que não, não é o fim. Para aqueles que não sabem, pela graça de Deus e pelos bons cuidados médicos a que tive acesso, sou sobrevivente de cinco cânceres (bexiga, próstata, pâncreas e nas duas mamas), mas nenhum relacionado com o outro, sem metátese e sem qualquer explicação médica, mesmo depois de dois exaustivos testes genéticos, negativos.

Se uso este meio, e o tenho feito com alguma regularidade, é tão somente motivado pela “obrigatoriedade natural” de dar o meu testemunho, mostrar a minha gratidão e tentar ajudar aqueles que passam ou virão a passar por essa luta, muitas vezes inglória, mas sempre de muito valor.

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A minha luta começou em 2011 e, desde 2020, do ponto de vista médico, sou sobrevivente. Nesta travessia aprendi muito e descobri algumas ferramentas que gostaria de compartilhar em jeito de motivação.

1. Reconhecimento. Aprendi a reconhecer que estava doente e que não havia como dar a volta ao texto, ou seja, a prioridade das prioridades era tratar-me. Interrompi um projecto profissional em que coloquei toda a minha capacidade e energia, 24/24 horas 7/7 dias, tive de deixar a minha terra, para onde regressara quatro anos antes, depois de nove maravilhosos anos em Miami. Aceitar que a frase “tu tens câncer” é real, é pedra angular da cura, mas é fundamental saber que não é o fim.

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2. Motivação. Identifiquei que tinha de encontrar uma motivação superior, pela qual teria de lutar. Encontrei-a nos meus filhos e na necessidade de acompanhar o crescimento deles, na minha esposa e família, e no propósito que, sabia, Deus tinha e tem para a minha vida desde que nasci.

3. Sintonia integral. Reconheci que a minha mente, a minha alma, o meu corpo, os meus objectivos e todo o meu entorno deviam estar em sintonia para que, juntos, “trabalhassem” para o mesmo fim. Não podia ter dúvidas na minha mente, enquanto entregava o corpo ao tratamento, ao mesmo tempo que a minha alma andava carregada de sentimentos contraditórios. Descubri que teria de procurar um ambiente positivo e confluente para a minha cura, colocando de lado até pessoas que pudessem levar-me a duvidar do caminho.

Fugi de pessoas negativas e, ante qualquer potencial decreto de morte, a minha alma descansava no sangue de Jesus que, como diz a Bíblia, levou as minhas doenças. Neste ambiente saudável, a família desempenhou um papel determinante, principalmente no aspecto psicológico. O doente não pode ser visto como condenado à morte, mas apenas um doente em tratamento, por isso, mais um da família e não o “coitadinho” que merece a pena de todos.

4. Actividade permanente. Nunca parei de trabalhar um único dia. Inclusive durante as sessões de quimioterapia, continuei a escrever, a fazer projectos e, nos últimos anos, a trabalhar diariamente. Cheguei a trabalhar com bolsas e tubos pendurados. Recomendo com quem tenho a oportunidade de falar a manter o corpo e a mente ocupados, em projectos viáveis. A viver intensamente.

5. Nada de lamentar. “Porquê eu?”, foi uma pergunta que nunca permiti que se alojasse na mente, mormente fazer morada na minha alma ou no meu espírito. Podia ter significado a morte do corpo. Chorei, sim, houve momentos de desânimo, quase me desesperei, mas lutei para não lamentar, recusei considerar-me condenado e refutei a ideia de que estava perante qualquer castigo divino. Admiti sim e assumi que tinha de lutar, para poder vencer.

6. Tratamento radical. Desde a primeira hora, aprendi a escolher o tratamento radical. Onde foi possível cirurgia, preferi ir à faca do que passar por tratamentos outros como quimioterapia ou radioterapia. Apenas no primeiro câncer (bexiga) recebi quimioterapia, seguida de uma cirurgia radical. No final, os médicos concluíram que integro um grupo de 3,5 por cento da população mundial que tem células resistentes à quimioterapia que recebi. Nos outros três optei sempre pela cirurgia.

Mais: depois de me ter sido retirada a mama esquerda, pedi para que fosse feito o mesmo com a outra. Apesar de, nos exames, a mama direita ter aparecido como estando limpa, o facto é que, após a sua remoção, a biópsia comprovou que havia um câncer em desenvolvimento. Neste tipo de lutas, a estética é a última na escala de opções.

7. Fé inabalável. Aqui pode radicar a diferença para uma recuperação total e, no meu caso, acredito que a minha fé em Deus e o recurso permanente a ele através da oração foram basilares na minha cura. Para mim, mais do que os instrumentos acima citados, houve um elemento nesta “trindade” final: o propósito de Deus e o pacto que temos. O ponto de partida continua a ser a fé e o pacto com Deus. Sem religiosidade, sem dogmas, sem rituais, sem sacrifícios, sem pagamento de dinheiro! Conclusão: A frase “tu tens câncer” está longe de ser uma sentença e, caso o seja, há onde recorrer. Fé, Força e Foco funcionam.

Vamos lá, guerreiras e guerreiros! Um último apelo: não tens de ir ou frequentar uma comunidade de fé, ter uma religião ou passar a integrar qualquer denominação religiosa ou seguir dogmas, rituais e manuais. Se tiveres fé em Deus, faz como Jesus ensinou: “Vai para teu quarto, fecha a porta e ore a teu Pai, que está em secreto. Então teu Pai, que vê em secreto, te recompensará”. Simples!

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Kimze Brito

Jornalista com 30 anos de carreira profissional, fez a sua formação básica na Agência Cabopress (antecessora da Inforpress) e começou efectivamente a trabalhar em Jornalismo no quinzenário Notícias. Foi assessor de imprensa da ex-CTT e da Enapor, integrou a redação do semanário A Semana e concluiu o Curso Superior de Jornalismo na UniCV. Sócio fundador do Mindel Insite, desempenha o cargo de director deste jornal digital desde o seu lançamento. Membro da Associação dos Fotógrafos Cabo-verdianos, leciona cursos de iniciação à fotografia digital e foi professor na UniCV em Laboratório de Fotografia e Fotojornalismo.

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