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E depois do temporal? Como reconstruir na ressaca do “day after”?

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David Leite

“O temporal Erin não foi só ribeiras e inundações – e não terminou com elas pois os efeitos colaterais podem ser duradouros.”

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Os impactos sobre o habitat urbano, por estarem mais à vista, foram largamente comentados, filmados, difundidos… mas nem uma palavra se ouviu sobre os impactos ambientais, nomeadamente no mundo rural e nos fundos marinhos, com nefastas consequências para a agricultura e a oferta turística.

Num precedente artigo, achei por bem levantar o véu sobre os prejuízos menos visíveis do temporal. Pus a tónica na poluição subaquática que afectou a rica biodiversidade da Baía do Mindelo que, em alguns segmentos litorâneos, vai levar tempo até voltar à cor azul-marinho das suas águas.

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Mas, de pouco adianta enumerar os incalculáveis prejuízos por conta do temporal se não aprendermos com a sabedoria da mãe-Natureza que, se falasse, nos diria: – “Fihos! Se estivésseis de bem comigo, teríeis água em abudância para agricultura e saneamento, e não haveria tanta lama no fundo dos vossos mares”.

Quem tem ouvidos, que ouça! Quem deve de agir, que haja! As alterações climáticas obrigam-nos a repensar, AGORA, e sem mais delongas, a nossa relação com a Natureza. Tudo quanto fizermos, que seja apoiado em estudos sérios de impactos ambientais, em vez de estarmos a construir casas nas ribeiras e canais de drenagem pluvial como já vimos em S Vicente! As águas mostram-nos o seu caminho, e nós é que temos que lhes deixar a via livre! Se não reaprendermos a viver em harmonia com a Natureza, condenamo-nos a pagar a factura da nossa ganância e do nosso atrevimento!

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Agir na prevenção para mitigar os efeitos da fatalidade

E agora, de duas uma: ou vivemos com o credo na boca à espera de uma nova “Erin”, ou agimos na prevenção para mitigar os efeitos de um indesejável “déjà vu”.

Além da mão estendida da nossa diáspora solidária e generosa, quero crer que o Governo de Cabo Verde terá lançado um apelo urbi et orbi para mobilizar parcerias e angariar apoios internacionais a fim de resgatar a lha de S. Vicente (mas também de S. Nicolau, S. Antão e Santiago-Norte). Os avultados montantes arrecadados nos confortam na gratidão de não estarmos sós no mundo: só o Banco Mundial disponibilizou 10 milhões de dólares para ações emergenciais nas ilhas afectadas.

Mas… cadê comunicação? Hoje, dia 11 de dezembro, quatro meses volvidos sobra a fatídica data, continuamos sem saber ao certo o que vai acontecer de agora em diante. Não há notícia dos levantamentos e estudos hidráulicos que pensamos existirem nos gabinetes técnicos. Ainda não vimos uma agenda ou calendário que nos elucide sobre os planos de contingência na previsão de futuras intempéries, esperando que não sejam tão devastadoras e traumatizantes.

Apesar deste aparente “no-stress”, ouso acreditar que está tudo a postos para arrancar com as obras; que a agenda e o calendário dos trabalhos serão tornados públicos e socializados; que seremos devidamente informados para podermos acompanhar em tempo real as operações de “resgate”.

O tempo do balanço, dos estudos e declarações de intenção, já passou! A poeira assentou, e numa coisa estamos todos de acordo: correção torrencial precisa-se, e é tempo de agir! Mas “corrigir” já não é suficiente – é tempo de edificar, construir para durar! De montante a jusante, mais diques de retenção, mais barragens para travar a fúria das águas, canalizando-as para reservatórios subterrâneos que garantam água para saneamento e rega.

É hora de quebrar rochas, “furar” ruas e avenidas! Trânsito condicionado pelo tempo que for preciso! Se uma outra Erin nos apanha desprevenidos, o turismo e o meio ambiente serão certamente impactados, e com eles toda a economia, mormente depois de um egoísta e mesquinho de nome Trump nos ter retirado (resta saber porquê) o 3°compacto MCC, privando-nos de um precioso contributo ao desenvolvimento destas ilhas.

Paciência, continuaremos a caminhada: se nos alçámos ao pódio do crescimento médio-alto, não era agora que íamos fechar as portas, apagar as luzes e correr os cortinados!

Mas o tempo é AGORA! E que ninguém me diga “mais vale tarde que nunca” porque vou desde já replicando: quanto antes, melhor. Não se limpa arma em tempo de guerra!

PS: não consegui encontrar uma carta hidrográfica de S. Vicente que já tive em mãos. Desde já agradeço a quem ma puder enviar.

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Kimze Brito

Jornalista com 30 anos de carreira profissional, fez a sua formação básica na Agência Cabopress (antecessora da Inforpress) e começou efectivamente a trabalhar em Jornalismo no quinzenário Notícias. Foi assessor de imprensa da ex-CTT e da Enapor, integrou a redação do semanário A Semana e concluiu o Curso Superior de Jornalismo na UniCV. Sócio fundador do Mindel Insite, desempenha o cargo de director deste jornal digital desde o seu lançamento. Membro da Associação dos Fotógrafos Cabo-verdianos, leciona cursos de iniciação à fotografia digital e foi professor na UniCV em Laboratório de Fotografia e Fotojornalismo.

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