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Público disposto a subscrever queixa contra magistrado que mandou prender A. Oliveira, na sequência da palestra de Germano Almeida

O público que na noite de ontem lotou o auditório do Centro Cultural do Mindelo para ouvir o advogado Germano Almeida falar do processo que levou à detenção do deputado Amadeu Oliveira há mais de um ano – no dia em que o Parlamento levantou-lhe a imunidade para ser julgado – mostra-se disponível para apoiar a formalização de uma queixa contra o juiz que emitiu a ordem de prisão. Igualmente, essas pessoas querem que este caso seja levado às instâncias internacionais e exigiram uma intervenção firme do Presidente da República, enquanto o mais alto Magistrado da Nação, porquanto, de acordo com os presentes, o Estado Democrático de Direito em Cabo Verde está em risco.

Foi uma verdadeira aula de Direito, ministrada por Germano Almeida, que se fez acompanhar dos advogados Maria João Novais e Emma Gomes. Este conceituado escritor começou por destacar o facto de a palestra acontecer no dia em que a AN “teve a indignidade” de suspender o mantado do deputado Amadeu Oliveira, acto que, no seu entender, podia ter justificação há um ano. Da forma como as coisas aconteceram ontem, diz, mostrou um Parlamento a violar a Constituição, o Estatuto dos Deputados e, em última linha, os direitos dos cidadãos cabo-verdianos. No entanto, o advogado não se mostrou minimamente surpreendido com a decisão da AN. 

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A forma como o líder Parlamentar do MpD conduziu o processo fez-me perceber que estavam preparados para votar pela suspensão do mandado. Não foi uma questão de justiça, mas de perseguição e vingança. E isso é que magoa, na medida em que a instituição máxima do poder do Estado procede desta forma. Poderiam ter emendando a mão, mas o que se ouviu da parte dos deputados do MpD foi como se o Amadeu fosse um terrorista que era preciso abater”, desabafou.

Maurino Delgado, Ema Gomes, Germano Almeida e Maria João Novais

Para Almeida, o que os deputados fizeram foi “tudo, menos aplicar o direito e a justiça”, realçando que não se deve aceitar sem protesto os abusos das autoridades. “O deputado Oliveira está ilegal e ilegitimamente preso. É contra isso que protestamos. Contra este abuso de autoridade que já não acreditávamos ser possível neste Cabo Verde, que se gaba de ser uma democracia avançada e grita aos quatro ventos que garante a defesa dos direitos humanos”, disse, lembrando que A. Oliveira foi eleito e investido, pelo que nunca podia ser preso sem que determinados requisitos fossem cumpridos.

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Erro de palmatória 

Não foi isso aconteceu, na sua óptica. Ao contrário, segundo Germano Almeida, o processo foi mal conduzido à partida. Ele que aproveitou para explicar todo o procedimento previsto na lei, que determina, entre outros, que, só depois de pronunciado pelo crime, A. Oliveira deveria ser suspenso e entregue ao poder judicial para ser julgado. “No caso do A. Oliveira, tudo aconteceu como se não houvesse leis a respeitar, como se estivéssemos ainda no tempo do fascismo e cada autoridade fez o que bem entendeu”, afirmou e apontou como exemplo o pedido do PGR à AN para a audição do deputado, após o extravagante regresso de A. Oliveira a Cabo Verde, depois de acompanhar o constituinte Arlindo Teixeira à França, acto que foi visto como uma fuga à justiça desse arguido num processo de homicídio. 

E, sem que a AN estivesse reunida, enfatiza Germano Almeida, a Comissão Permanente autorizou a audição do deputado, não obstante, diz, esta ser matéria de exclusiva competência do plenário. “É muito mau que o órgão máximo do poder do Estado, em matéria legislativa, tenha cometido este monumental erro de palmatória e, mais grave, se recusa a reconhecer e corrigi-lo. Foi nesta sequência que A. Oliveira foi ouvido e preso por certos magistrados que o apanharam a jeito e o meteram na cadeia”, assegurou Germano Almeida, que questionou se as gravíssimas acusações proferidas por Amadeu Oliveira contra magistrados ao longo dos anos não têm razão de ser, perante este “acto de vingança”. A seu ver, mesmo que Oliveira tivesse ajudado o seu constituinte a fugir, enquanto deputado da Nação só deveria ser preso depois de pronunciado e autorizado pelo plenário da Assembleia Nacional, como aconteceu esta quinta-feira.     

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“Os procedimentos legais foram todos atropelados e omitidos. A sua prisão não tem origem numa deficiente interpretação da lei. Foi ocasionada pelo abuso de poder de um magistrado, que desta forma está cometendo um crime de prevaricação, perante a passividade de todos os poderes e autoridades”, sustenta, frisando que este crime está previsto no artigo 328º do Código Penal e é conhecido por todas as autoridades. Este reza que o “juiz que, contra o direito e com intenção e a consciência de prejudicar ou beneficiar alguém, no âmbito dos poderes que lhe são conferidos em processo criminal, proferir despacho ou sentença que tenha por consequência a privação da liberdade de uma pessoa ou a sua manutenção de forma ilegal, será punido com a pena de prisão de dois a oito anos.”

Perante os factos, entende que Assembleia Nacional, que deveria proteger os seus deputados, assumiu-se, por seus actos e palavras, como cúmplice das magistraturas que cercam A. Oliveira, violando deliberadamente a Constituição da República. Um comportamento que, enfatiza Almeida, foi apenas para salvar a face da Procuradoria e dos tribunais, “escancarando as portas a um crime de prevaricação e impossível de ser ocultado ou até mesmo disfarçado, tendo em conta que o deputado está preso sem ser pronunciado e sequer ser ouvido”.  E como não se pode esperar do Governo qualquer acção sustentável de questionar o poder dos juizes, resta apenas o PR e talvez o Provedor de Justiça a quem recorrer. 

Após a explanação de Germano Almeida, houve ainda tempo para esclarecimentos prestados pela advogada Maria João Novais e muitos questionamentos dos presentes. Foram os casos de Manuel Filipe Santos (Futche), do líder dos Sokols, Salvador Mascarenhas, do ex-presidente da UCID, Lídio Silva, e do actual, João Santos Luís, da ex-deputada Filomena Martins, de entre outros. Todos lamentaram a decisão da AN e apelaram a apresentação de uma queixa contra o juiz pelo crime de prevaricação. Igualmente foi pedido a abertura de uma investigação para se encontrar os canais para apresentação de uma queixa internacional contra o Estado de Cabo Verde, enquanto se aguarda uma intervenção firme do PR. 

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Constanca Pina

Formada em jornalismo pela Universidade Federal Fluminense (UFF-RJ). Trabalhou como jornalista no semanário A Semana de 1997 a 2016. Sócia-fundadora do Mindel Insite, desempenha as funções de Chefe de Redação e jornalista/repórter. Paralelamente, leccionou na Universidade Lusófona de Cabo Verde de 2013 a 2020, disciplinas de Jornalismo Económico, Jornalismo Investigativo e Redação Jornalística. Atualmente lecciona a disciplina de Jornalismo Comparado na Universidade de Cabo Verde (Uni-CV).

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