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O Equilíbrio da Família e a Mitigação da Violência Urbana

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Por: Armindo Tavares

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Porque a sociedade muda, também as famílias ao longo da civilização humana têm apresentado formatações variáveis, coincidentes e adequadas aos contextos culturais, económicos e sociais de que fazem parte.

Famílias fortemente hierarquizadas ou famílias mais democráticas na sua organização, famílias patriarcais ou matriarcais, famílias extensas, alargadas ou nucleares, mas famílias que, apesar da sua diferença organizacional, apresentam traços comuns: a origem, (o par), o projecto/compromisso, as finalidades. É evidente que as famílias deixaram de ter as características essenciais devido a fraca intervenção do Estado que não subsidia as próprias famílias; por isso, há novas dificuldades – dificuldades nas relações conjugais, dimensão das famílias, conciliação da vida familiar e profissional, o que requer tempo para desempenhar as suas funções e finalidades.

Na minha santa ignorância, penso que há um conjunto de perda de competências no acolhimento, socialização, relação e cuidados primários. Por isso, há um enfraquecimento dos papéis das famílias, isto é, as crianças contam cada vez menos com a companhia das famílias. No entanto, está claro que a relação mais estruturante de cada família é a relação conjugal porque é ela que, através do amor, sustenta a relação parental e porque a sua observação pelos filhos, permite replicar, formar atitudes e valores. A primeira coisa que as pessoas põem sempre em primeiro lugar é a família e esperam ser felizes, e isso tem que ver com o modelo de família, só que depois é que se chega a conclusão que não estão capacitados para dar resposta a solidariedade, gratuitidade da relação, devido a fragilidade, modificações ideológicas individuais do nosso comportamento.

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O que diferencia o ser humano dos outros seres é a sua capacidade de dar respostas aos diversos desafios que a realidade impõe. Mas essa apreensão da realidade e esse agir no mundo não se dão de maneira isolada. É na relação entre homens e mulheres e destes e destas com o mundo que uma nova realidade se constrói e novos homens e mulheres se fazem; criando cultura, fazendo história. Todos, de alguma forma, agem e buscam respostas para as suas necessidades, e por isso, não há ser humano vazio de conhecimento, de cultura. A partir das relações do homem com a realidade, resultantes de estar com ela e de estar nela, pelos actos de criação, recriação e decisão, vai dinamizando o seu mundo.

A família, como é do conhecimento de todos, é a base da sociedade em toda e qualquer sociedade. Por isso, há que ter respeito pela vida, sem discriminação, pois Deus criou o homem e a mulher em tudo idênticos na humanidade: que a total identidade entre o homem e a mulher, em princípio está consolidada e que no mundo ocidental, já ninguém põe em dúvida a sua comum dignidade pessoal, da qual deriva a total paridade de direitos e deveres.

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Por isso, neste momento o que está em causa já não é a identidade, uma vez que neste aspecto há respeito, mas o que está em causa é a diferença, isso porque desde criancinhas somos educados para colher a diferença com carácter distintivo de toda a realidade; muito se tem escrito nas últimas décadas sobre a diferença sexual e de papéis sociais, pois, o pensamento da diferença continua a ser ainda hoje um tema substancialmente ingrato e que progressivamente, a espessura do mistério contido na diferença sexual acabou por perder o seu significado profundo.

Por isso, a identidade – diferença caiu lentamente em desuso e foi substituído pelo mais ‘manipulável’ igualdade – diversidade, assimilando a diferença sexual à diversidade de natureza diferente indicando a abertura de um leque de possibilidades e a mudança de algo que trás à colação para fora de si sem se referir a essência íntima do indivíduo. A diferença mencionada não indica uma relação entre duas coisas. O termo igualdade estabelece uma semelhança formal entre realidades diferentes – diferentes sexualmente, mas iguais em termos de amor, respeito mútuo, direitos, deveres e outros, enquanto a identidade, refere-se ao eu como pessoa.

A mulher tem um carácter singular que deve ser apreendido em todo o seu alcance para não se correr o risco de o reduzir a uma espécie de prémio de consolação atribuído à mulher sem beliscar o preconceito machista. O segredo da mulher encerra-se na sua condição de ser eminentemente o lugar da diferença e que a mulher é o sinal mais forte de Deus. “Tudo menos sentimento de inferioridade e que se cada mulher tivesse consciência disso, irromperia num canto de gratidão semelhante ao magnificant de Maria” (João Paulo II, Mulieris Dignitatem). Por isso, a dignidade da mulher, citando o Papa ‘é medida pela ordem do amor’.

Neste caso, todo o homem está confiado de forma especial à mulher. De facto, o homem só sente feliz se tiver o outro como interlocutor “o eu e o outro”. Quanto mais amor, amizade se dá ao outro, mais terá para si. Esta é a condição pela qual o homem e a mulher se sentem felizes e realizados. A relação eu – tu é fundamental sobre o qual assente toda a história do homem. No entanto, o outro é um termo cada vez mais desvanecido, isto é, o eu está cada vez mais individualista, desvinculado de todos os laços; um eu sem o outro é considerado como um empecilho, senão mesmo como um verdadeiro inimigo. Cada um procura a sua satisfação pessoal, satisfação esse que continua a ser em todo o caso, bem mais do que uma mera saciedade das necessidades pessoais fundamentais e por isso, acaba depressa. Para abrir o espaço que é próprio do amor, é preciso sair de si para dar lugar ao outro. O eu encontra o tu e é por isso que a diferença sexual no homem tem um carácter singular e irrepetível.

Assim como cada pessoa, quando nasce, nasce única e irrepetível, aquele homem e aquela mulher, quando se casam e têm o primeiro filho, torna-se uma família única e irrepetível: não há duas famílias iguais e por isso, não se pode dar o mesmo tratamento à duas coisas que são diferentes por natureza. Por isso, a família deve ser vista como um todo, como um sistema que tem objectivos fundamentais, que consistem em possibilitar o desenvolvimento e a individualização dos seus membros, estabelecendo um sentimento de pertença e facilitar a integração dos mesmos no meio sociocultural em que se encontram inseridos.

Cada família possui uma organização que lhe confere uma individualidade e autonomia. Falar de uma família equilibrada, implica falar em valores, em que os pais ensinam aos filhos um conjunto de princípios que são fundamentais para o bom funcionamento da sociedade. Por isso, é preciso investir nas relações interpessoais (bom dia, boa tarde, com licença, desculpe, etc.); afectivas (sentir, abraçar, gostar, beijar, amar); de vinculação, de intimidade, de conjugalidade, (construir, querer, partilhar, falar), de maternidade e de paternidade, (dedicar, ouvir, sonhar, cantar, proteger, brincar, saber e conviver). Isto implica falar também de políticas de família e políticas para as famílias. Lá onde as famílias falharem, o Estado e outras organizações devem estar sempre presentes no sentido de as subsidiarem e colmatarem as falhas existentes.

Senão vejamos: a violência urbana é um dos muitos reflexos das desigualdades sociais e a melhor forma de a combater é ir directamente às suas causas, principalmente as sociais, melhorar as condições de vida das famílias, criar oportunidades de desenvolvimento económico e cultural dos seus membros, investir mais na educação, pois, para além de minimizar a violência, torna o indivíduo mais preparado para o mercado de trabalho, compreender a sociedade onde vive e contribuir para melhorá-la. A existência de múltiplos níveis de resolução do problema constitui um desafio para a formulação de políticas de prevenção da violência urbana que promovam o desenvolvimento social e enfrentem factores de risco específicos: medidas estruturais para a promoção da equidade social, de direitos civis e humanos fundamentais, o acesso à educação e cuidados de saúde, oportunidade de emprego e trabalho digno são fundamentais para a manutenção e desenvolvimento de formas pacíficas da coexistência social.

Quando estamos perante famílias desestruturadas, multidisfuncionais, a violência doméstica é uma realidade e esta realidade mais cedo ou mais tarde acaba por contaminar toda a sociedade. Deste modo, o conflito parental pode ser reduzido e até eliminado, e a aprendizagem de um estilo parental afirmativo pode conseguir-se através de programas e projectos de melhoria de competências relacionais e parentais. A estabilidade familiar pode ser fortalecida e as rupturas reduzidas através de políticas públicas, programas de fortalecimento e de orientação familiar. Por outro lado, em famílias, onde o nível de conflito parental é reduzido e se desenvolve uma parentalidade afirmativa, os filhos apresentam um melhor desenvolvimento.

No entanto, crianças, filhos de pais com histórias de problemas comportamentais, incluindo agressão e comportamentos anti-sociais, têm tendência em reproduzir os mesmos actos quando forem homens e mulheres, tanto em casa, como na escola e que este comportamento está tendencialmente vocacionado para as populações vulneráveis. Sendo uma responsabilidade social, a construção de uma sociedade coesa e estável só será possível tendo por base relações familiares estáveis e funcionais.

As medidas de política e todos os programas de prevenção e educação relacional devem ajudar os indivíduos a: compreender melhor os benefícios do casamento estável; promover o desenvolvimento de expectativas realistas sobre o casamento e como elas são possíveis de alcançar e reforçar; compreender a importância do papel dos pais na vida dos filhos; identificar os factores de protecção e factores de risco nos relacionamentos; recorrer a um conjunto de programas e serviços que fortaleçam as relações familiares, não só nos momentos de crise e ruptura, mas na perspectiva do reforço das competências relacionais actuando como factor protector seja qual for a relação familiar (casamento, união de facto, família pós divórcio, recasamento, preparação para a conjugalidade, parentalidade, relações intergeracionais, etc.).

Por isso, é urgente identificar os padrões de comportamentos violentos desenvolvidos no seio da família, conhecendo as causas que levam os agressores a passagem do acto violento e saber as consequências da vitimização, aspectos importantes desta problemática, já que é toda uma estrutura denominada família que está em causa, e se ela é a base de toda e qualquer sociedade, então há que saber valorizá-la. Daí, ser preciso reconhecer que há grupos sociais de maior risco, que são as mulheres, as crianças, e até mesmo jovens e que em relação a eles, é preciso ter capacidade de passar a identificação desses casos e traçar estratégias especiais.

É preciso afirmar que a família é um tema caro à sociedade: ela é determinante na sua existência, na sua reprodução, na sua estabilidade, no seu desenvolvimento. A família, espaço educativo por excelência, é vulgarmente considerada o núcleo central de individualização e socialização no qual se vive uma circularidade permanente de emoções e afectos positivos e negativos entre todos os seus elementos. Lugar em que várias pessoas (com relação de parentesco, afinidade, afectividade, coabitação) se encontram e convivem. Por isso, e para que possamos viver numa sociedade menos violenta, com famílias equilibradas, é preciso envolver tudo e todos, sem deixar ninguém de fora: envolver-se do ponto de vista conjugal, implica que tanto o homem como a mulher devem participar de forma activa nos trabalhos domésticos, e isto terá uma implicação positiva e mudança de mentalidades no envolvimento parental; vendo os pais a participarem nas lides domésticas, os filhos não terão mais em mente a ideia de que há trabalhos para homens e trabalhos para mulheres, mas sim, trabalhos que devem ser feitos por pessoas.

Lá onde o casal falhar, o envolvimento familiar como um todo (família extensa) deve intervir. Os pais devem participar na vida activa dos filhos na escola; ajudar os filhos a fazer os trabalhos escolares, participar das reuniões quando convocados, participarem dos assuntos escolares, saberem como é que o filho se comporta na escola, as suas notas, etc. e caso algo não estiver correndo bem, devem pedir ajuda de especialistas como, terapeutas, psicólogos, assistentes sociais, professores, e outros, já que o conflito familiar constitui uma forma de luta sui generis. As suas causas, o seu agrava­mento, a sua extensão aos outros, as característi­cas da luta e da reconciliação são completamente peculiares porque se realizam tendo por base uma unidade orgânica formada por mil laços internos e externos, não podendo por isso, comparar-se com nenhum outro conflito.

Concluindo: nenhum casal e nenhuma família estão imunes ao aparecimento de dificuldades/problemas, sendo esperado que os relacionamentos e laços sobrevivam e ultrapassem os conflitos e crises que surgem no seu curso de vida. Por isso, o envolvimento de todos é imprescindível para que possamos ter famílias equilibradas e sobretudo, com menos violência.

Doutor em Ciências Sociais – Especializado em Psicologia Social

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Kimze Brito

Jornalista com 30 anos de carreira profissional, fez a sua formação básica na Agência Cabopress (antecessora da Inforpress) e começou efectivamente a trabalhar em Jornalismo no quinzenário Notícias. Foi assessor de imprensa da ex-CTT e da Enapor, integrou a redação do semanário A Semana e concluiu o Curso Superior de Jornalismo na UniCV. Sócio fundador do Mindel Insite, desempenha o cargo de director deste jornal digital desde o seu lançamento. Membro da Associação dos Fotógrafos Cabo-verdianos, leciona cursos de iniciação à fotografia digital e foi professor na UniCV em Laboratório de Fotografia e Fotojornalismo.

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