Comissão Permanente reúne-se para autorizar deputado António Monteiro a depor como testemunha no julgamento de A. Oliveira
A Comissão Permanente da Assembleia Nacional estará reunida hoje para decidir sobre a audição do deputado António Monteiro como testemunha no julgamento de Amadeu Oliveira, a pedido do Tribunal da Relação de Barlavento. Este encontro deveria acontecer no dia 13, mas, segundo a juíza Circe Neves, foi adiado porque o parlamentar eleito pela UCID não reagiu em tempo. A decisão será agora proferida e o deputado notificado pelo TRB para ser interrogado na sessão do dia 26, segunda-feira, à tarde.
Isto porque, apesar do tempo consumido desde o início da audiência e julgamento de Amadeu Oliveira, que começou no dia 29 de agosto, a defesa faz questão de António Monteiro ir depor. Monteiro é visto como uma das testemunhas que melhor acompanhou o processo em torno de Amadeu Oliveira, que foi bastas vezes defendido no Parlamento e visitado na prisão pelo ex-líder dos democratas-cristãos.
Ontem foi a vez do Tribunal de julgamento inquirir o deputado Démis Lobo (PAICV) por videoconferência, a partir do Tribunal da Comarca do Sal. Lobo, que é advogado de profissão, revelou que não existe nenhuma incompatibilidade no exercício das duas funções. Deixou claro que as actividades de deputado e as de advogado são completamente distintas e que não há confusão possível entre elas. Pedido para ser mais específico, o eleito do PAICV salientou que as intervenções de um deputado são claras, resultando, por exemplo, das sessões parlamentares, visitas de círculo, trabalho nas comissões especializadas…
Durante a sua inquirição, o Tribunal fez questão de Démis Lobo se pronunciar sobre a declaração de um grupo de deputados do PAICV, na sequência da notícia da “fuga” de Arlindo Teixeira para França, acompanhado de Amadeu Oliveira, seu defensor oficioso. Lobo realçou que foi o porta-voz dos colegas nessa sessão parlamentar e que questionou o Governo e o ministro da Administração Interna sobre o acontecimento. “Perguntamos ao Governo, enquanto responsável máximo da Polícia Nacional, como foi possível Arlindo Teixeira ter saído se estava com obrigação de permanência em residência. Quisemos saber como a PN não se apercebeu da saída de Arlindo Teixeira da sua residência e que o Centro de Comando da PN e o serviço de fronteira não tivessem sabido e reagido”, lembra o deputado, enfatizando que a intervenção do grupo foi no sentido de responsabilizar o Governo por esse facto.
Segundo Démis Lobo, ao escutar essa intervenção, Amadeu Oliveira pediu a palavra, enquanto deputado da UCID, e defendeu uma tese diferente, tendo desafiado os deputados do PAICV a analisarem a questão mais a fundo. Oliveira, prosseguiu Lobo, afirmou que o sistema judicial era o principal responsável pelo sucedido e que a oposição não deveria apontar a sua bateria contra o Governo.
Nessa sessão parlamentar, Amadeu Oliveira, recorda Démis Lobo, elogiou a atitude da PN. Porém, para o deputado residente na ilha do Sal, isto não significa que Oliveira tenha feito isso para reconhecer alguma ajuda de agentes da PN para levar a cabo o seu plano. Uma interpretação desta natureza, fez questão de frisar, está fora do contexto.
Pedido de impugnação da defesa indeferido pelo tribunal
A sessão de ontem decorreu no período da tarde e, após a audição de Démis Lobo, a juiz-presidente Circe Neves anunciou que o Tribunal indeferiu um requerimento da defesa de Amadeu Oliveira que visou anular as declarações e opiniões emitidas por deputados e o próprio arguido nos debates parlamentares, na imprensa e redes sociais, e que foram reproduzidas no julgamento.
Os defensores argumentam que a validação das mesmas como meios de prova exige a autorização prévia da Assembleia Nacional para permitir a inquirição dos eleitos, tal como aconteceu hoje com Démis Lobo (PAICV) e vai suceder com António Monteiro (UCID). Além disso, a equipa de advogados invoca a Constituição da República para lembar que os deputados não podem ser civil, criminal e disciplinarmente responsabilizados pelas suas opiniões. Seguindo esta linha de pensamento, a defesa entende que seria ilegal o uso das declarações prestadas pelo próprio Amadeu Oliveira no âmbito de um processo-disciplinar que correu termos na Polícia Nacional. A juíza lembrou que o Ministério Público discordou da tese da defesa.
Para a juíza, a clareza com que a questão foi suscitada dispensa indagação profunda para se demonstrar que não assiste razão à defesa. “Com efeito, nenhum dos deputados cujas afirmações ou opiniões foram reproduzidas no julgamento como meios de prova está a responder neste julgamento pelos seus votos ou opiniões. Outrossim, aqueles que tiverem de intervir como testemunhas nesta audiência só serão admitidos a fazê-lo após se obter a autorização da AN para o efeito”, clarificou a juiz-presidente do colectivo de três magistrados do TRB que estão a dirigir o julgamento.
Quanto a Amadeu Oliveira, conforme Circe Neves, é de se ter em conta que o mesmo, embora sendo deputado, se predispôs a prestar depoimento como testemunha no tal processo-disciplinar da PN. Oliveira, prossegue a juíza, dispensou de livre vontade a prévia autorização da Assembleia Nacional para o efeito. Pelo que, segundo Neves, não seria razoável e nem legal impedir que tais declarações fossem usadas como meio de prova.
Insatisfeita com a decisão do tribunal, a defesa interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, reproduzindo, basicamente, os argumentos antes apresentados no requerimento apresentado na sessão do dia 16. Já o Ministério Público defendeu que o recurso deve ser rejeitado por ser extemporâneo e intempestivo. Porém, a juíza decidiu aceitar o recurso.
O julgamento de Amadeu Oliveira caminha para o fim, após quatro semanas de sessões. Falta inquirir o deputado António Monteiro e a apresentação das alegações finais da defesa e da acusação para depois o tribunal indicar a data da sentença. Amadeu Oliveira, recorde-se, responde pelo alegado cometimento dos crimes de atentado ao Estado de Direito – por ter proporcionado a suposta fuga do seu constituinte Arlindo Teixeira -, perturbação do funcionamento do Supremo Tribunal de Justiça e ofensa à honra de juízes do STJ. Encontra-se em prisão preventiva desde julho do ano passado.