O cineasta estreante Elson Santos teve o seu projecto “Nós, Povo das Ilhas” seleccionado para participar no festival e mercado internacional de cinema documental MiradasDoc, que foca nos acontecimento dos tempos actuais, na vertente Afrolatam, dedicado a iniciativas originarias da África e da América Latina. O documentário propõe resgatar um capitulo da história do país e baseia-se em entrevistas com figuras influentes da política em Cabo Verde e na Guiné Bissau ainda vivos.
Ao Mindelinsite, Elson Santos explica que o propósito deste documentário é contar um pouco da história da luta de libertação nacional, ainda pouco conhecida, em especial para as camadas mais jovens. Vai fixar o foco sobretudo no grupo de 31 jovens-estudantes enviados para Cuba para receber formação militar e preparar um desembarque em Cabo Verde, em plena luta armada para a independência. “Fomos seleccionados para participar do MirandasDoc com outros seis projectos provenientes do Quénia, Brasil, Colombia, França e Canárias”, informa.
O director deste mercado, David Baute, revela na pagina oficial deste certame que, com o Afrolatam, se criou uma aliança entre os festivais, distribuidores e televisões com o objectivo de impulsionar o desenvolvimento de documentários entre as regiões, fomentar colaborações entre os seus profissionais e potenciar a abertura de novos mercados. E é isso que o documentário de Elson Santos conseguiu.
“O nosso projecto recebeu criticas muito positivas para além de ser premiado com um contrato com a RTP. Também foi elogiado pela Deutche Welle, que assumiu o compromisso de exibir o conteúdo quando o filme estiver pronto. Além disso, a Sideways, uma importante agência de venda de conteúdos internacionais que trabalha com a BBC e plataformas como Netflix e Amazon, também demonstrou interesse em distribuir o nosso documentário”, pontua.
De acordo com a sinopse do documentário, durante a luta de libertação nacional o Partido Africano para Independência da Guiné e Cabo Verde enfrentava dificuldades na mobilização dos cabo-verdianos, tanto no trabalho como no exterior, para participar na luta armada. “O desafio era colossal. A soberania de Cabo Verde era vista na linha de uma missão impossível”, lê-se no documento, que realça ainda que, em Julho de 1963, em Dacar, após uma reunião de quadros do partido com Amilcar Cabral, levantou-se então a possibilidade de uma luta armada em Cabo Verde.
A ideia, prossegue, era iniciar um processo de mobilização nas comunidades emigradas com o propósito de se preparar uma operação de desembarque em Cabo Verde. O então jovem nacionalista, Pedro Pires, que se encontrava em Dakar, onde existia uma grande comunidade cabo-verdiana, foi incumbido de liderar esse processo. “Este contingente acabou por ter um papel preponderante em várias frentes de combate na luta armada, na Guiné. Pode-se considerar este capítulo da história como o ponto de viragem da participação dos cabo-verdianos na luta armada”, contextualiza o resumo deste filme.
Perspectiva cabo-verdiana da luta
É esta história que Santos pretende contar no filme, mostrando a perspectiva cabo-verdiana da luta pela independência destes dois países. “A estrutura narrativa deste filme almeja, entender o processo da luta armada em Cabo Verde, particularmente a preparação do desembarque de militantes do partido no país. O período de mobilização, a formação e a pós-formação, correspondendo a uma presença forte de quadros cabo-verdianos na frente de combate, na Guiné Bissau”, indica.
Num primeiro momento, prossegue, o foco está em perceber as motivações que levaram estes jovens com idade compreendida entre os 19 e 20 anos e não só, a enveredar pela luta armada. Aqui importa auferir as dificuldades por que passaram e como foi feito o processo de mobilização dos cabo-verdianos no país e no exterior. E ainda, porquê Cabo Verde era considerado uma missão impossível.
Para Elson Santos, num segundo momento, a ideia é compreender o processo de formação e o porquê Cuba foi considerado um aliado estratégico por Cabo Verde. Entender as questões relacionadas com o processo de embarque até chegar ao local de formação, o confinamento durante dois anos, o relacionamento com os cubanos, o juramento da bandeira na presença de Cabral, assim como a saída de Cuba.
O terceiro momento, explica o idealizador deste projecto, será dedicado a conclusão do filme. Aqui, o objectivo é perceber as razões que impediram o desembarque. Paralelamente, vai mostrar a importância que esses quadros tiveram na luta armada de libertação. Nesta fase pretende salientar como a formação militar recebida pelo grupo, sobretudo no domínio da artilharia, revolucionou pela positiva alguns aspectos da luta, tendo contribuído para a derrota militar do regime colonialista português.
Todo este trabalho vai se sustentar em entrevistas, fotografias de arquivos e alguns excertos de filmes reais captados nos locais do acontecimento, no caso em Cuba e Guiné Bissau, sendo que o fio condutor será os depoimentos dos personagens.
Constânça de Pina