“Metamorfose” volta ao palco do CCM no Março Mês de Teatro
A peça Metamorfose, a 57ª produção cénica do Grupo de Teatro do Centro Cultural Português do Mindelo (GTCCP), volta ao palco do Centro Cultural do Mindelo nos dias 09 e 10 de Março. Trata-se de uma adaptação em crioulo feita por Caplan Neves de uma novela do escritor Alemão Franz Kafka, que estreiou no Festival Mindelact 2018 mas que terá passado um pouco despercebida do público mindelense. O director do festival, João Branco, justifica a reposição desta peça por ser um projecto “muito querido”.
“Este é um projecto que nos é muito querido. Há mais de 20 anos que estava ´na gaveta` e só foi apresentado uma única vez. Acreditamos que há muita gente que gostaria de ter visto e não viu”, informa João Branco, para quem esta é uma produção que orgulha o teatro cabo-verdiano e que acontece na “ressaca” do Carnaval de São Vicente, a maior festa popular desta ilha.
O presidente desta associação cultural, que também assume a encenação e direcção artística da peça, acredita que isto terá acontecido, possivelmente pela dimensão do Festival Internacional de Teatro Mindelact. Mas, a importância do texto original e o “atrevimento” na sua adaptação crioula, justificam a aposta na reapresentação desta peça, argumenta.
A interpretação está a cargo de um elenco que dispensa apresentação: Emerson Henriques, Fonseca Soares, Ducha Faria, Patrícia Estevão, Fidélia Fonseca e Edson Fortes, sendo que este último responde igualmente pela iluminação do palco. Respondem pelos adereços Sofia Silva, pela fotografia Bob Lima e Pedro Lamares e pela sonoplastia David Medina.
Relativamente ao espectáculo, trata-se de um trabalho baseado num dos textos fundamentais do século XX, com uma interpretação emocional, mas também físico e vocal. A nível da encenação, lê-se no texto sobre a peça, cria um ambiente sonoro e visual ao mesmo tempo fantástico e assustador.
“Criando uma situação surreal – um homem acorda no corpo de um gigantesco insecto – este espectáculo mais não é do que uma metáfora dos tempos modernos, que realça a beleza e a profundidade do texto original, a riqueza telúrica e sonora da língua cabo-verdiana, o talento inato dos agentes teatrais nacionais e a criatividade plástica que tem sido imagem de marca desta geração do teatro crioulo, em geral, e do trabalho do grupo de teatro do CCP”, refere ainda o flyer do Março Mês de Teatro.
Quantos seres humanos existem hoje, em corpos estranhos, querendo sobreviver? Querendo ser? Querendo existir sem constrangimento, nem preconceito, nem violência? A inusitada situação, no livro e no espetáculo, resolve-se apenas com a a morte da aberração, que veio abalar toda a estrutura familiar. Como tantas vezes acontece, o lixo é jogado para debaixo do tapete, os cadáveres putrefactos são enterrados e os “normais” seguem, qual robot’s, cumprindo o seu triste destino no mundo dos vivos, persiste.
Já para Neves, responsável pela adaptação, metamorfose é um dos textos mais importantes da história da literatura. “Sem a menor cerimónia, este texto coloca o leitor diante de um caixeiro-viajante – o famoso Gregor Samsa – transformado em insecto monstruoso. A partir daí, a história é narrada com um realismo inesperado que associa o inverosímil e o senso de humor ao que é trágico, grotesco e cruel na condição humana – tudo no estilo transparente e perfeito deste mestre inconfundível da ficção universal”.
Trata-se, pois, do último trabalho do GTCCP, o grupo mais produtivo e internacional do teatro nacional, a sua 57ª, nos seus 25 anos de existência.
Constânça de Pina