Aristides “Tite” Gaspar foi absolvido esta manhã dos quatro crimes que levaram ao seu julgamento pelo Tribunal da Comarca de São Vicente – roubo qualificado, tentativa de homicídio, posse e disparo de arma de fogo -, na sequência de um assalto com contornos cinematográficos ocorrido na Caixa Económica de Fonte Cónego a 27 de maio de 2020. Carlos Delgado, tido como coautor, foi igualmente inocentado. O veredito da juíza Adalgiza dos Santos foi recebido com lágrimas por familiares e amigos, que suspiraram de alívio.
A tranquilidade do arguido Tite Gaspar ao entrar na sala de audiências do 1º Juízo-Crime de São Vicente, esbanjando charme, já deixava antever o resultado da sentença. E, de facto, este saiu do tribunal para casa livre de qualquer crime. Ficou ainda isento das custas porque “não são devidas” e vai receber de volta todos os bens e produtos aprendidos. É que, conforme a magistrada Adalgiza dos Santos, foi impossível provar que os delitos de roubo qualificado, tentativa de homicídio, posse e disparo de arma de fogo foram cometidos pelo arguido, ajudado por Carlos Delgado.
A juíza admitiu, no entanto, que havia muitas coincidências no processo, que levaram à detenção de Tite Gaspar e consequente julgamento. Antes, porém, a magistrada fez um historial do crime, que mostrou que o arguido esteve, dias antes, por diversas vezes na agência da CECV de Fonte Cónego, fez anotações, tendo saído numa dessas ocasiões com “muita pressa” do banco, conforme atestaram as imagens das câmaras de segurança. Também no dia do roubo terá feito várias chamadas telefónicas para o co-arguido Carlos Delgado, confirmadas pela antena de comunicação de Ribeira Bote.
No dia 27 de maio, prosseguiu a magistrada, um individuo com características similares ao arguido, vestido de laranja e com um capacete terá entrado na agência, passando à frente dos clientes que aguardavam na rua por causa das medidas de contenção para mitigação da Covid-19, sacou de uma arma, efectuou um disparo e sacou a quantia de um milhão e 74 mil escudos, mais 50 libras. Antes de sair, e ao perceber a tentativa do segurança de trancar a porta, efectuou um segundo disparo e saiu da Caixa Económica. Montou numa moto e desapareceu.
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Entretanto, as autoridades foram accionadas e várias pessoas aglomeraram-se nas proximidades do banco, incluindo Tite Gaspar, que terá declarado em alto e bom som “negoce nes terra ta complicod”. Mais tarde, após ser considerado suspeito, a Polícia Judiciária terá apreendido na sua residência alguns produtos que se suspeita serem provenientes de roubo e a quantia de 15 mil escudos em notas novas e um telemóvel.
“O arguido Carlos confirmou que falou com Tite por diversas vezes, mas nega que este em algum momento tenha lhe feito uma proposta de roubo. Também Tite negou qualquer envolvimento no roubo. Confirmou, no entanto, que esteve no banco. Quanto à arma encontrada na sua residência, disse ser um brinquedo pertencente ao filho. Ninguém viu o assaltante. Todos o descrevem como um individuo alto, forte, com capacete e óculos escuros e com um andar peculiar”, descreveu a juíza, realçando ter encontrado discrepância nas descrições do arguido feitas pelas testemunhas.
O resultado do teste para presença de pólvora na mão do arguido foi negativo, acrescenta a juíza, clarificando ainda que, quanto aos telefonemas feitos entre Tite e Carlos, ambos explicaram que foram para notificar a perda do aparelho pertencente ao arguido e depois para este informar que já o tinha encontrado. Sobre este particular, tendo em conta o número de chamadas feitas, a juíza mostrou existir alguma incongruência. “Não se conseguiu neste processo fazer prova dos indícios apresentados e que podem ser aceites no Direito Penal“, alegou.
Por tudo isso, a magistrada Adalgiza dos Santos decidiu absolver Tite Gaspar dos crimes de roubo qualificado, tentativa de homicídio, posse e disparo de arma de fogo. O mesmo veredito para Carlos Delgado, acusado de co-autoria.
Entretanto, a Seguradora Impar sai deste processo penalizada, tendo em conta que solicitava uma indeminização civil mas, como não se identificou o autor do roubo, o processo foi considerado improcedente.
O advogado da Defesa, João do Rosário, ficou satisfeito com o veredito, mas não pretende pedir indemnização pelos onze meses em que o seu constituinte esteve detido. Isso porque, afirma, ao apontar fortes indícios para a sua prisão e julgamento, a juíza não deixou espaço para um processo neste sentido.