Morreu esta sexta-feira, no Hospital Baptista de Sousa em São Vicente, Alcides Andrade Silva, Tchinda (1979-2024), vítima de doença. A vendedora de coxinhas, que se transformou em “heroína transgênero”, como lhe chamou a CNN, foi uma das personagens mais conhecidas do Mindelo e o centro das atenções do documentário Tchindas, que percorreu o mundo e ganhou vários prémios.
Segundo Rafael Andrade, o irmão estava internado no HBS há cerca de um mês, depois de ter sido encaminhado pela Clínica Urgimed para fazer uma avaliação. Recebeu alta e retornou à casa da família. Deste então foi levado por três vezes ao Banco de Urgência do HBS, mas nunca esperaram receber a notícia da sua morte. “Foi totalmente inesperado. Ontem recebi uma mensagem do hospital a dizer que o meu irmão precisava fazer um TAC. De imediato, a família começou a organizar para conseguir fazer este exame. Hoje logo cedo fui para o hospital e fui confrontado com a noticia da sua morte”, lamenta.
Tchinda foi o primeiro travesti de São Vicente e de Cabo Verde a se assumir, em 1997, então com 18 anos, em uma entrevista para o jornal A Semana, que esgotou pelo ineditismo da notícia. Antes tinha sido destaque numa reportagem do mesmo semanário sobre o Carnaval do Mindelo com o título “Tchindaval”, quando ele e outros travestis fizeram um desfile memorável. Mas, mais importante, foi que começou a abrir a mentalidade em relação ao homossexualismo. A prova disso é que, cinco anos depois, em 2013, São Vicente realizava a sua primeira marcha gay, com Tchinda a liderar empunhando orgulhosamente uma bandeira gay.
Gravou o documentário “Tchinda”, que estreou em 2016 no festival Queer em Lisboa. Foi o jornalista Marc Serena, realizador e um dos convidados do festival que “descobriu” Tchinda em S. Vicente, enquanto entrevistava pessoas para o livro Isto Não É África, “com gente gay, lésbica e trans de países africanos em diferentes situações”. Por recomendação de Cesária Évora, este regressou a S.Vicente em 2013, acompanhado do realizador Pablo Garcia, para filmar os preparativos do Carnaval.
“Percebemos logo que Tchinda era uma líder e uma pessoa muito querida. Obviamente que Cabo Verde não é um paraíso – chegou a ser agredida na cidade da Praia por causa da sua identidade sexual e ficou com cicatrizes visíveis na cara -, mas é um exemplo de aceitação para muitas pessoas do mundo, principalmente de África”, declarou Pablo Garcia ao Time Out.
O documentário foi gravado em um mês com parcos recursos e “Tchinda” foi posteriormente apresentado no Outfest de Los Angeles, onde recebeu o prémio do júri e chamou a atenção da imprensa. A PBS, televisão pública norte-americana, adquiriu os direitos de emissão do documentario, que soma mais de uma dezena de prêmios em festivais cinema internacionais.
Hoje, infelizmente, apagou-se a luz desta “estrela” adorada no Mindelo. A família e amigos, o Mindelinsite apresenta às mais sentidas condolências. A data do funeral será oportunamente divulgada pela família, que aguarda ainda o regresso de familiares do exterior.