O gabinete do jurista Armindo Gomes intentou uma queixa no Tribunal da Comarca de S. Vicente contra o director da Cadeia de Ribeirinha pelo suposto cometimento do crime de obstrução à assistência de preso, acto que, argumenta, viola a lei e configura um impedimento ao exercício da advocacia. O causídico explica que já foi proibido por 12 vezes de contatar dois arguidos da “Operação Epicentro” pela direção da penitenciária, num claro desrespeito pela Constituição da República e ao Processo Penal. E ficou ciente, conforme Gomes, que a intervenção do referido director foi suscitado por uma directiva da Procuradoria da República, que deu instruções à penitenciária para impedir que reclusos preventivos do processo Epicentro tivessem contacto com os defensores.
“Fui abordado no dia 1 de setembro por uma senhora que me informou do interesse de dois reclusos, seus amigos, de serem defendidos pelo meu escritório. No dia seguinte dirigi-me ao estabelecimento prisional para conversar com os reclusos. Estranhamente fui informado pelo Chefe de Segurança que isso não podia acontecer porque não tinha procuração”, revela Gomes, que tentou mostrar o paradoxo dessa situação ao funcionário da prisão. Como enfatiza, para ter uma procuração assinada e celebrar um contrato de prestação de serviço com os arguidos tinha de falar primeiro com os mesmos.
Prossegue que, perante a intransigência do segurança, solicitou encontro com o director da cadeia central, que teve a mesma posição. Durante a conversa, o director, conforme Armindo Gomes, alegou que estava agindo com base em ordens da Procuradoria da República em relação aos dois presos preventivos.
Já na abordagem seguinte, e na posse das procurações, Gomes foi de novo impedido de falar com os arguidos. Desta vez, conforme a sua versão, o director alegou que os documentos teriam que ser validados pela Procuradoria da República. “Isto nunca foi visto em C. Verde, nem no tempo colonial, nem na 1. República e nem no tempo do IPAJ, mormente pode acontecer actualmente num Estado que se diz de Direito”, contestou o causídico, que abordou essa questão com a Coordenadora da Procuradoria em S. Vicente, pessoa que, conforme Gomes, não estava ao corrente da suposta ordem.
Apesar de ter apresentado uma queixa-crime contra o diretor da Cadeia de Ribeirinha, o jurista acha que o cerne da questão é a postura “ilegal” da Procuradoria-Geral da República que, segundo as suas palavras, decidiu atropelar a própria Constituição da República e impedir o direito do recluso ao contacto com o defensor. Para ele, o caso ganha ainda outra gravidade porque parece ser um acto discriminatório direcionado.
Lembra, aliás, que a Ordem dos Advogados emitiu um comunicado aludindo a essa situação e que, em resposta, a Procuradoria-Geral da República negou que tenha dado instrução para impedir os advogados de entrarem em contacto com os reclusos. Na nota, a PGR adianta ter apenas elencado o nome dos advogados constituídos e nomeados aos suspeitos presos preventivamente (no caso Epicentro). No entanto, para Gomes, a PGR agiu de forma negligente ao revelar que há um advogado constituído arguido no processo, o que, para ele, constitui uma tentativa de se denegrir a imagem da classe. Além disso, entende que a PGR não pode enviar uma lista de advogados, se os arguidos podem mudar de defensor, aumentar a equipa de defesa e ainda podem precisar falar de outros assuntos que nada tenham a ver com o caso que levou à prisão preventiva.
Outro ponto contestado por Gomes tem a ver com o facto de a PGR salientar no comunicado que a Lei de Execução de Sentenças Penais permite as autoridades judiciárias emitirem orientações sobre a comunicabilidade dos presos preventivos com o exterior e com outras pessoas. Na sua reação, o jurista deixou claro que, no caso em apreço, não há ainda nenhuma sentença aplicada e que um advogado não é qualquer pessoa, mas sim o representante do arguido no processo. Sublinhou, na sequência, que os arguidos são ainda presumíveis inocentes enquanto não houver uma sentença transitada em julgado.