AJOC considera “selectivo e desproporcionado” processo-crime do MP contra os jornalistas Daniel Almeida e Hermínio Silves

A AJOC considera seletiva e desproporcionada a ação aberta pelo Ministério Público contra os jornalistas Daniel Almeida e Hermínio Silves por suposta prática do crime de desobediência qualificada devido a divulgação de reportagens sobre o caso Zezito denti d’oro, morto em outubro de 2014 na cidade da Praia durante uma operação policial. Inconformada com a postura da Procuradoria-Geral da República, a associação sindical assegura que irá comunicar o caso às instituições internacionais com as quais mantém relações para que se saiba que o jornalismo em Cabo Verde vive em “estado de calamidade”.
Em nota, a AJOC afirma que recebeu com preocupação “mais uma investida” do Ministério Público contra a liberdade de imprensa com a formalização da acusação aos referidos jornalistas e os respectivos jornais Santiago Magazine e A Nação. Além disso, frisa-se, o MP identificou outros arguidos, tendo o Procurador Nilton Moniz acusado André Semedo e João Emílio Tavares, ambos inspectores da Polícia Judiciária, e o próprio Procurador Ary Varela do crime de violação do segredo de justiça, por terem alegadamente revelado informações sobre a matéria aos jornalistas.
Segundo o presidente da AJOC, este episódio faz recordar tempos recentes em que jornalistas eram sistematicamente colocados no banco dos réus por cumprirem o seu dever de informar. “Estamos a andar para trás”, critica o comunicado assinado por Geremias Furtado. Este reafirma que os cabo-verdianos têm o direito de ser esclarecidos, sobretudo quando estão em causa casos de elevado interesse público, como o possível envolvimento de um membro do Governo num acto de homicídio. “Neste caso, o único ‘crime’ cometido pelos nossos colegas foi informar com verdade e rigor”, afirma.
Toda esta situação, conforme a organização da classe jornalística, resulta de uma “grave incoerência” entre dois artigos do Código de Processo Penal cabo-verdiano. A AJOC adianta que tem, de forma reiterada, defendido a revogação de um deles e apresentado propostas concretas para uma revisão legislativa, num diálogo que, diz, continua a ser ignorado pelo legislador. Apesar disso, prossegue, os mesmos responsáveis políticos que se mantêm em silêncio perante tal situação são os que depois aparecem a vangloriar-se pelas posições de Cabo Verde nos rankings internacionais de liberdade de imprensa e democracia.
A AJOC apela à serenidade, mas também à união e firmeza de todos os jornalistas. Este é o momento, conforme a instituição, de os profissionais do sector mostrarem que estão unidos e fortes em torno do jornalismo livre, independente e responsável. Assegura que fará chegar as informações a todas as instituições internacionais com as quais mantem relações para que se saiba que o jornalismo em Cabo Verde vive em “estado de calamidade”. A organização conclui o seu comunicado apelando a que o exemplo de coragem e determinação de Hermínio Silves e Daniel Almeida inspire toda a classe.
Como noticiou o online Santiago Magazine, o Ministério Público deduziu acusação contra os jornalistas Hermínio Silves e Daniel Almeida e os jornais Santiago Magazine e A Nação por desobediência qualificada devido a publicação de reportagens sobre a investigação à morte de Zezito Denti d’Oru em 2014 e nas quais o nome do agora ministro Paulo Rocha aparece mencionado. Além dos jornalistas, diz a notícia, o Procurador Nilton Moniz acusa André Semedo e João Emílio Tavares, ambos inspectores da PJ, e o próprio Procurador Ary Varela de serem os responsáveis pela alegada violação do segredo de justiça.
A Procuradoria, segundo a mesma peça, pede julgamento perante tribunal singular e não promove nenhuma medida de coação contra os arguidos. No entanto, manda notificar Paulo Rocha e os agentes da PJ que estavam a ser investigados para, se quiserem, também agirem civilmente contra os ora arguidos no prazo de sete dias, exigindo indemnização.