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Reapropriar-se da gerência da nossa vida

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É sempre importante que uma pessoa reflita sobre si,  sobre a sua vida e as pessoas que ele ama. A reflexão nos ajuda a perceber melhor quem somos, do que precisamos e como melhorar a vida. Devemos todos saber, quem somos e para onde vamos, para podermos aproveitar o que é favorável e enfrentar o que é desfavorável. E também é bom que cada um de nós pense ter as ideias claras e estar no caminho certo.

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Por: frei Silvino Benetti

Cada um de nós precisa de segurança afetiva e económica mas sobretudo de segurança interior indispensável para caminhar na vida.  Mas se prestamos atenção muitas vezes o que nós pensamos é fruto do ambiente onde vivemos e muitas vezes nós vivemos a partir da percepção que temos da realidade que nos rodeia. Por exemplo um jovem pode escolher o seu curso ou a sua formação não a partir do que gosta, do que sente conforme a ele, mas a partir da oferta do mercado do trabalho ao seu alcance.

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Uma outra pessoa, ao saber da violência doméstica que afeta os casais que conhece, pode excluir  o casamento do seu plano de vida. Estas são escolhas que determinam a vida duma pessoa, mas não são da pessoa mas escolhas induzidas pelo ambiente onde ele se encontra.  A adaptação ao ambiente onde nos encontramos continua sendo um valor humano, mas isso não impede uma reflexão critica.

Hoje poderíamos falar de economia doméstica e de como diminuir os custos que uma família suporta no dia a dia.  Mas, para isso, por quanto possa aparecer estranho, quereria chamar a atenção sobre uma mudança cultural muito forte que surgiu a partir da metade do 1700, na Inglaterra, continua hoje e que é chamada revolução industrial. A partir dessa altura houve a mudança do ambiente de trabalho que, do campo passou à cidade, onde desenvolvia a indústria. Essa mudança interessou milhões de jovens que abandonaram o primitivo trabalho dos campos e foram  trabalhar nas fábricas que estavam a surgir e que pediam mão de obra. Essa passagem em massa, do trabalho agrícola nos campos ao trabalho  da fabrica  nas cidades, criou uma nova forma de pensar e viver, e criou o berço cultural das gerações vindouras ás quais ainda nós pertencemos. 

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Nesses últimos 250 anos fala-se de 4 fases dessa chamada revolução industrial mas fica a característica do trabalho na cidade e da evolução do mercado, existente da sempre mas que a partir daí amplia a sua presença e as suas funções. As cidades  aumentaram em número de habitantes e organização e o mercado evolui-o beneficiado do fato que quem vive na cidade e trabalha na fabrica já não produz o alimento do dia a dia mas tem de ir a compra dele. Dentro breve quem comercializava e transportava os produtos tornou-se mais importante de quem os produzia.  

Ainda mais nos dias de hoje o mercado condiciona a vida quotidiana, o nosso trabalho, as relações entre as pessoas e o nosso futuro. Ao levantar da cama vou para a loja a comprar o necessário para o café, se quero montar uma empresa tenho de  medir qual a força de competição do meu produto, se estou convidado à uma volta pelos colegas tenho de informar-me antecipadamente se suporto o custo desse momento de convivência, se não se encontra uma alternativa, aceite pelo mercado, o petróleo continuará a poluir o nosso planeta, até a extinção da raça humana. 

Hoje, nos países “desenvolvidos”, nos dias de festa se divertem  fazendo shopping, quer dizer comprando ! Se comprar não é motivado pela necessidade, mas pelo divertimento, não é exagero dizer que somos dependentes do mercado que equivale a dizer drogados pelo mercado!  

Essa evolução desviante do mercado foi possível causa a associação da industria com a cidade que desligaram a pessoa da natureza e da comunidade. No campo as pessoas produziam juntos o alimento necessário à vida; na industria o individuo recebe na palma da sua mão o dinheiro necessário à  vida.

A vida no campo exige a comunidade, à vida da industria é suficiente o individuo. E, ao mercado, o individuo, desligado da comunidade e da natureza, é um alvo mais fácil de atingir com ofertas de venda bem confeccionadas e apresentadas como necessárias á pessoas mas antes estudadas para serem úteis aos interesses próprios do  mercado. A publicidade que nasceu para difundir o conhecimento dum produto, é hoje, aquela que cria a necessidade de um produto, que ainda não se conhece e do qual ninguém precisa. O individuo é portanto visto como um consumidor dos produtos que o mercado cria para a sua própria subsistência. O mercado, que tornou-se sistema auto-sustentável, não vitima só os que chamamos de consumidores, seja pobres como ricos, mas mesmo  os próprios agentes de mercado, porque afinal todos são consumidos pelo valor monetário mais alto, que se impõe no momento, no âmbito do sistema/mercado.   

 Quando a pessoa se reduz a viver e pensar como individuo, seja quando jovem como adulto,  torna-se mais facilmente vitima de ambições e comodismos, perde a orientação da vida e reduz-se a preocupar-se só  com o seu sustento material, encontrando e acostumando-se, com o tempo, ao vazio interior, à
frustração e à depressão. E o mercado  estará sempre pronto a apresentar os seus serviços a este individuo, seja quando são, como quando doente,  seja quando frustrado como quando morto!

 Ao fazer essa analise gostaria  dizer que o individualismo, característica indiscutível dos dias de hoje, não é escolha da pessoa,  mas é uma escolha induzida por o sistema / mercado,  que transforma a pessoa em consumidor. Esse consumidor para recuperar o seu ser pessoa tem de voltar a ser comunidade. Sendo comunidade pode enfrentar o mercado dum patamar mais conveniente para ele. Por exemplo para servir 40 pessoas de arroz o sistema / mercado prepara 40 confecções bonitinhas de ½ kg de arroz, criando uma subida no custo do arroz, em quanto para ele, mercado, se cria um ganho
maior. Mas se esse 40 pessoas formam um grupo podem comprar um saco de 20 Kg de arroz e depois dividi-lo entre eles obtendo uma diminuição do custo. Portanto a comunidade facilita a vida ao individuo e o ganho económico é somente um orientação que ajuda o individuo a encontra o caminho da sua
realização.

Se queremos reduzir os custos do dia a dia o primeiro passo é portanto recriar, aqui na cidade onde estamos, uma vida comunitária, único âmbito de realização do individuo e verdadeira alternativa ao sistema de mercado. E o passo seguinte é não comprar no mercado o que se pode fabricar em casa ou
em comunidade, dando um pontapé à falsa oferta de comodismo que o mercado apresenta ! 

Com essa forma de pensar podemos encaminhar uma outra revolução cultural, não motivada por descobertas tecnológicas ou por ganhos mais fáceis, como foi ao longo desses últimos 250 anos, mas para reapropriar-nos da nosso ser humano e da gerência da nossa maravilhosa vida ! 
 
23 Janeiro 2024   

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Constanca Pina

Formada em jornalismo pela Universidade Federal Fluminense (UFF-RJ). Trabalhou como jornalista no semanário A Semana de 1997 a 2016. Sócia-fundadora do Mindel Insite, desempenha as funções de Chefe de Redação e jornalista/repórter. Paralelamente, leccionou na Universidade Lusófona de Cabo Verde de 2013 a 2020, disciplinas de Jornalismo Económico, Jornalismo Investigativo e Redação Jornalística. Atualmente lecciona a disciplina de Jornalismo Comparado na Universidade de Cabo Verde (Uni-CV).

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