David Leite
Muita gente em S. Vicente se interroga, desde anteontem, se é verdade que um presumível ladrão e assaltante foi posto em liberdade depois de ter sido detido por apenas um dia para acalmar a pressão das redes sociais. Terá a Polícia agido no cumprimento do seu dever de proteger a sociedade ou fê-lo em causa própria, para salvar a face da corporação? De duas, uma: ou foi uma mera encenação, ou o Ministério Público cerceou a acção policial impedindo-a de ir mais longe.
Importa lembrar que o indivíduo em questão foi identificado em repetidas denúncias e depoimentos, nomeadamente nas redes sociais, como autor de diferentes roubos e assaltos, quase sempre em companhia de outros meliantes. Mesmo com prova material de pelo menos um dos seus crimes, com testemunhas que lhe compraram objectos roubados, mesmo sabendo o nome e a morada desse ladrão notório, a polícia não fez caso, alegando não poder agir sem mandado do Ministério Público!
Se a Polícia tivesse agido, jamais teria um grupo de cidadãos pensado em ir interpelar um criminoso na sua casa, um gesto “en désespoir de cause” porque a inércia se combate com iniciativa. Em boa hora se lembrou a Polícia de ir prender esse delinquente, mas o alívio foi de pouca dura pois já no dia seguinte estava ele de novo na rua!
A Polícia comunicou a detenção, mas nem uma palavra sobre a ordem de soltura! Ninguém sabe que diligências foram movidas enquanto esse indivíduo esteve sob custódia. Se ao menos foi notificado algum queixoso, se foram ouvidas testemunhas que o idenficassem, nomeadamente pessoas a quem vendeu os objectos roubados.
O que sabemos é que esse indivíduo já está na rua outra vez! Ninguém consegue entender que não lhe tenha sido aplicada, como medida de coação, prisão preventiva para averiguações. Peca por tardio um inquérito preliminar com audição de testemunhas, a fim de colectar provas materiais e averiguar o paradeiro dos bens que o acusado roubou com a sua quadrilha. Se foram os mesmos bandidos que desde há anos andam a trepar num prédio na zona de Matiota, onde chegaram a ameaçar uma criança com arma branca num apartamento que espoliaram; se foram eles que envenenaram um cão que guardava uma casa onde, tempos depois, foram roubar!
Porém, não estando o acusado detido para averiguações, permanece livre para ameaçar ou aliciar testemunhas ou destruir provas que o confundam! Vale ainda lembrar que, entre as medidas cautelares previstas na lei, impera a necessidade de “evitar que o acusado cometa novos crimes”. Ora, é expectável que um ladrão reicindente, estando livre e solto, vai roubar outra vez!
Por isso, ninguém consegue entender porque razão foi restituido à liberdade um acusado que, havendo provas materiais e testemunhas dos seus crimes, passa de simples “suspeito” a presumível culpado. Essa ordem de soltura incorre em gravíssimas consequências, quais sejam:
i) desautorizar a Polícia que finalmente acabou por fazer o seu trabalho, resgatando a confiança dos sanvicentinos;
ii) colocar em perigo os bens e a integridade física dos cidadãos, sabendo que esse indivíduo e seus comparsas, revigorados pela impunidade, provavelmente vão continuar a assaltar pessoas e a “visitar” casas alheias pela calada da noite, com risco de agressão física às suas vítimas;
iii) dar azo a esse delinquente e sua corja para gozarem com a cara das suas vítimas quando cruzarem com elas, expondo-as à humilhação do escárnio (“depois de queda, coice”);
iv) permitir a esse suspeito destruir provas, intimidar ou aliciar testemunhas;
v) privar os lesados do legítimo direito de recuperarem os seus bens, o que não parece possível sem inquérito.
Além disso, a soltura desse delinquente coloca em perigo a sua própria integridade física, expondo-o a possíveis retaliações por causa do ódio que semeou nas suas vítimas, não pelos prejuizos que sofreram mas por denegação de justiça.