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Dona “P” e o Senhor “G”

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Por: Nelson Faria

As características mais evidentes da Dona “P” eram os seus quatro “P’s”: Pacata, Passiva, Pacífica e Permissiva. Pacata por se manter reservada na acomodação e calmaria; passiva pela submissão e subjugação que consentia; pacífica por evitar qualquer conflito ou confronto com o que ela achava ser superior ou melhor para o marido; permissiva por ser excessivamente tolerante, sem restrições, para até o que lhe fazia mal.

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O Senhor “G”, seu marido, por sua vez, tinha características diferentes, era o 4G em pessoa: gordo, guloso, ganancioso e gabarola. Excessivamente pesado na parte de cima para aquelas pernas que já tremiam; guloso porque comia tudo e queria absolutamente tudo apenas para si ou para os amigos próximos; ganancioso por querer obter vantagens sem considerar questões éticas e legais e ainda gabarola, um fanfarrão autêntico, de realizações nulas.

Ora bem, é facto que a relação apenas existia porque a Dona “P”, devido aos seus condicionamentos, escolheu o senhor “G” como seu marido, contudo, a Dona “P” não podia isentar-se de responsabilidades nos males de que se queixava. De vez em quando manifestava em casa, ia ao Facebook com posts, mas depois voltava à sua condição de submissa, apática, resignada e pouco envolvida nas questões fundamentais da sua vida. Vitimizava-se por tudo e por nada na relação que escolheu e podia terminar, porém mantinha o marido como se não houvesse alternativa… Se calhar, por vários momentos e motivos, não havia…

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Mesmo maltratada, a Dona “P” venerava o marido, muito por dependência, algumas vezes por causa do desenvolvimento da relação emocional com o seu “G”, semelhante ao síndrome de Estocolmo[1], bastando levá-la para algumas festas e festivais, regados de álcool e outros consumíveis, para fazê-la esquecer das suas agruras. O senhor “G” era especialista em inverter prioridades. Alimento e comodidade em casa não eram prioridade, as festas e a aparência, sim, sempre.

A meu ver aquela relação tipificava bem a VBG – Violência Baseada no Género –  que o senhor “G” considerava normal entre os seus pares. Mesmo que não fosse violência física, era evidente a violência psicológica baseada no medo, em mentiras e falsas expectativas. Baseada num futuro prometido que o senhor “G” não seria capaz de concretizar, por incapacidades reconhecidas. Ele era especialista no “pintchá c’barriga” tamanho era aquela parte do seu corpo…

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Via aquilo e ansiava pelo dia em que a Dona “P” iria tomar as rédeas do seu destino, com efetividade, e não continuar ludibriada na pílula de uma suposta democracia caseira. Ao menos trocar o senhor “G”, pois, com ele estava visto que a relação iria continuar naquele mesmo ciclo, vicioso e viciado, e que a dona “P” iria sofrer infinitamente. Ansiava ver a Dona “P” sair daquele sentimento de impotência, sair da indiferença, mostrar o seu descontentamento sempre que se sentisse maltratada, participar das decisões e não permitir que o andamento da sua vida fosse ditado pela combinação do senhor “G” com outros interesses, assumisse por inteiro a responsabilidade das reformas que a sua vida precisava para ser realmente feliz.

Ansiava pelo empoderamento, de fato, e não de conversa e aparência. Ansiava por vê-la demonstrar onde está a força e o poder. Mas, se calhar, ainda a Dona “P” não sabia. Anseios e utopias minhas, mas, continuarei a sonhar. Aí, nos meus sonhos, de certeza, a Dona “P” é valorizada e tratada com toda reverência e justiça que se lhe deve.

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Kimze Brito

Jornalista com 30 anos de carreira profissional, fez a sua formação básica na Agência Cabopress (antecessora da Inforpress) e começou efectivamente a trabalhar em Jornalismo no quinzenário Notícias. Foi assessor de imprensa da ex-CTT e da Enapor, integrou a redação do semanário A Semana e concluiu o Curso Superior de Jornalismo na UniCV. Sócio fundador do Mindel Insite, desempenha o cargo de director deste jornal digital desde o seu lançamento. Membro da Associação dos Fotógrafos Cabo-verdianos, leciona cursos de iniciação à fotografia digital e foi professor na UniCV em Laboratório de Fotografia e Fotojornalismo.

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