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As pessoas nas organizações e os riscos psicossociais

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Apesar de se falar das pessoas e do seu valor nas organizações, apesar de se proclamar e aclamar pessoas em tempos eleitorais, demagogicamente, sem se perceber o que se diz, apesar de um dos maiores ativos deste país, senão o maior, ainda ser as pessoas, na minha perspetiva, grande parte das organizações, públicas e privadas, ainda não tratam as pessoas como deveriam ser tratadas quer para o seu desenvolvimento, quer para melhor aproveitamento das próprias organizações. Apesar de proclamarmos o ano 2024 como o ano da saúde mental, de minha observação, é visível que muitas organizações não têm dado devida atenção aos efeitos negativos que tem causado às pessoas que nelas trabalham.

Por: Nelson Faria

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O tempo de se ver as pessoas como meros “recursos”, “objetos servis” e sujeitos passivos do processo produtivo está ultrapassado. Segundo Chiavenato, gerir com pessoas significa vê-las como parceiras que mais entendem das organizações, das suas atividades, dos seus negócios e do seu futuro. Nesta linha de pensamento, diz, isto requer que as pessoas sejam vistas como sujeitos ativos, empreendedores, criadores de inovação e valor através da sua inteligência, habilidades e competências para o seu crescimento e das organizações.

Ao invés disso, insistimos na cultura instalada, desadequada e desatualizada de tratar “os recursos” humanos”, apenas na base de regras e leis, quando assim acontece, porque muitos são os casos de grosseira violação da lei, quer no público quer no privado, levando que as pessoas adoeçam dia após dia. Quer em doenças visíveis, quer em doenças silenciosas, particularmente as ligadas à doença mental. O mau trato das pessoas nas organizações, fenómeno que deve ser estudado e aprofundado na nossa realidade, ultrapassa o incumprimento das leis. Roçam e consumam riscos psicossociais ligados a organização do trabalho, aos fatores sociais no trabalho e as condições do trabalho, mormente quando implicam equipamentos e tarefas perigosas.

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Questões como stresse no trabalho, assédio, equilíbrio entre vida profissional e pessoal e saúde mental tornaram-se preocupações crescentes nos ambientes de trabalho modernos. Segundo a OMS, no relatório mundial da saúde mental, estima-se que 12 bilhões de dias de trabalho são perdidos anualmente devido a problemas de saúde mental (depressão, ansiedade, etc.) que custam à economia global quase um trilhão de dólares americanos. No mesmo relatório é indicado que cerca de um bilhão de pessoas viviam com algum transtorno mental em 2019, sendo que 15 % dos adultos em idade ativa sofreram um transtorno mental, o que denota que o trabalho amplifica questões sociais que afetam negativamente a saúde mental, incluindo discriminação e desigualdade. O bullying e a violência psicológica (também conhecidos como mobbing) são as principais queixas de assédio no local de trabalho que têm um impacto negativo na saúde mental. De acordo com a OMS, a COVID-19 desencadeou um aumento de 25% de casos de ansiedade e depressão geral em todo o mundo, expondo a falta de preparação dos governos e organizações para lidar com o impacto da pandemia na saúde mental e revelando uma escassez global crónica de recursos para fazer face ao problema.

O relatório da Work Force Institute 2023[1]  indica que: 60% dos colaboradores em todo o mundo afirmam que o trabalho é o principal fator que influencia a sua saúde mental; os gestores têm tanto impacto na saúde mental das pessoas como o seu cônjuge (ambos 69%) e ainda mais impacto do que o seu médico (51%) ou terapeuta (41%); 81% dos colaboradores em todo o mundo priorizariam a saúde mental em vez de um emprego bem remunerado; 64% admitem que aceitariam uma redução salarial por um emprego que apoiasse o seu bem-estar mental; no final do dia de trabalho, 43% dos colaboradores estão “frequentemente” ou “sempre” exaustos e 78% afirmam que o stresse impacta negativamente o seu desempenho profissional; o stresse no trabalho também impacta negativamente a vida doméstica dos colaboradores (71%), o bem-estar (64%) e os relacionamentos (62%); 38% dizem que “raramente” ou “nunca” conversam com seu gestor sobre sua carga de trabalho.

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Portanto, lideranças tóxicas, muitas delas partidarizadas ou convenientes na nossa realidade, trabalho mal-organizado, o tratamento incorreto do ser humano que trabalha e produz para as organizações, a “partidarização” dos colaboradores, a falta de feedback, entre outras tantas condições débeis tem provocado doenças físicas e mentais onde o stress negativo, o burnout, a ansiedade, a depressão quando não extremos casos de outras patologias mentais, podem levar ao suicídio. Quanto a mim evidencia uma necessidade premente de aprofundarmos conhecimento de forma científica nas organizações em como a gestão de pessoas contribui, ou não, para a saúde dos colaboradores, sendo a saúde vista na sua plenitude, física, mental e social. Qual o nível dos riscos psicossociais nas nossas organizações e o que se têm feito para debelar situações que coloquem em causa a saúde e o bem-estar das pessoas? São a minha grande curiosidade.

Obviamente, a resiliência sobre as “patologias” que podem advir do trabalho varia e depende de indivíduo para indivíduo nos diferentes contextos de trabalho. Depende da forma como nos preparamos e fortalecemos, depende da nossa base educativa e da nossa “programação mental”, todavia, independentemente da força ou fraqueza de cada ser humano, do preparo individual, devem as organizações salvaguardar condições que não levem a consumação de riscos psicossociais, particularmente os que afetam a saúde das pessoas se, efetivamente, as pessoas forem vistas como parceiras no seu processo produtivo. Sem dúvidas, pessoas felizes e bem-resolvidas, organizações bem-sucedidas, é a minha crença.

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Constanca Pina

Formada em jornalismo pela Universidade Federal Fluminense (UFF-RJ). Trabalhou como jornalista no semanário A Semana de 1997 a 2016. Sócia-fundadora do Mindel Insite, desempenha as funções de Chefe de Redação e jornalista/repórter. Paralelamente, leccionou na Universidade Lusófona de Cabo Verde de 2013 a 2020, disciplinas de Jornalismo Económico, Jornalismo Investigativo e Redação Jornalística. Atualmente lecciona a disciplina de Jornalismo Comparado na Universidade de Cabo Verde (Uni-CV).

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