Dezenas de funcionários da Atunlo, na sua maioria mulheres, decidiram parar o labor esta manhã e organizar uma manifestação em frente a fábrica de processamento de pescado, na Cidade do Mindelo. Esta medida surgiu depois de terem ficado a saber ontem à tarde que vão receber o salário de janeiro em duas tranches devido a dificuldades financeiras enfrentadas pela empresa.
Várias funcionárias explicaram ao Mindelinsite que ficaram a saber da directora dos Recursos Humanos que deverão receber metade do vencimento amanhã e o restante, provavelmente, no dia 9 de fevereiro. Esta proposta deixou as trabalhadoras revoltadas e boa parte decidiu fazer uma greve/manifestação esta manhã.
“Estamos indignadas porque cumprimos um mês de trabalho, temos responsabilidades como a renda de casa, electricidade e água, jardim infantil, transporte, alimentação e muitas de nós dependemos apenas do nosso salário. Entendemos a situação da empresa, mas a empresa precisa também ver o nosso lado”, frisa Lucy, para quem esperar até ao dia 9 para receber a outra parte do vencimento é demais. Questiona como vão poder dar 9 horas diárias de labor sem comer.
Para Rivanildo, que foi trabalhar e encontrou os colegas na rua, a empresa tem estado a falhar com a sua mão-de-obra pelo que essa manifestação era previsível. “Não estamos satisfeitos com a situação laboral e já chegou o momento de sermos esclarecidos sobre o que se passa. Ouvimos rumores de que a fábrica será fechada e precisamos saber se isto é verdade”, diz esse jovem.
Nétria também chegou atrasada ao trabalho e deparou-se com a greve. Tal como Rivanildo, acha que esse protesto estava para acontecer a qualquer instante. Diz, aliás, que poderia até ocorrer dentro da fábrica. “Mas foi melhor ter acontecido na rua”, considera esta mãe de três filhos e que as educa sozinha. Para ela é um tormento vir receber o salário em duas tranches, quando tem obrigações inadiáveis. “Isto é um abuso, uma injúria”, afirma Nétria, que sente o emprego tremido devido aos rumores de encerramento da Atunlo em Cabo Verde.
A situação é tão precária que, segundo nossas fontes, a fábrica tem evitado renovar contrato com dezenas de funcionários. Carmen Medina confirma que a empresa tem estado a despedir pessoal quase todos os dias e que ela própria já recebeu carta de despedimento. “Recebi a carta esta segunda e disseram-me que a empresa está numa situação complicada e a rescindir contratos”, informa essa jovem, que estava prestes a completar dois anos de serviço.
Com sete anos na fábrica, Amândia da Luz diz que todos correm neste momento o risco de serem despedidos e ficarem desamparados. Ela que se mostrou indignada com o facto de a fábrica descontar 75% do prémio de produtividade se um trabalhador der apenas uma falta injustificada. “Se forem duas faltas injustificadas perdemos a totalidade do prémio e ainda sofremos descontos no salário base”, revela essa contratada para demonstrar a rigidez das regras implementadas na Atunlo. Questionada sobre como será o clima laboral quando regressarem ao trabalho, responde que será a de sempre: “pressão e chantagem”.
Lay-off a partir de fevereiro
A manifestação realizada hoje era algo previsível, segundo o sindicalista Heidi Ganeto. Sobre o pagamento fracionado do salário, diz que o Siacsa manteve um encontro esta manhã com a direção dos Recursos Humanos da Atunlo e foi informado que a empresa estava a aguardar a entrada de um montante amanhã, mas que dava para cobrir apenas parte dos salários.
Neste sentido, o sindicalista tentou convencer as funcionárias a apresentarem a seguinte contraproposta: receber amanhã metade do vencimento e a outra metade o mais tardar na terça-feira, dia 6. “Rejeitaram liminarmente a contraproposta”, revela o coordenador do Siacsa em S. Vicente, para quem está evidente o problema financeiro da Atunlo. Na sua perspectiva, a unidade instalada em S. Vicente estará a ressentir-se do encerramento de outras unidades da Atunlo, nomeadamente na Espanha.
O problema está tão sensível que, segundo Heidi Ganeto, foi informado pela empresa de que a Atunlo vai entrar em lay-off a partir do dia 23 de fevereiro, com a suspensão dos contratos de trabalho.
O cenário laboral na Atunlo está a deixar os trabalhadores agitados e preocupados com a segurança do emprego. Para o grupo, a situação exige a intervenção imediata do Primeiro-ministro Ulisses Correia e Silva e do Presidente da República José Maria Neves.
O Mindelinsite tentou falar com a administração da fábrica Atunlo, mas não tinha autorização para entrar no porto, onde a unidade está instalada. Entretanto, abordamos a directora da produção quando esta estava a chegar na sua viatura e ela ficou de nos comunicar do interesse e disponibilidade da empresa. Assegurou que nos daria uma resposta pelo que ficamos a aguardar, comunicação esta que ainda não chegou. Mesmo assim, o nosso jornal continua disponível para ouvir a versão da empresa quando esta estiver disposta a falar.