A cidade do Mindelo está a encetar uma dimensão imobiliária com acentuado nível especulativo tal como acontece na Europa, por via do aluguer de apartamentos a partir de plataformas digitais. Esta tendência foi constatada pelos artistas Pedro Brito e Antónia Marques, que costumam visitar Cabo Verde, em particular a ilha de S. Vicente. Foram nestas viagens que repararam nesse fenómeno, devido as dificuldades enfrentadas para encontrarem um espaço, que não fosse um hotel. Preocupados com os impactos dessa prática, alertam que isso pode encarecer demasiadamente a estadia na terra do Monte Cara e empurrar os próprios cidadãos cabo-verdianos para as periferias.
Segundo esses educadores lusos, o fenómeno está a ganhar tamanha dimensão, chegando-se ao ponto de proprietários de residências preferirem negociar o aluguer em euros, em detrimento do escudo. E, na perspectiva de Pedro Brito, isto é inadmissível. “Verificamos que a procura por espaços imobiliários tem sido altamente especulada, como acontece nas cidades europeias. Este assunto nos preocupa e vamos reflectir isto nos nossos trabalhos criativos”, salientam os artistas. Estes afirmam que já sentiram na cidade portuguesa do Porto a mesma situação que depararam agora no Mindelo. “No Porto ficou impossível habitarmos”, assegura Pedro Brito.
Quem quer arranjar uma residência em S. Vicente para passar alguns dias, dizem os nossos entrevistados, é quase que obrigado a negociar esses espaços fora de Cabo Verde, mais precisamente nas plataformas online. Esta realidade, dizem, não afugenta, em si, o turismo, mas afecta os residentes, mais precisamente quem precisa de uma casa para morar. Isto porque, realçam, os proprietários preferem alugar por dias do que entregar um apartamento por anos a uma família. Se as cidades ficam mais atractivas para os visitantes, salientam, tornam-se cada vez mais caras para os locais. “As pessoas preferem colocar as suas casas nessas plataformas do que alugá-las por tempo indeterminado. Logo, fica difícil encontrar uma casa por um preço razoável para aluguer. Este é um fenómeno que já faz história por este mundo fora, que é a ‘turistificação’ dos centros urbanos”, acentua Antónia Marques, 47 anos.
O projecto, reforça Brito, é tornar as cidades em salas de visita para os turistas. Só que o outro lado da moeda é que parte da cidade acaba por ficar vazia, se não houver procura. Na sua óptica, basta haver um contratempo, como o cancelamento de um voo ou uma mudança de plano do turista – “sem se falar na pandemia” – para baralhar as contas de quem aluga.
Em abono da verdade, são cada vez mais as pessoas em S. Vicente que remodelam as residências e as alugam por dia a turistas e emigrantes. Para a proprietária Inês Medina, essa prática é mais rentável, além de evitar os problemas com inquilinos que negam pagar a renda mensal e ainda destroem as casas.