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APESC denuncia prática de pesca destrutiva na ZEE e no Oceano Atlântico por barcos da União Europeia

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Ainda na ressaca do Dia Mundial dos Oceanos, assinalado ontem em Cabo Verde, o presidente da Associação dos Armadores de Pesca de Cabo Verde denunciou, num exclusivo Mindelinsite, a pratica de pesca destrutiva na Zona Económica Exclusiva (ZEE) e no Oceano Atlântico, perante a passividade das autoridades. João Lima garante que não é a primeira vez que comunica o uso de dispositivo controlados por satélites, altamente prejudiciais para o ambiente marinho, para fazer a limpa nos mares do país e no Atlântico, com forte na pesca de tunídeos, que desapareceram de Cabo Verde, mas também o aumento da poluição devido ao abandono destes equipamentos nos oceanos.

João de Deus Lima, que diz estar cansado de bater na mesma tecla há algum tempo sem resposta, afirma que não se pode continuar a fazer discursos pomposos sobre a sustentabilidade da pesca, quando o Estado de Cabo Verde não controla a sua ZEE e é conivente e compactua com a pesca destrutiva praticado aqui e no oceano Atlantico. “Temos vindo a chamar a atenção do Governo de Cabo Verde para resolver esta situação porque é uma pesca destrutiva para o sistema ambiental marinho. Está a reduzir todo o stock de tunídeos, sobretudo do atum, e a qualquer momento pode se transformar em um problema grave para o país e para o oceano Atlantico”, adverte o presidente da APESC.

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De acordo com este armador, os dispositivos de pesca utilizados são colocados, entre junho a setembro, altura de passagem do atum por Cabo Verde. “O Porto Grande é utilizado como porto de transbordo, descarga e armazenamento destes equipamentos. E temos fotos para provar o que estamos a dizer. Somos um estado insular, mas também um grande estado oceânico. Exigimos respostas do Governo e, sobretudo mais fiscalização. Exigimos que seja proibido o uso deste tipo de equipamento de captura de pesca. Que sejam criados outros mecanismos ou tecnologias de pesca na nossa ZEE”, sugere Lima, esclarecendo que o mecanismo utilizado é constituído por cabos, sacos, cana de bambu e rede. É colocado por um navio que faz especificamente este trabalho. 

Estamos a falar de um cargueiro, que vem anualmente ao Porto Grande, descarregar milhares de toneladas de equipamentos, que não são propriamente  dispositivos de concentração de peixes (DCPS). Têm um ship de localização monitorado por um centro de pesca não sei de qual país. São colocados nas zonas de passagem dos tunídeos e criam um lime que atrai os pequenos e grandes pelágicos. Depois aparecem os barcos cercadores que recolhem os grandes cardumes que ficam presos. São quantidades incalculáveis de pescado”, acusa este armador.  

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O problema, prossegue João Lima, uma grande quantidade deste equipamentos são, posteriormente, abandonados e ficam perdidos no Atlânticos. “Já recolhemos parte destes equipamentos na ilha de Santa Luzia e podem aparecer em qualquer país. Há anos que vemos denunciado e o Governo sabe, mas ninguém faz nada. A fiscalização tem de perceber que tipo de pesca está sendo praticado na nossa ZEE. Estes equipamentos não são biodegradáveis. Não temos a mínima noção da quantidade de equipamentos são colocados e que estão a poluir os nossos mares e o oceano Atlântico.”

Falta de peixes

Questionado até que ponto o uso destes equipamentos está a contribuir para a escassez de peixes nos mares de Cabo Verde, conforme denuncia recorrente dos pescadores, o presidente da APESC não tem dúvida que está claramente ligado a esta pesca destrutiva. “O atum deixou de entrar na zona de captura das embarcações semi-industriais devido a esta pesca. É por isso que digo que não podemos continuar nesta ignorância de discursos bonitos no Dia dos Oceanos quando compactuamos com esta pratica e ninguém diz nada. Falta coragem politica para resolver este problema porque fiscalização existe. As descargas são feitas no Porto Grande e já fizemos muitas denuncias. Todas as entidades competentes, incluindo a FAO e a Biosfera, foram devidamente informados.” 

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Quando confrontado se esta pesca está prevista no Acordo de Pesca entre Cabo Verde e a União Europeia, este diz não conseguir precisar. Afirma, entretanto que, não obstante a UE ser um parceiro de Cabo Verde, ela garante a defesa dos oceanos. Por isso, exige saber quem é responsável por permitir que esta pesca destrutiva seja praticado no país. “A UE é uma instituição séria e não acredito que pode estar a fechar os olhos a isto. Basta ver que os navios que tem licença de pesca em Cabo Verde não utilizam estes equipamentos no espaço europeu. É proibido,” diz, realçando que estes dispositivos são controlados por satélite e, quando estão cheios, os navios são accionados e vão lá encher de atum. 

Toda a operação pode ser seguido através do site da Organização Marítima Internacional (IMO), declara, exemplificando com o caso de uma embarcação que saiu do Porto Grande e passou uma semana no sul da Brava, que é a porta de entrada dos cardumes para os mares de Cabo Verde. Este chegou depois em São Vicente com mais de mil toneladas de peixes, perante a inoperância das autoridades e impotência dos armadores de pesca nacionais. “É por estas e outras que pretende abandonar a APESC. Já cumpri dois mandados, mas não dá mais. Há muitas questões por resolver. Não podemos continuar a falar com seriedade em gestão sustentável dos recursos quando não conseguimos sequer responder as demandas que ocorrem na nossa ZEE”, desabafa. 

Guarda Costeira desprovida de meios

Sobre este particular, João Lima afirma que a Guarda Costeira, que poderia fazer a fiscalização dos mares de Cabo Verde, está há mais de três anos com o navio Vigilante avariado, não dispõe de um avião e nem de drônes para patrulhamento. “O patrulhamento da ZEE por parte das autoridades nacionais é inexistente. Só não digo que foi abandonado por causa dos acordos bilaterais com o Brasil e a União Europeia. Mas pergunto se a UE pode jogar e apitar ao mesmo tempo. São questões fundamentais.”

Para este armador, nem tudo pode ser justificado com alterações climáticas, sendo alguns problemas são resultado da incapacidade dos país em garantir a sustentabilidade haliêutica das próximas gerações. Neste caso em concreto, afirma, o sector das pescas está a enfrentar uma situação difícil em termos de captura e não se percebe qual é a politica do Governo para o sector da pesca semi-industrial e para a ZEE. “É uma confusão. Ninguém sabe qual é o papel da Guarda Costeira e do Ministério do Mar, que tem uma responsabilidade enorme na resolução desta questão”, anuncia, não sem antes pedir ao atenção do Chefe do Governo para dizer aos armadores quando é que o país vai ter um ministro do Mar exclusivo por forma a concentrar na política do mar. “Já não aceitamos um ministro que seja do Mar e da Cultura porque a sua capacidade de concentrar no sector marítimo fica nitidamente debilitado”, finaliza. 

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Constanca Pina

Formada em jornalismo pela Universidade Federal Fluminense (UFF-RJ). Trabalhou como jornalista no semanário A Semana de 1997 a 2016. Sócia-fundadora do Mindel Insite, desempenha as funções de Chefe de Redação e jornalista/repórter. Paralelamente, leccionou na Universidade Lusófona de Cabo Verde de 2013 a 2020, disciplinas de Jornalismo Económico, Jornalismo Investigativo e Redação Jornalística. Atualmente lecciona a disciplina de Jornalismo Comparado na Universidade de Cabo Verde (Uni-CV).

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