A arma usada por Cabo Verde para derrotar ontem a seleção da Venezuela por 81 – 75 foi uma elevada estratégia táctica, que, segundo o técnico-adjunto Zé Anguila, foi traçada ao pormenor após um minucioso estudo da equipa adversária. Segundo Anguila, Cabo Verde criou um sistema de jogo que passava pela rotação dos jogadores nos dois primeiros períodos a cada 4 ou 6 minutos. Além disso, Cabo Verde usou o gigante Edy Tavares como uma âncora para “amarrar” os defensores da Venezuela junto a tabela e libertar os disparos de fora, que foram magistralmente convertidos por jogadores como Ivan Almeida, Betinho e Joel Almeida.
“No início, as pessoas não entendiam como um Ivan marcava 3 cestos e era substituído ou que o Betinho convertia 3 pontos e saía. Tudo isso foi estudado e fizemos uma gestão táctica rigorosa. O objectivo era depois termos os nossos jogadores frescos na recta final da partida e isso funcionou”, explica o ex-internacional cabo-verdiano, para quem Cabo Verde deu um enorme banho táctico à Venezuela, uma equipa que está na 17ª posição do ranking mundial e que fez uma preparação profunda, com jogos em Espanha e França.
Os “tubarões-azuis”, enfatiza o técnico, diminuíram drasticamente o potencial atacante dos venezuelanos, uma equipa com uma média de estatura praticamente equivalente, e adicionaram ainda ao jogo uma maior dose de agressividade. “Comparativamente a Geórgia, a seleção da Venezuela é menos alta e soubemos tirar proveito desse factor. Para tanto teríamos que ser inteligentes e alcançarmos um nível elevado de conversão dos cestos de fora. E isso aconteceu, ao contrário do ocorrido com a Gerórgia, em que a nossa eficácia foi muito baixa”, considera Zé Anguila.
No jogo com Geórgia, segundo essa fonte, o combinado nacional foi afectado pela ansiedade dentro e fora do campo, ao ponto de não terem encontrado soluções para driblar a táctica da equipa adversária. Segundo Zé Anguila, sempre que a bola chegava a Edy Tavares ele era coberto por dois e até três jogadores – que lhe tapavam o caminho para passes e entradas para o cesto – e não apresentaram soluções para driblar essa estratégia. “Dou a mão à palmatória porque devíamos ter visto isso e tentado dar a volta a essa situação”, confessa o adjunto do técnico Mané Trovoada, para quem Cabo Verde poderia ter um resultado positivo se não fosse o nível de ansiedade instalada dentro e fora da quadra.
Jogar para vencer a Eslovénia de Luka Doncic
Para o jogo contra a Eslovénia, uma das equipas candidatas ao título mundial, Cabo Verde vai montar a sua estratégia e entrar para ganhar, ciente, no entanto, do potencial dos eslovenos, que contam com Luka Doncic, ala dos Dallas Mavericks e com uma média de 30 pontos por jogo. Um armador que, enfatiza Zé Anguila, tem argumentos que não acabam.
Mesmo assim, os tubarões do Atântico pretendem ir à caça de pontos amanhã, com o claro objectivo de passarem à segunda fase. Para isso, a equipa técnica e os jogadores vão estudar as linhas de jogo da Eslovénia e traçar a contraofensiva. “Se estivermos concentrados, tudo pode acontecer”, enfatiza.
Para continuar em jogo, Cabo Verde vai depender de alguns factores. Em primeiro lugar do resultado da partida com a Eslovénia. Se vencer ou empatar, vai ter de aguardar pelo resultado da partida entre Venezuela e Geórgia e fazer as contas. “Para nós já é uma vitória estarmos no Mundial e vamos disfrutar este momento ao máximo, ainda mais num país com tantos valores sociais como o Japão”, frisa Zé Anguila, que faz rasgados elogios ao povo japonês. A forma como têm tratado a seleção cabo-verdiana, para ele, é única.
Cabo Verde, segundo Zé Anguila, foi convidado por Japão para um pré-campo que serviu para os jogadores se ambientarem com o país e conhecerem algumas instituições, como escolas do ensino básico e as autoridades municipais do país. E durante este tempo, os jogadores têm recebido um carinho ímpar, adianta o técnico-adjunto. Aliás, vários japoneses têm apoiado Cabo Verde nas bancadas, algo que deixa Zé Anguila muito sensibilizado.
Suporte “fantástico” dos adeptos
Ao nível do suporte dos adeptos, a seleção está rodeada de um grupo de emigrantes eufóricos, que, embora poucos, tentam pintar de azul as bancadas com as bandeiras e cachecóis. Na sua maioria são cabo-verdianos residentes nos Estados Unidos e alguns adeptos ligados ao basquetebol que foram propositadamente de Cabo Verde. Um suporte que Zé Anguila considera fantástico.
Outro ponto enaltecido pelo treinador é o interesse que os atletas cabo-verdianos estão a despertar nos olheiros de diversos clubes profissionais. Desde que Cabo Verde conseguiu a qualificação começaram a solicitar informações sobre os jogadores, mas, segundo Zé Anguila, esses contactos tiveram um pico ontem devido a vitória sobre Venezuela. Sinal positivo para os jogadores, mas para todo o arquipélago, cujo basquetebol ganha projeção, como salienta essa fonte. “As pessoas ficam curiosas em saber qual o nosso segredo, como um país tão pequeno, sem grandes recursos consegue ter um nível tão elevado de basquetebol”, diz.
Um dos objectivos da seleção nacional é conseguir a qualificação directa para os Jogos Olímpicos como a equipa africana melhor classificada no Mundial. Cabo Verde poderia ficar bem posicionado com o triunfo de ontem, mas, por coincidência, as formações do Sudão do Sul, Costa do Marfim e Angola também saíram vitoriosas. Para Zé Anguila, trata-se de um feito histórico para o basquetebol africano. Logo, a seu ver, os dados continuam a rolar e Cabo Verde tem de continuar focado nos seus objetivos.