Germano Almeida reafirma ser um “contador de histórias” e oferece homenagem à sua vida e obra literária à Cidade do Mindelo
O escritor Germano Almeida voltou a carimbar-se ontem como um “contador de histórias” e ofereceu à cidade do Mindelo a homenagem à sua vida e obra realizada no Centro Cultural do Mindelo no âmbito do Festival Escritaria, numa parceria entre a Câmara de Penafiel e o Ministério da Cultura. “Quando digo que não sou escritor não é bazofaria do cabo-verdiano, é o que eu sinto”, frisou o vencedor do conceituado Prémio Camões da literatura em português.
Segundo este jurista de profissão, o que sabe e sente é que quer continuar a contar a história das gentes das ilhas, como fez com a “Ilha Fantástica” (Boa Vista) ou com “O dia das calças roladas” (Santo Antão)…
Quando coloca a pena na mão, diz Germano, lembra sempre dos contadores de estórias do seu tempo de infância. Pessoas que sentavam à soleira da porta numa noite de luar e contavam e inventavam estórias. Neste sentido, diz, quando escreve está sempre a contar algo a alguém.
Nascido na ilha da Boa Vista e residente em S. Vicente há quase 40 anos, Germano Almeida enfatizou que a ilha das dunas continua bem presente no seu íntimo. Por outro lado, diz, Mindelo foi a cidade que o acolheu e onde se formou homem. “Efectivamente, o que sinto é ter sido adoptado por Mindelo, onde vivo há quase 40 ano. A Boa Vista nunca saiu de mim, também sou um homem feito por Mindelo”, diz o escritor, que ofereceu, deste modo, essa homenagem à ilha da sua apaixonada praia da Lajinha.
Conhecido pela sua humildade, Germano Almeida confessou que ficou de tal forma emocionado ao entrar no Centro Cultural do Mindelo, e ser ovacionado pelos presentes, que chegou a pensar que não estaria em condições de dizer uma palavra. Já no púlpito, disse lembrar-se sempre das palavras do poeta português João de Deus, que dizia: “Estas honras e este culto bem que se podiam prestar a homens de grande vulto.” Dito isto, Germano agradeceu ao ministro Abraão Vicente a ideia de trazer a Escritaria de Penafiel para Mindelo e ser homenageado em solo cabo-verdiano.
A iniciativa, como viria a revelar o autarca de Penafiel, é fruto de um compromisso que Abraão Vicente assumiu em 2021 a quando da 14. edição do festival literário realizada naquele município e que homenageou Germano Almeida. Segundo Antonino de Sousa, às vezes os políticos não gozam de credibilidade quando assumem determinados compromissos, mas enalteceu a postura de Abraão Vicente, que prometeu trazer a homenagem para Mindelo e levar Penafiel a internacionalizar o festival literário. “Em boa hora, o ministro teve essa visão da internacionalização, que ainda não tínhamos tido, que nos permitiria trazer essa homenagem à terra do homenageado. Se Germano Almeida estava a proporcionar tanta alegria e momentos de reflexão aos portugueses, na sua terra natal isto seria vivido de forma mais emotiva e envolvida”, confidenciou o autarca luso, que aproveitou também para felicitar Mindelo pela sua beleza e amabilidade das suas gentes.
Movido pelo “ciúme”
Em resposta, Abraão Vicente confidenciou ao edil de Penafiel que a única razão de o Ministério da Cultura e das Indústrias Criativas ter decidido organizar a homenagem a Germano Almeida foi o “ciúme”. Segundo Abraão Vicente, chegou à cidade de Penafiel, viu as ruas pintadas com o rosto de Germano Almeida, a capa dos seus diversos livros e dizeres e sentiu-se invadido por um sentimento de ciúmes. “O ciúmes deve ser um dos sete pecados capitais, mas tenho de fazer esta confissão pública de que, como ministro da Cultura, senti-me em falta para com Germano Almeida. E pensei, ‘porque esta ideia não foi minha?!”, revelou A. Vicente.
Este também artista e escritor confidenciou que foi esse ciúme que o levou a copiar a ideia da silhueta de Germano Almeida a ser inaugurada hoje à tarde na cidade do Mindelo. “Copiei a ideia, que isto fique claro, para amanhã não aparecer um artista a dizer que apresentou o projecto a uma Câmara ou ao Governo e que acabou por ser copiado”, atestou o ministro, acrescentando que a réplica da silhueta instalada em Penafiel é tão verosímil que foi feita pelo artista autor da original.
Abraão Vicente sublinhou a importância de se estar a homenagear Germano Almeida em vida e ainda em pleno processo criativo. Para ele, Cabo Verde não pode correr o risco de vir reconhecer a dimensão da obra de um escritor do calibre de Germano Almeida só quando deixar o mundo dos vivos, tal como aconteceu com a diva Cesária Évora.
“Se há uma cidade no norte de Portugal sem nenhuma ligação moral, histórica com Mindelo ou com a obra do Germano, mas que o escolheu para fazer a desconstrução da sua obra e tirar todos os detalhes a partir do qual podemos construir esta figura, por que não nós?!. Por que não começar pela cidade do Mindelo?!”, fez constar Abraão Vicente. Para o ministro, o facto de Germano afirmar repetidamente que é um “contador de histórias”, e não um escritor, revela a sua grandeza.
No âmbito da homenagem, será inaugurada hoje à tarde uma silhueta em ferro do escritor. Este que apontou a praia da Lajinha como o local mais indicado para receber a obra.