Boss convoca os foliões mindelenses para um protesto na terça-feira do Carnaval: “Eu vou nem que seja preso”
Está em curso no Facebook uma convocatória lançada pelo artista plástico João “Boss” Brito para um protesto dos foliões na cidade do Mindelo na terça-feira do Carnaval, com concentração na praceta Don Luiz a partir das 18 horas. A ideia, segundo este carnavalesco, é levar os mindelenses a saírem à rua mascarados para manifestarem a sua indignação pela “forma discriminatória” como S. Vicente anda a ser tratada pelas autoridades por esta altura da festa do Rei Momo, em comparação a outras ilhas. Boss afirma que a Polícia Nacional e a Delegacia de Saúde têm estado intransigentes na ilha do Monte Cara, obrigando ao cancelamento de vários eventos por estes dias, quando noutras partes do país andam a “fechar os olhos”.
O criador de alguns dos mais emblemáticos andores do grupo Monte Sossego recorre-se a uma missiva enviada pela Delegada de Saúde substituta, na qual chama atenção dos destinatários para o necessário cumprimento das medidas de restrição em vigor, que proíbem eventos susceptíveis de provocar a concentração de pessoas pelo Carnaval. Na nota lê-se que, tendo em conta a data das festividades que se avizinham e a dimensão festiva, são proibidas as actividades promovidas no âmbito dessa celebração cultural, por razões de saúde pública. O comunicado especifica que são interditos os ensaios, desfiles organizados, apresentações de blocos e as manifestações espontâneas, bem como as festas públicas, privadas ou em espaços públicos.
Conforme apurou o Mindelinsite, alguns promotores visados pela nota tiveram que cancelar os seus programas na cidade do Mindelo, nomeadamente uma recepção a turistas de um barco cruzeiro, rodas de samba em bares e esplanadas, um almoço num restaurante e até a readaptação de um evento destinado a crianças de um centro cultural. Actividades que, conforme os organizadores, iriam reunir dezenas de pessoas em espaços confinados, tal como tem vindo a acontecer.
Entretanto, a indignação de vários foliões aumentou com a divulgação de um cartaz de um espectáculo musical pela festa da banderona na ilha do Fogo e de um vídeo que mostra centenas de pessoas reunidas numa rua na cidade da Praia curtindo uma batucada animada por “mandingas”. Duas fontes abordadas pela nossa reportagem na Capital confirmaram a veracidade do vídeo e garantiram ao Mindelinsite que o evento aconteceu anteontem numa zona perto da Terra Branca. As nossas fontes acrescentam que, enquanto estavam no local, um carro de patrulha da PN passou pela rua, mas nada aconteceu. “As pessoas abriram espaço, o carro passou e continuaram a curtir o ambiente, que até estava bastante agradável”, assegura um músico.
Essa situação acabou por aumentar a determinação de Boss em levar avante o protesto. O artista partilhou o vídeo e lançou o apelo a uma maior adesão das pessoas. “Posso até ser preso, mas vou levar esta manifestação adiante porque querem bloquear S. Vicente. Noutras partes, como por exemplo na cidade da Praia, podem festejar que nada acontece. Aqui as autoridades estão a impedir qualquer evento que leve o nome ‘carnaval’, por causa da prorrogação da situação de calamidade. Se somos um único país a lei é para ser aplicada com o mesmo peso e a mesma medida a toda a gente”, critica.
A manifestação deveria começar às 14.30, hora em que normalmente o primeiro grupo entra na Rua de Lisboa nos desfiles carnavalescos. Porém, após ser lembrado por várias pessoas de que não há tolerância de ponto na terça-feira, Boss acabou por passar a concentração para as 18 horas na praceta Don Luiz. Dezenas de pessoas já garantiram a sua presença nesse protesto, tendo em conta os comentários feitos na página de João Brito e de outras pessoas que partilharam o cartaz no Facebook.
Uma delas é Kátia Ferreira, Porta-bandeira do grupo Monte Sossego. Segundo esta amante do Carnaval, decidiu juntar-se ao amigo Boss porque concorda com essa iniciativa e por sentir que há realmente uma tentativa de bloqueio da ilha de S. Vicente. “Há coisas a acontecer por esta altura noutras ilhas e em S. Vicente as autoridades estão a tentar impedir tudo o que diz respeito ao Carnaval”, diz Kátia Ferreira.
Na sua opinião, isto acontece porque os mindelenses gostam de cumprir a lei, mas neste caso, diz, a lei deve ser aplicada em todo o território nacional. Esta jovem enfatiza que o cancelamento do Carnaval tem prejudicado a economia de S. Vicente, a ilha onde essa manifestação tem mais impacto em Cabo Verde. Ela própria trabalha por altura do Carnaval e tem sentido essa consequência no bolso.
Para Kátia Ferreira, não foi propriamente o vídeo da batucada na cidade da Praia que estimulou a ideia da manifestação. Esta jovem mindelense assegura que a decisão do cancelamento do Carnaval, numa altura em que os casos de Covid-19 voltaram a disparar, foi aceite, mas caiu mal no espírito de muita gente.
“Eu não sei o que vai acontecer na terça-feira, mas eu vou”, respondeu quando perguntado sobre o que está previsto para amanhã, dia do Carnaval.
