O serviço da Proteção Civil vai fiscalizar as placas desportivas em S. Vicente com o apoio da Polícia Nacional e das Forças Armadas para obrigar as pessoas a cumprir as medidas restritivas no âmbito do combate à Covid-19. Esta medida surge devido a um caso crítico de aglomeração testemunhada pelas autoridades e que, segundo Renaldo Rodrigues, aumenta o risco de contaminação em SV, cujo quadro epidemiológico piorou. Nesta entrevista, o presidente da Proteção Civil entende que a retoma das viagens inter-ilhas pode proporcionar a propagação do vírus a nível nacional e enfatiza que o retorno das actividades dos artistas não se vislumbra tão fácil no momento.
Por Kimzé Brito
Mindel Insite – Está em S. Vicente para acompanhar o evoluir da pandemia, juntamente com a Inspeção do Trabalho, a IGAE e a Delegacia de Saúde. O que aconteceu de concreto?
Renaldo Rodrigues – Tem vindo a acontecer nas últimas semanas um reforço das medidas de fiscalização das autoridades competentes a operadores económicos, tendo em conta o cumprimento das medidas restritivas aprovadas pelo Governo, neste sentido vimos apurar o pulsar da situação em S. Vicente. Fizemos uma reunião com a Delegacia de Saúde com o propósito de entender o quadro epidemiológico actual da ilha. O Delegado fez um retrato dos contágios, das zonas afetadas e das pessoas em isolamento tanto em casa como institucional. Esses dados permitiram-nos avaliar de que forma podemos quebrar o canal de contágio. Identificamos muitos pontos críticos onde temos de actuar urgentemente, espaços que neste momento não deviam estar a funcionar, mas que abrem normalmente, como placas desportivas que continuam a ser usadas.
Vamos tentar colocar cobro a esta situação com a ajuda da Polícia Nacional e das Forças Armadas porque o cenário que vimos anteontem numa das placas é bastante critico. Presenciamos uma aglomeração exagerada de pessoas a assistir uma partida de futebol, que está proibida. Cabe-nos fazer cumprir o que esta na lei.
MI – Os casos de Covid-19 voltaram a surgir em S. Vicente desta vez com mais intensidade, havendo neste momento propagação comunitária. Qual a avaliação que faz do estado epidemiológico neste momento em S. Vicente?
RR – Pelas informações prestadas pela Delegacia de Saúde a situação ainda está controlável. Todos os focos têm sido identificados e feito o rastreio dos contactos de forma rápida. Mas falamos de um vírus cuja velocidade de propagação é elevada. No entanto, os comportamentos de risco podem levar a um descontrolo, pelo que a população tem de colaborar. O vírus não anda sozinho, nos é que o transportamos. Se usarmos máscara e mantivermos o distanciamento será facilmente controlável. Sabemos que todos estão cansados, querem voltar à normalidade, mas podemos ter sucesso como um país unido se fizermos sacrifícios.
MI – Foi preparado algum plano especial para ser aplicado em S. Vicente nos próximos dias?
RR – Está um gabinete de crise a funcionar, mas com recursos que tem na ilha. Da parte da Proteção Civil vamos mandar um técnico para reforçar a coordenação em S. Vicente e trazer as FA para o campo. Vamos trabalhar um plano diário de actuação com ações diurnas e noturnas como fazemos na Praia. Com mais elementos, este gabinete pode fazer um planeamento mais eficaz porque temos de actuar na prevenção.
Depois de 3 cervejas…
MI – Aumentou a circulação inter-ilhas com a abertura dos espaços marítimos e aéreos. Esta medida pode ser um dos factores do aumento de propagação do vírus em Cabo Verde?
RR – Com a abertura das ligações é claro que a possibilidade de o vírus andar pelo pais aumentou. Por isso temos estado a defender o uso obrigatório de máscara na via pública. Recebemos a notícia que o diploma foi aprovado pelo Parlamento, entendemos que, mesmo com o teste rápido, não temos a garantia que a pessoa esteja de facto negativa. Pode ser um falso negativo ou que na altura da viagem ainda nao tenha desenvolvido a infeção. Há ainda margem de erros que nos levam a acreditar que a abertura das viagens facilita a propagação. Daí precisarmos de medidas suplementares.
/ Com a abertura das ligações é claro que a possibilidade de o vírus andar pelo pais aumentou. Por isso temos estado a defender o uso obrigatório de máscara na via pública.
Há uma vulnerabilidade que, se não for atacada, perdemos o controlo epidemiológico. Daí as várias decisões tomadas pelo Governo para minimizar o contágio como o encerramento de bares, discotecas, espaços desportivos, pois exigem aproximação física. Por mais que as mesas e cadeiras estejam distantes num bar, depois de 3 cervejas o pessoal tende a conviver mais de perto.
“Não será fácil a retoma das actividades artísticas”
MI – Os artistas reclamam da situação que vivem há mais de sete meses e querem voltar a trabalhar. Como a Proteção Civil vê essa reivindicação?
RR – Estamos a enfrentar um período difícil para o país. Temos estado a ver que a actividade económica está quase parada, daí a reabertura dos espaços aéreo e marítimo. Temos a noção que a actividade dos artistas está condicionada porque está associada a juntamente de pessoas. Mas não devemos focar-nos apenas nos espectáculos ao vivo. Há outras ferramentas que os artistas podem fazer valer para terem algum rendimento, como direitos autorais. Anteontem na abordagem noturna feita em S. Vicente verificamos que grande parte dos DJ’s não tinham solicitado licença para usar músicas dos artistas. É uma via que podem recorrer para minimizar este período menos conturbado.
MI – Acontece que boa parte dos músicos que fazem animação cultural nao são autores-compositores. São interpretes, pelo que lhe pergunto se este será o momento indicado para permitir as noites cabo-verdianas.
RR – Da forma como o vírus está a circular na comunidade, o nosso entendimento – pode haver outros diferentes – é que não seria o tipo de actividade que se coaduna com o momento que atravessamos. Sabemos que muitas vezes essas actividades decorrem em espaços fechados e a probabilidade de haver contaminação local é elevada, se estiver uma pessoa infectada. Pela situação que atravessamos não será uma actividade de fácil retoma. Todos queremos a normalidade, mas poucos estão a trabalhar por isso.
/ Da forma como o vírus está a circular na comunidade, o nosso entendimento – pode haver outros diferentes – é que não seria o tipo de actividade (artística) que se coaduna com o momento que atravessamos.
Acredito que a o Ministério da Cultura tem estado a acompanhar o caso e que vai encontrar uma solução para minimizar o risco. Falamos de um segmento específico, houve retoma de outras actividades, mas criando uma cortina de segurança.
Situação na escola Jorge Barbosa
MI – Há alguns casos de infeção na Escola Jorge Barbosa e provavelmente isso foi abordado com o Delegado de Saúde. Queria saber se a Proteção Civil defende o encerramento desse liceu?
RR – Muito se tem falado da actividade escolar, quando há transmissão comunitária em S. Vicente e noutras ilhas. Falando de novo da actividade desportiva que aludimos antes, havia crianças nesse espaço, ou seja, estamos a falar de uma sociedade em que os próprios pais não estão a garantir a segurança dos filhos. Vemos aglomerado de crianças nos parques infantis e noutras áreas e isso acarreta sempre riscos. A actividade escolar presencial é importante e isso exige dos pais e das escolas um controlo rigoroso, o que nem sempre é possível. Se os adultos estão com dificuldades em interiorizar o problema, pior as crianças que gostam de brincar com os colegas. Acredito que o M. da Educação está a avaliar a situação e pode tomar a sua decisão porque há sempre risco associado.
MI – No caso concreto de Jorge Barbosa, concorda com o encerramento de turmas ou mesmo da escola?
RR – É uma medida possível nesta fase, mas, pelo que apercebi-me, o DS e a Delegada da Educação estão a tentar uma intervenção para evitar o encerramento. Acredito que estejam a acompanhar a situação e, havendo risco de contaminação em massa, haverá encerramento. Está tudo a ser ponderado com a devida cautela.