Jurista F. Cardoso nega avançar com as alegações finais no caso A. Oliveira e MP acusa a juíza de ser “benevolente” com a defesa
As alegações finais da defesa e acusação do caso Amadeu Oliveira não foram apresentadas esta manhã naquela que prometia ser a derradeira sessão do julgamento, que, por coincidência, completou hoje um mês. Ao reabrir a audiência – mais uma vez com um atraso superior a uma hora –, a juíza Circe Neves anunciou que a mesma seria dedicada às alegações, mas a defesa interveio de imediato para anunciar que fazia questão de ver alguns documentos solicitados ao Supremo Tribunal de Justiça aceites como elementos de prova. O advogado Félix Cardoso deixou claro que a defesa não iria avançar com a sua argumentação final sem que os documentos fossem incluídos no processo enquanto provas a favor do arguido. E lembrou a juíza-presidente que disse na sessão anterior que não haveria alegações sem a junção dos documentos.
Nisso, o Ministério Público pediu a palavra e ditou um requerimento para a acta, tendo o Procurador Vital Moeda alegado que se estava perante mais um acto da defesa que iria atrasar ainda mais o andamento do processo. “O que está a acontecer porque o tribunal tem sido demasiado benevolente para com a defesa”, afirmou o magistrado do Ministério Público.
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Segundo Moeda, é natural que o tribunal garanta todos os direitos da defesa do arguido, mas enfatizou que isso tem de ocorrer dentro dos trâmites processuais legais. E a lei, diz, é clara quanto a junção de documentos, que, nas suas palavras, devem dar entrada nas fases preliminares. Estes só podem ser aceites posteriormente, prosseguiu o Procurador da República, se for impossível ao sujeito processual executar esse expediente antes. O que, na sua opinião, não se aplica ao caso.
Vital Moeda acrescentou que os documentos referenciados pela defesa estão pendentes no Supremo Tribunal de Justiça há muito tempo e o arguido tinha esse conhecimento. Pelo que, se não requereu a junção dos mesmos antes foi, segundo Moeda, por falta de cuidado.
Apesar disso, o Ministério Público pediu para ser informado concretamente dos documentos pretendidos pela defesa, caso o tribunal decida aceitar o pedido. E, a acontecer isso, diz que precisaria de tempo para os analisar e ver se são relevantes para a descoberta da verdade. Além disso, Vital Moeda enfatizou que o MP iria exigir tempo para fazer o contraditório, assim como poderia requerer a junção de outros documentos para sustentar o contraditório.
Esse requerimento suscitou logo a resposta da defesa, que começou por dizer que a reação do MP representa uma “falta de lealdade processual” nunca antes vista. Isto porque, segundo Félix Cardoso, a junção dessas peças processuais foi antes decidida e o MP chegou a dizer que não se opunha a esse procedimento. Para Cardoso, isto está na acta e a acusação não pode agora vir mostrar arrependimento e tentar criar obstáculos à defesa.
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O causídico lembrou que o STJ emitiu nota a dizer que a defesa podia consultar o processo e indicar as peças que precisava, fazer uso dos documentos e pagar as despesas. E tudo isso, segundo Cardoso, era do conhecimento do MP. Logo, diz, o requerimento do MP vai em contramão ao seu legado como defensor da legalidade, perigando toda a lógica do sistema constitucional.
Argumentou que, contrariamente ao defendido pela acusação, as provas documentais podem ser juntas até o final do julgamento, quando isso não seja possível nas fases preliminares. Reforçou que a necessidade probatória da defesa jamais poderia ser limitada à fase preliminar sobretudo quando aconteceu a Audiência Contraditória Preliminar, solitada pelo arguido. E esta fase, diz, trouxe novos elementos de factos e um novo enquadramento que o arguido teve a consciência só depois do despacho de pronúncia.
Félix Cardoso acrescentou que a defesa deu conhecimento ao Tribunal da Relação de Barlavento da comunicação do STJ e ficou combinado que tudo iria fazer para entregar os documentos antes das alegações. No entanto, diz, o Supremo não conseguiu agir com a celeridade necessária, apesar da sua boa-fé, por os documentos estarem na posse do Tribunal Constitucional. Logo, diz, o MP não pode imputar responsabilidade à defesa e alegar que se trata de mais um acto dilatório.
“O mais grave é que o MP promove o indeferimento ainda sem saber quais são as peças processuais”, sublinha Félix Cardoso, enfatizando que não assume razão ao MP. Aliás, acusou o MP de tentar fazer chantagem ao dizer que vai também juntar mais documentos se o Tribunal aceitar a pretensão da defesa.
O MP voltou a solicitar a palavra e disse reconhecer o esforço da defesa para a junção dos documentos. Entretanto, Vital Moeda foi mais longe e disse que a defesa deveria, no entanto, ter entendido que não agiu no momento oportuno.
Ao ouvir esse comentário, o jurista Félix Cardoso interveio e deixou claro que não iria aceitar esse tipo de juízo do MP. Foi o escopo para um debate caloroso entre ele e Vital Moeda, que só foi interrompido com a interferência da juíza Circe Neves. A magistrada afirmou que iria suspender a sessão, mas o debate continuou. Nisso brandiu o martelo e declarou a audiência suspensa por trinta minutos. O ambiente ficou tenso, mas essa tensão foi quebrada quando Vital Moeda e Félix Cardoso deram um abraço e enfatizaram que esse debate era normal.
Decorrido mais de uma hora, o julgamento não tinha sido retomado. Deste modo, este jornal ainda não sabe informar se o TRB aceitou o requerimento da defesa ou o da acusação e para quando as alegações finais ficaram agendadas.