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Governo faz mea-culpa, recua e suspende novas tarifas dos transportes marítimos 

O governo decidiu recuar na decisão de introduzir novas tarifas de transporte marítimo de carga, sobretudo na rota São Vicente-Santo Antão, e sentar à mesa com todos os players para encontrar uma solução. Reconheceu que o impacto dos aumentos é de facto brutal – em alguns casos foi superior a 329% – para se encaixar e pode ser prejudicial, inclusive para as próprias operadoras. A decisão saiu de uma reunião entre o Primeiro-ministro e os ministros que tutelam a área económica, avançou Abraão Vicente em entrevista no Jornal de Domingo da TCV. 

O Ministro do Mar começou por desmentir o seu colega das Comunidades, Jorge Santos, que afirmou a partir de Paris que houve “um erro de cálculo do quadro tarifário de transporte marítimo de carga e que o Governo iria rever os preços”, aumentando a pressão que já vinha sendo exercida pelos operadores e proprietários de carrinha que se recusaram a viajar no navio Chiquinho.

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De acordo com Abraão Vicente, não houve nenhum erro de cálculo. “Temos uma base de cálculo que tem a ver com a introdução de novas tarifas, levando em conta a cubicagem e o peso das viaturas, ou melhor, da carga em geral”, frisou, realçando que o que aconteceu é que, na linha SV-SA, as duas operadores, pelo elevado nível de concorrência, nunca aplicaram a tabela de 2006, em que se baseou na aplicação das novas taxas.  

Por conta disso, prossegue o governante, criou-se algum ruído, com algumas figuras não-oficiais a fazerem o cálculo taxativo nas redes sociais, em função da tabela publicada no Boletim Oficial, que provocaram muitas reações. Na sequência, aconteceu uma reunião entre Ulisses Correia e Silva, Olavo Correia e A. Vicente em que se decidiu, primeiro, manter as tarifas relativas aos bilhetes de passagem dos passageiros, com aumentos não superiores a 20%. “Decidimos também suspender a aplicação das tarifas de carga para uma melhor concertação e afinação com os armadores”, informa, referindo que o Governo optou fazer esta marcha-atrás apesar de reconhecer que há uma disfunção na linha SV-SA, que faz com que a aplicação da cubicagem tenha resultado em aumentos, em alguns casos superior a 329 por cento.

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Questionado sobre o motivo que levou o Governo a avançar com esta medida, se sabia a priori destes aumentos exagerados, Abraão Vicente escudou-se em alegados estudos de impacto que mostram que, em nenhum caso, os aumentos seriam superiores a 40%, partindo do principio os preços praticados antes e também de uma base de peso e cubicagem. “Não havendo esta prática, a tabela foi divulgada nas redes sociais e assumida em algum momento pelo navio Nôs Ferry e CVI, através do Chiquinho. Mas os próprios operadores têm a consciência de que o aumento é brutal e a aplicação taxativa da cubicagem na linha SV-SA pode ser prejudicial para eles. É nesta perspectiva que encontramos um consenso entre as duas operadoras, que suspenderam a aplicação destas taxas e estão de acordo com esta medida concertada com o Governo”, assegurou.

O Ministro do Mar citou ainda o presidente da Associação da Marinha Mercante, que alertou para a necessidade de se afinar a aplicação destas tarifas na linha Porto Grande-Porto Novo. Relativamente as demais linhas, diz, por aquilo que se aperceberam, não houve aumentos acima dos 40%. “Com este ruído e com este debate público chegamos à conclusão que é preciso fazer uma mexida para garantir a sustentabilidade do sector, não só dos armadores, mas também dos operadores turísticos que usam os barcos roll on, roll off para as transições ou transações comerciais entre as ilhas”, reforça.  

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Transporte de mercadorias deficitário 

Não obstante este recuo, A. Vicente sustenta que o preço aplicado nas transações e para as viagens interilhas de mercadorias é muito baixo. Faz inclusive uma comparação entre os preços praticados para o transporte de mercadorias para as localidades da Baía das Gatas, São Pedro e mesmo Lazareto com os para Santo Antão, para mostrar que este é mais barato. No entanto, diz, face ao impacto do aumento brutal, é necessário suspender a aplicação das novas tarifas para melhor compreender a métrica do funcionamento desta linha. “Por uma questão de justiça social entre as empresas, com orientação do PM, decidimos suspender a aplicação e criar uma novo plano tarifário nacional”, anunciou. 

As partes têm agora um prazo máximo de dois meses, de acordo com o ministro do Mar, para se encontrar uma solução para equilibrar a necessidade em termos de transportes marítimos interilhas com a sustentabilidade, como também garantir que os operadores que usam os barcos para fazer o transporte de mercadorias não tenham demasiados prejuízos. Entretanto, apesar de fazer mea-culpa por conta desta situação, o ministro do Mar debita alguma responsabilidade aos ruídos criados que, afirma, são parte de uma comunicação que não funcionou totalmente. Esclarece ainda que a nova tabela em nenhum momento foi aplicada. Mesmo assim, provocou ruídos. Reconhece ainda que não se deve fazer reformas estruturais em meio a ruídos e, principalmente, contra a vontade dos próprios operadores económicos. “É preciso equilíbrio e o diaáogo é a melhor solução”

Os condutores de Santo Antão, recorda-se, realizaram na última sexta-feira uma manifestação pacífica à entrada do cais do Porto Novo e negaram viajar para São Vicente no navio Chiquinho, pertencente a concessionária Cabo Verde Interilhas, por causa dos preços das passagens, que aumentaram de 5.400 para 15.200 escudos. Por causa deste “braço-de-ferro”, que prometia continuar, o navio realizou pelo menos duas viagens entre as duas ilhas vazio, o que terá contribuído para este recuo. 

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Constanca Pina

Formada em jornalismo pela Universidade Federal Fluminense (UFF-RJ). Trabalhou como jornalista no semanário A Semana de 1997 a 2016. Sócia-fundadora do Mindel Insite, desempenha as funções de Chefe de Redação e jornalista/repórter. Paralelamente, leccionou na Universidade Lusófona de Cabo Verde de 2013 a 2020, disciplinas de Jornalismo Económico, Jornalismo Investigativo e Redação Jornalística. Atualmente lecciona a disciplina de Jornalismo Comparado na Universidade de Cabo Verde (Uni-CV).

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