Foi o maior “peso pesado” de São Vicente e um dos pioneiros do fisiculturismo em Cabo Verde. Jorge Lucas Santos, mais conhecido por Jorge Paraqueda, tem 67 anos e está com os movimentos limitados. É que, por causa da diabetes, teve uma perna cortada e perdeu muita massa corporal, mas não se deixa abater. Diz ser um homem feliz e realizado por tudo o que fez na sua vida e para este desporto, que praticou, ensinou e lhe deu grandes alegrias.
Ao Mindelinsite, Jorge Paraqueda contou que começou a trabalhar muito cedo. O nome herdou do pai jogador de futebol.
Jorge Parqueda treinava com blocos de cimento. Foi nesta altura que um amigo o levou para a casa de Djô Borja, onde havia um pequeno ginásio. “Infelizmente o Djô Borja não me deixou entrar. Disse ao meu amigo que este não podia levar estranhos para a sua casa. Reconheço que estava no seu direito. Dias depois, Djô Borja procurou o meu amigo para pedir informações sobre a minha pessoa e a minha família e autorizou que eu fosse treinar no ginásio em sua casa, que ficava no terraço”, relata.
As condições eram precárias, mas Paraqueda não podia estar mais satisfeito. “Fui um dos primeiros alunos do Djô Borja. Depois começaram a aparecer mais gente e acabei por ser nomeado instrutor. Fui também convidado para dar aulas de aeróbica no ginásio, função que desempenhei durante 25 anos. Dava aulas essencialmente para pessoas da ‘alta sociedade’ de São Vicente, pessoas de morada”.
Do terraço da casa de Djô Borja, o então denominado Ginásio Progresso mudou para o recinto ou então Alfândega Velha, onde permaneceu até 1989. De lá, foi transferido para o Quartel Militar. “Nesse meio tempo, como fisiculturista, ganhei muitos troféus, tanto em S. Vicente como em Santiago, ilha em que na primeira fez que nos deslocamos para participar numa prova o nosso ginásio ganhou todos os prémios em disputa. Íamos para todas as ilhas fazer demonstrações. Éramos muito fortes. No meu caso, pesava 115 quilos, era o maior peso pesado de São Vicente”, revela, com orgulho.
Sem um trabalho oficial, coube ao seu treinador Djô Borja selecionar este problema. “Fomos fazer um espetáculo no então Campo Novo, actual Adérito Sena. O então Primeiro-ministro, Pedro Pires, estava presente, e o meu treinador pediu-me para ir entregar-lhe uma camisa do Ginásio Progresso em uma bandeja. Djô Borja pediu-lhe então se me podia arranjar um emprego. Depois de três meses fui contratado pelo BCA como segurança. Estávamos no ano de 1990 e tinha 35 anos”, declara.
Jorge Paraqueda conta que trabalhava, mas continuava a treinar. De segurança evoluiu para condutor. O trabalho aumentou e começou a dificultar-lhe os treinos. Mesmo assim, este conta que tentou conciliar, até que aos 53 anos decidiu parar. “Ainda nesta altura, conseguia levantar 400 quilos nas pernas e fazia agachamentos com 165 quilos nas costas. Éramos poucos em S. Vicente que conseguia essa proeza.”
Depois de 30 anos no BCA, Jorge Paraqueda foi para reforma, em 2019. Infelizmente, diz, logo de seguida começaram a surgir alguns problemas de saúde. Foi diagnosticado com diabetes e perdeu uma perna. “Tenho a doença controlada, mas infelizmente às vezes tenho algumas crises fortes. Há dias, por exemplo, a minha açúcar baixou para 50, o que é muito perigoso. Mas não desanimo. Sou uma pessoa que viveu intensamente e foi muito feliz. Ensinei o culturismo para muita gente.”
O mais importante ainda, diz, é que esta sua contribuição para o culturismo é reconhecida. Aliás, diz, por ocasião da realização da Taça de Cabo Verde de Fisiculturismo, que homenageou Djô Borja, foi convidado para estar presente. “Foram à minha casa para me convidar. Fiquei muito satisfeito com este reconhecimento e mais ainda porque prometeram distinguir-me numa próxima edição. É de louvar porque fiz muito por este desporto. Se hoje o culturismo está em alta é preciso nunca esquecer como começou. Trabalhamos em máquinas feitas em São Vicente pelo Sr. Manuel da Transcor e tínhamos poucos pesos. Tínhamos de esperar um colega completar uma série para disponibilizar a máquina para outro.”
Hoje o cenário é muito diferente. Segundo Paraqueda, os ginásios proliferam por São Vicente e as condições de trabalho mudaram para melhor. Mesmo assim, concluiu, é feliz por ver toda esta evolução e por saber que as pessoas não esqueceram tudo o que fez pelo culturismo.