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Aldevino Andrade condena manifestação em solidariedade a A. Oliveira e defende que jurista deve ser responsabilizado pela “fuga” de Teixeira

Aldevino Andrade, irmão de Autolindo Andrade, morto na sequência de uma desavença com o emigrante Arlindo Teixeira em Santo Antão, condena, nesta entrevista, a realização de uma manifestação de solidariedade a Amadeu Oliveira, alvo de julgamento pelo Tribunal da Relação de Barlavento. Para ele, Oliveira deve ser condenado pela “fuga” de Arlindo Teixeira para França, quando, diz, estava em prisão domiciliária. Aldevino Andrade, que viu o seu irmão morrer praticamente nos seus braços, afirma que Teixeira agiu com intenção de matar e que Oliveira não tinha o direito de levar o emigrante para França para não cumprir a sua sentença. Entende, deste modo, que o jurista perdeu toda a moral para exigir justiça em Cabo Verde, já que resolveu fazer justiça com as próprias mãos. Afirma que a alma do seu irmão não irá descansar enquanto este caso não for convenientemente encerrado. Isto signfica, para ele, que Teixeira deve regressar a Cabo Verde para acertar as contas com a justiça.

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Mindel Insite – Familiares de Autolindo Andrade emitiram um comunicado a condenar uma manifestação de solidariedade para com Amadeu Oliveira marcada para hoje em Santo Antão. A partir deste ponto, enquanto irmão de Autolindo Andrade, o que tem a dizer sobre o incidente que levou à sua morte, como vê o trabalho da imprensa e o julgamento de Amadeu Oliveira, que está em curso em S. Vicente?

Aldevino Flor Andrade – Desde o início deste caso nunca tivemos o apoio da comunicação social e de ninguém, por assim dizer. As pessoas não procuraram saber a nossa versão do caso. Preferiram idolatrar Amadeu, que agora é visto como se fosse um Cabral.

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Tivemos conhecimento dessa manifestação na Ribeira Grande de solidariedade a A. Oliveira e pergunto aos organizadores se fariam a mesma coisa se fosse um irmão deles que Arlindo Teixeira tivesse assassinado na presença do pai, da mãe e dos irmãos. Gostaria de saber se iriam convocar uma manifestação para apoiar Arlindo Teixeira.

MI – Para você, essa manifestação de solidariedade a Amadeu é o mesmo que declarar apoio a Arlindo Teixeira?

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AA – Exacto, afinal qual a justiça que Amadeu quer se ele retira de Cabo Verde alguém que estava em prisão domiciliária e depois grava vídeos a gabar-se do que fez? E nesse vídeo, que está na internet, ele mesmo fala de todo o expediente que fez e mostra Arlindo e seus familiares em festa na França.

MI – Considera que Amadeu Oliveira cometeu um crime ao retirar Arlindo Teixeira de Cabo Verde?

AA – Sem dúvida, e ninguém está acima da lei. Ao fazer isso, resta-lhe arcar com as consequências. Ele deveria deixar Arlindo cumprir a sua pena.

MI – Neste caso, defende que Amadeu deve ser condenado?

AA – Sim, e tenho a esperança de ouvir essa sentença. E mais: espero que Arlindo Teixeira regresse a Cabo Verde para cumprir o resto da sua pena. A alma do meu irmão não irá descansar enquanto este processo não for concluído. Se a justiça considerasse que Arlindo poderia ficar fora, mesmo não querendo, teríamos que aceitar isso. Mas, agora nem isso podemos fazer porque Amadeu tirou-nos o poder de exigir justiça para o meu irmão. Logo, Amadeu não tem moral para gritar aos quatro ventos que quer justiça quando ele mesmo fez justiça com as próprias mãos.

MI – As mais variadas manifestações de apoio a Amadeu Oliveira podem ser uma forma de pressão sobre a justiça?

AA – Todo este holofote apontado para Amadeu é uma campanha para pressionar a justiça. Mas peço aos juízes para não se sentirem pressionados porque ninguém está acima da lei. Que a justiça seja feita, mas sem se deixar influenciar pela sociedade.

Testemunhar o homicídio do irmão

Aldevino Andrade

MI – Chegou a testemunhar o que aconteceu entre Arlindo Teixeira e o teu irmão?

AA – Sim, fui uma das testemunhas-chaves no julgamento. Não vi tudo desde o início, mas cheguei ao local menos de cinco minutos depois que começaram a confusão e fiquei até o desfecho.

MI – O que aconteceu nesse dia em Caibros?

AA – Nesse dia, eu, o meu irmão e um primo estávamos a trabalhar no campo. No final do dia, o meu irmão disse que ia ver o filho, que fez ano nessa semana. Eu também tinha compromissos com a igreja e, no regresso para casa, fui ver jogo no centro de multimédia da minha zona. Nisso, um amigo veio ter comigo e disse-me para ir ver o meu irmão porque ele chegou com duas pedras no estabelecimento Zeca, onde Arlindo estava. Ele disse-me para ir depressa porque o meu irmão tinha arremessado pedras na direção de Arlindo, o meu pai e outras pessoas.

Fui o mais rápido possível para o local, que ficava a uns cinquenta metros do ponto onde eu me encontrava. Quando cheguei, deparei com o meu irmão e Arlindo mandando “bocas” um ao outro. Estavam a discutir e começaram a chegar outras pessoas. Nesse instante, o meu irmão foi ter com Arlindo e pediu-lhe desculpa por ter arremessado pedras em direção ao grupo, mas que não tinha a intenção de atingir nenhum deles, e que os dois eram amigos. E no final ele usou a expressão “Jah love!” Nisso, Arlindo ripostou “Jah love de m… Mato-te e juro que amanhã não verás o Sol nascer!”

Ao ouvir isso, o meu irmão ficou chateado e o clima começou a aquecer. O meu irmão apanhou então um bloco que estava a uns 30 metros e foi aconselhado pelos presentes para parar com isso e que fosse para casa. Fui falar com ele e ele acabou por espancar o bloco no chão. Entretanto, ele decidiu ir ter com Arlindo, que estava de pé. Fui logo atrás do meu irmão e o abracei.

MI – Ele estava armado?

AA – Ele não estava armado e durante toda a confusão não chegaram a agredir um ao outro. Quando vi que o meu estava a ir em direção a Arlindo, abracei-o e dei-lhe uma volta. Nesse momento, as pessoas que estavam lá – eram mais de cinquenta – começaram a gritar “sangue”. Comecei a sentir algo no meu corpo e era sangue a escorrer-me pelos braços. Dei uns oito passos segurando o seu corpo, deitei-o no chão e ele faleceu logo ali.

MI – A facada atingiu qual parte do corpo?

AA – A zona do coração.

MI – EChegou a ver Arlindo Teixeira com alguma faca na mão?

AA – Só vi que ele tinha uma faca depois de atingir o meu irmão.

MI – Acha possível que Arlindo tenha reagido dessa forma por pensar que o teu irmão ia agredi-lo? Afinal das contas estavam a discutir.

AA – Não acho isso porque o meu irmão não estava armado. Eu fui atrás dele porque queria leva-lo para casa. No entanto, Amadeu alega nos vídeos que o meu irmão já tinha agredido Arlindo, que chegou a ferir-lhe no joelho, no braço… Mas isto não é verdade. Arlindo chegou a Cabo Verde com um braço no gesso, todos viram isso. E nesse dia ele e o meu irmão não entraram em confronto.

MI – No dia da confusão Arlindo estava com o braço no gesso?

AA – Não, ele já havia tirado o gesso.

MI – Qual seria a intenção do teu irmão ao ir ter com Arlindo?

AA – Só ele pode responder a esta pergunta.

MI – Com base na sua atitude, acha que ele tinha a intenção de ir brigar com Arlindo?

AA – Não acho. Se um homem vai brigar com outro ele tende a levantar os braços, fechar os punhos… Eu estava a acompanhar os passos do meu irmão. Quando ele chegou perto de Arlindo, eu agarrei-o pelos ombros e foi atingido. Arlindo sabia o que estava a fazer e sabia onde podia ferir para matar.

“Arlindo agiu com intenção de matar”

MI – Ele faleceu no local?

AA – Quando deitei o meu irmão no chão e chegaram pessoas – inclusive familiares de Arlindo que trouxeram panos para estancar o sangue – o meu irmão começou a espumar pela boca. Vi que ele morreu ali mesmo. Entretanto, a minha mãe desmaiou, eu próprio acabei por desmaiar. Acordei a caminho do hospital num hiace juntamente com o meu irmão. Coloquei a mão no seu corpo e senti logo que ele estava morto.

MI – Porque diz que Arlindo agiu com intenção de matar?

AA – Se Arlindo quisesse apenas defender-se de alguma tentativa de agressão do meu irmão ele poderia agredi-lo na perna ou no braço, nunca no peito. Mas ele sabia o que estava a fazer, queria matar o meu irmão. Não há nenhuma justiça que vai dizer-me que Arlindo agiu em legitima defesa, quando houve 32 testemunhas no julgamento, 28 foram a favor do meu irmão e 4 a favor de Arlindo.

MI – O teu irmão e Arlindo Teixeira já se conheciam?

AA – Eram relativamente amigos. Chegaram a andar e a beber juntos, coisas do tipo.

MI – Quando estavam a discutir, algum deles apresentava sinais de estar bêbado?

AA – Não sei dizer isso. Quando estávamos a trabalhar, o meu irmão e o meu primo beberam meia garrafa de grogue. Como se sabe, em Santo Antão costuma-se tomar aquele groguim durante a labora. E o meu primo foi também testemunha-chave porque eles estavam juntos e ele estava no local na altura.

MI – Acha que meia garrafa de grogue era suficiente para deixar o teu irmão bêbado?

AA – Não acho.

“Amadeu usou todos os meios possíveis para viajar com Arlindo”

MI – Como a tua família reagiu quando viram a notícia que Amadeu levou Arlindo para França?

AA – Ficamos indignados e fazemos de tudo para os meus pais não ficarem a par das informações que circulam sobre o caso porque ainda não superaram a perda. Eu e os meus irmãos ficamos revoltados. Fomos contactados pelo jornal A Nação e a página Adilson Time e manifestei o meu espanto sobre a saída de Arlindo Teixeira de Cabo Verde. Ainda hoje estava a ver o vídeo onde Amadeu diz que Arlindo foi metido na sua residência e sequer podia sair para comprar um iogurte ou uma fruta. Entretanto, diz que Arlindo entrou em depressão e que andava a beber muito. Pergunto como Arlindo não podia sair para comprar uma fruta, mas podia ter acesso a tanta bebida? Há incongruência nisso.

MI – Tem acompanhado o desenrolar do julgamento de Amadeu Oliveira?

AA – Tentamos acompanhar dentro do possível.

MI – Amadeu Oliveira está a ser acusado de usar a sua influência como deputado para “fugir” com Arlindo Teixeira. Acha que ele fez isso ou agiu apenas na qualidade de advogado?

AA – Para mim, Amadeu usou todos os meios possíveis para viajar com Arlindo para depois vir gabar-se nas redes sociais. Só através da sua profissão não seria possível. Como iria passar na fronteira da forma como levou Arlindo, como se fosse uma pessoa que não tinha nenhuma dívida para com a justiça. E Amadeu diz que teve ajuda de policiais, pessoal no aeroporto e fuzileiros navais.

MI – No julgamento ele negou que tenha tido qualquer ajuda para colocar o seu plano em ação.

AA – Se ele negar recomendo a justiça a entrar na minha pagina no Facebook ou no Adilson Time, que entrevistou Amadeu, e ele confessa quem o ajudou. Devem investigar porque a morte do meu irmão não pode ser em vão. Ele ajudou Arlindo a fugir à justiça, então cabe-lhe agora responder pelo seu acto.

MI – Defende, então, que Amadeu Oliveira deve ser condenado?

AA – Sem dúvida, e tenho a esperança de ouvir esta notícia.

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Kimze Brito

Jornalista com 30 anos de carreira profissional, fez a sua formação básica na Agência Cabopress (antecessora da Inforpress) e começou efectivamente a trabalhar em Jornalismo no quinzenário Notícias. Foi assessor de imprensa da ex-CTT e da Enapor, integrou a redação do semanário A Semana e concluiu o Curso Superior de Jornalismo na UniCV. Sócio fundador do Mindel Insite, desempenha o cargo de director deste jornal digital desde o seu lançamento. Membro da Associação dos Fotógrafos Cabo-verdianos, leciona cursos de iniciação à fotografia digital e foi professor na UniCV em Laboratório de Fotografia e Fotojornalismo.

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