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Feliciano Reis, médico cabo-verdiano: “Diminuir o número de mortos em CV deve ser o foco no contexto actual e sem muito alarmismo”

O médico cabo-verdiano Feliciano Reis, que trabalha em Portugal, considera importante Cabo Verde lutar neste momento para conseguir o “menor número de mortos possível” por Covid-19. Para ele, o alarmismo social é desnecessário perante a situação actual. Reis aconselha colocar em quarentena “sobreactiva” as pessoas contaminadas na Boa Vista para serem seguidas constantemente pelos médicos. Este profissional disse estar “esperançoso e optimista” no aparecimento de uma vacina contra a doença ainda antes do final deste ano ou início de 2021. Chamou ainda a atenção para o facto de o novo coronavírus ter “maior virulência” no inverno, mas garantiu que não vai desaparecer com o calor do verão.

João A. do Rosário

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Feliciano Reis considerou nesta entrevista exclusiva ao Mindelinsite que os suspeitos, agora positivos, na ilha da Boa Vista, deveriam ser colocados desde o início em quarentena domiciliária sob a vigilância “activa e sobreactiva” dos médicos, e não como foram instalados inicialmente no hotel. “Como nós fazemos aqui, os suspeitos são colocados em casa e nós vamos supervisionando com telefonemas para sabermos do estado de saúde dos mesmos” fez saber o médico, realçando que as terapias aplicadas às pessoas infectadas vão acontecendo em função dos quadros clínicos que apresentam. Referiu ainda que os doentes infectados vão sendo submetidos a testes e só têm alta médica quando o resultados dos mesmos forem negativos por duas vezes. Quem apresenta sintomas mais grave é acompanhado em internamento.

Reis congratulou-se com a medida da circunscrição da Boa Vista e alerta para a necessidade de uma vigilância mais constante aos doentes infectados, apesar de reconhecer a escassez de recursos em Cabo Verde. Por outro lado disse que não há motivos para “muitos alarmismos” pois considera não ser muito grave o número de pessoas infectadas até agora. Este médico fez saber que se está perante uma doença vírica que irá contagiar várias pessoas, criando assim anticorpos. Deste modo, enfatiza que a vacina vai ser destinada às pessoas que não têm anticorpos, como acontece no caso de uma gripe normal.

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Referindo-se ao andamento dos testes e às fases de experimentação do processo da criação de uma vacina, manifestou esperança de que a mesma poderá surgir no final deste ano ou início do próximo. Reis acrescenta que o conhecimento já adquirido acerca do vírus e do seu desencriptamento, assim como o trabalho de vários países com esse objectivo, revela-se da maior importância para o rápido aparecimento de uma vacina. Este médico cabo-verdiano sustenta a sua tese nos procedimentos que, segundo ele, a indústria farmacêutica está a ter nos Estados Unidos, na China e nalguns países europeus para encurtar as fases de criação, certificação e comercialização de uma vacina.

O nosso entrevistado realça a importância dos anticorpos e a imunidade própria, daí o impacto da vacina que, em termos normais, só se consegue desenvolver num período que medeia entre 3 a 5 anos. A sazonalidade é também uma questão bastante relevante para este vírus e, segundo deu a perceber, o novo coronavírus desenvolve-se tanto no inverno como no verão.  “Acontece que é um vírus que tem uma maior virulência, ou infecciosidade, no inverno e por isso é necessário ter muito cuidado com o novo ciclo temporal”, alerta a citada fonte, para quem não se deve negligenciar os cuidados necessários para que não haja o recrudescer do vírus. 

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Optimista em relação a Cabo Verde 

Apesar dos últimos acontecimentos na Boa Vista, este profissional da saúde mostra-se “optimista” em relação ao evoluir da situação do Covid-19 em Cabo Verde, tendo-se congratulado com as medidas para se conter a expansão da doença. “Tenho seguido muito de perto o que se tem passado no meu país e, em relação às medidas tomadas pelas autoridades, considero que seguiram muito bem as directrizes emanadas pela Organização Mundial da Saúde”, disse o médico, que aplaudiu o encerramento dos aeroportos e a declaração do Estado de Emergência. Este espera que o país consiga manter a pandemia a níveis muito baixos. Alerta, no entanto, para não se descuidar em relação à sazonalidade.

Este médico garantiu que está tudo bem no seio da comunidade cabo-verdiana em Portugal e que não tem conhecimento de ter havido algum caso suspeito ou de infeção pelo Covid-19. “Está tudo bem, não tem havido problemas e as pessoas têm seguido as normas. Até agora não tenho conhecimento de alguma pessoa com Covid-19 ou com suspeita na nossa comunidade”, fez saber Feliciano Reis, médico no Hospital Garcia de Orta do Concelho de Almada onde reside um número considerável de cabo-verdianos. A título pessoal, Feliciano Reis garantiu que dentro das suas possibilidades estaria sempre pronto para ajudar Cabo Verde, caso as autoridades lhe formulassem um pedido nesse sentido.

Feliciano Reis, referiu ainda alguns resultados encorajadores obtidos nalguns países com terapêuticas onde se tem usado o hidrocloroquina ou retroviral, embora não haja ainda evidência científica. Esses resultados, diz, foram obtidos junto de pessoas fora do grupo de risco sem outras enfermidades associadas, que conseguem criar a sua própria imunidade, pelo que alcançam uma recuperação mais rápida. Reis explicou ainda que é isto que está a acontecer em cerca de 80% dos doentes, o que é bastante importante.

Reis sublinha que os outros grupos onde se verifica alguma comorbilidade são doentes renais, diabéticos, hipertensos, com doença cardiovascular, pacientes oncológicos, que considera ser um segmento de risco e por isso a necessidade de internamento. Sublinhou que, devido ao número de óbitos verificado, é um segmento de prognóstico muito reservado. Sabe-se também que alguns jovens já faleceram com esta doença.

Degradante e triste lidar com a morte

Questionado sobre o seu estado de espírito por estar a lidar com uma doença contagiosa e sem tratamento, Feliciano Reis salientou existir sempre o problema físico e psicológico, porque, segundo ele, é um bocado triste e degradante lidar com situações de morte. Relembra que há algum receio, citando o facto de muitos profissionais de saúde já terem sido infectados e deu conta mesmo do falecimento de um amigo médico de 65 anos na semana passada pelo coronavírus.

“Quanto à minha família é claro que tenho algum receio por ela, mas devo adiantar que tomo todas as precauções possíveis para a proteger, começando pela minha própria protecção no local de trabalho” concluiu o conceituado médico cabo-verdiano.

A Covid-19 provoca uma infecção respiratória baixa e, segundo o médico, 80 por cento dos casos é uma doença benigna, sem gravidade. Reis acrescenta que 20% dos casos apresenta alguma gravidade e os doentes são internados. Destes, 5% requer mais cuidados e há necessidade de utilização de ventiladores.

Como já foi referido, os sinais e sintomas começam com uma tosse seca e falta de ar. Quando surgem estes sinais, alerta, é preciso o máximo cuidado e chamar os serviços de saúde através do telefone do Sistema de Saúde, sem precisar sair de casa. Como reitera, a transmissão ocorre pelas vias respiratórias através de gotículas expelidas nos espirros e tosse, mas também por meio das diversas superfícies onde as pessoas colocam as mãos. O contágio acontece se, por descuido, as pessoas levaram as mãos à cara. 

Feliciano Reis explica ainda que o diagnóstico começa através de um historial clínico – febre, tosse e/ou outras situações mais graves -, como as de uma pneumonia. Este sublinha que esta pneumonia é “atípica, pleural, bilateral”, e que nesta fase se faz o diagnóstico com um simples teste da nasofaringe. “Nesta fase até é muito difícil fazer o diagnóstico porque o vírus se aloja preferencialmente nas vias respiratória baixas, ou seja nos alvéolos pulmonares, e, quando fazemos o teste com a zaragatoa, não conseguimos apanhar o vírus”.

Feliciano Reis considerou ainda muito importante o diágnostico e o facto de se ter em atenção que os doentes com pneumonia devem ser submetidos a uma tomografia axial computorizada, para se confirmar uma situação de pneumonia floculada, bilateral com uma certa gravidade.

Percurso e vivência

Feliciano José Livramento dos Reis é licenciado em Medicina pela Faculdade de Medicina de Lisboa, Generalista, Pós-graduação em Medicina Desportiva. Médico responsável de Controlo anti-dopagem. Exerce Medicina geral e familiar na Unidade de Saúde de Cuidados Primários em Almada, Laranjeiro e é prestador de serviço no Hospital Garcia da Orta na área de cirurgia geral. 

Apesar de viver em Portugal há muitos anos, tem uma ligação muito forte à terra natal. Por essa razão Cabo Verde é o seu destino de férias pelo menos duas vezes por ano. Nas horas vagas, o CRETCHEU, Associação cabo-verdiana de Almada, é o espaço simbólico onde recorda com vivacidade os costumes e as tradições da terra, sempre com uma boa conversa entre amigos, momentos esses temperados com a gastronomia e a música das ilhas.

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Kimze Brito

Jornalista com 30 anos de carreira profissional, fez a sua formação básica na Agência Cabopress (antecessora da Inforpress) e começou efectivamente a trabalhar em Jornalismo no quinzenário Notícias. Foi assessor de imprensa da ex-CTT e da Enapor, integrou a redação do semanário A Semana e concluiu o Curso Superior de Jornalismo na UniCV. Sócio fundador do Mindel Insite, desempenha o cargo de director deste jornal digital desde o seu lançamento. Membro da Associação dos Fotógrafos Cabo-verdianos, leciona cursos de iniciação à fotografia digital e foi professor na UniCV em Laboratório de Fotografia e Fotojornalismo.

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3 Comentários

  1. Amigo de infância e de muitas mufnezas, o Dr. Feliciano Reis (Fant) para os amigos é um Homem de muito bom trato e de uma grande serenidade. Gostei de o ler e de o saber atento com Cabo Verde. Sem duvidas, um grande ativo para o nosso país. Fica bem Amigo, cuida-te!! Enorme e rijo abraço crioulo!!!

  2. O Feliciano é uma excelente pessoa, um bom amigo. Foi aluno meu no Liceu, muito bom aluno, brincalhão, mas responsável com os seus estudos e tratamento e respeito pelos seus professores. Desejo-lhe os melhores sucessos e muita saúde na sua carreira de médico.

    Um grande abraço!

  3. Na encruzilhada da Vida, após muitos anos depois do Liceu, o meu crioul iria despertar a atenção do Feliciano q coincidentalmente , tinha parado no mesmo “baloi d’ Tuda” , venda d rua em Times Square, nessa altura.
    Após exchange d Morabeza Mindelense, formais informações e Albino morada. Mais d 15 anos já passaram.
    Hoje do mesmo zipe code d onde tinha partido d trem, leio e Felecito o Feleciano pela Informal informações o Amor a Profissão e a CaboVerde
    Vesstra

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