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O Janeiro da República

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Tomilson Neves

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Em Janeiro, celebra-se a Semana da República, que vai de 13 a 20 de Janeiro, uma iniciativa bastante pertinente da Presidência da República, que deveria ser um instrumento para promover e valorizar a história política nacional. A Semana da República, que deveria ser um momento de reflexão e celebração da história política e cultural do país, infelizmente se transformou numa disputa partidária.

De um lado, o Movimento para a Democracia (MpD) defende o dia 13 de Janeiro como o “Dia da Liberdade e da Democracia”, enfatizando o significado deste dia na luta pela liberdade e pela democracia. Do outro, o Partido Africano da Independência de Cabo Verde (PAICV) associa o dia 20 de Janeiro diretamente à figura de Amílcar Cabral, visto como o herói da independência nacional. No entanto, é importante ressaltar que o dia 20 também é o Dia dos Heróis Nacionais e do Nacionalismo, uma data que vai além da figura de Cabral, representando toda a luta pela independência e pela construção de um Cabo Verde soberano.

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O problema é que, ao enfatizar apenas a defesa partidária dessas datas, muitas vezes os cabo-verdianos esquecem o verdadeiro significado histórico e o valor simbólico que ambas as datas têm para a nossa identidade coletiva. As divisões partidárias acabam obscurecendo o que deveria ser um momento de união e reflexão sobre a nossa história. Essa falta de entendimento e valorização das datas leva a uma alienação histórica, que prejudica a coesão e a identidade nacional.

Presumo que o antigo Presidente da República, Jorge Carlos Fonseca, não deva estar satisfeito com o rumo que a sua criação, a Semana da República, tomou. Essa transformação de um evento histórico num palco de disputas partidárias não apenas diminui a importância das datas, mas também cria uma desconexão com o povo. A realidade é que grande parte da população cabo-verdiana não compreende o valor profundo dessas datas nem o seu verdadeiro significado. E isso não é apenas triste, é alarmante.

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Quando as divisões políticas e partidárias prevalecem sobre a compreensão histórica, o país perde uma oportunidade de construir uma memória coletiva que una as gerações em torno de valores comuns. Em vez disso, a nova geração cresce com uma visão fragmentada da nossa história, o que pode enfraquecer a coesão social e afetar o desenvolvimento de uma identidade nacional sólida e integrada. O que a maior parte dos cabo-verdianos sabe sobre essas datas é que são dois feriados nacionais e que, em Janeiro, a função pública (e não só) tem a benção de mais dois dias de descanso. Enquanto isso, os dois partidos do arco do poder, o MpD e o PAICV, preparam, todos os anos, os seus melhores argumentos para defenderem suas ideais e posicionamentos.

Cabo Verde não é terra para amadores, e isso se comprovou mais uma vez em 2024, um ano atípico, repleto de acontecimentos realmente ímpares, mas que, de certa forma, não surpreenderam ninguém. Os exemplos são muitos, e, entre eles, há alguns que definitivamente não são aconselháveis a seguir. Passo a citá-los: o caso envolvendo a Primeira-Dama e o Presidente da República, onde, inclusive, o PR chegou a devolver dinheiro aos cofres do Estado; os confrontos entre o Presidente da República e o Governo; e, para finalizar, as eleições autárquicas aonde vimos que em Cabo Verde se perde e se ganha eleições por um único voto, e além disso o PAICV, após muitos anos, voltou a sentir o sabor da vitória.

Iniciamos o ano de 2025 com o encontro da Direção Nacional do MpD, onde pouco se sabe, além do fato de que o partido tem um novo Secretário-Geral, haverá alterações no Governo e que o UCS é o candidato do partido para as legislativas. Após essas decisões, a surpresa veio da parte da Câmara Municipal da Praia (CMP), quando alguém fez das suas. Desta vez, um comunicado da SEPAMP deliberou que, para a autarquia da capital do país, apenas o dia 20 de Janeiro seria considerado feriado, ignorando o dia 13. Esse comunicado gerou críticas do MpD, particularmente na sessão solene do dia 13 de Janeiro. Caso para dizer: este país não tem emenda.

As notícias desde o ano transato estavam centradas no PCFR dos docentes, um diploma que parecia inalcançável, mas, ao que parece, alguns alunos da casa parlamentar são “resilientes” e o país tem um novo quadro clínico para os docentes. As opiniões se dividem, mas a realidade é que os professores vão ganhar mais.

Enquanto o PAICV se prepara para ir às internas a todo vapor, com vários candidatos, divisão de opiniões, trocas de farpas, jogadas políticas e uma luta desenfreada pelo poder, UCS esteve com a sua delegação em Portugal para a VII Cimeira entre os dois países. A cimeira foi classificada como histórica pelo PM português Luís Montenegro. Foram acertados trinta acordos, dentre os quais se destacam quatro: a linha de crédito de cem milhões de euros, quarenta e dois milhões e meio de euros para as ações climáticas, economia azul, turismo e energias verdes, além das formações profissionais com os centros de excelência, um pacote de seis milhões de euros, e, para terminar, as evacuações para os transplantes renais.

Para fechar o Janeiro da República, o ministro do Turismo e Transporte, Carlos Santos, anunciou o seu pedido de demissão ao governo desde a semana anterior ao dia 30 pelo fato de ter sido constituído arguido numa investigação ligada com suspeitas de lavagem de capitais. Declarou de antemão a sua inocência e disse que vai defender o seu bom nome. Ao menos demostrou bom senso. Alguém neste Janeiro da República parece não estar agarrado ao poder a todo o custo. Esperemos para o futuro da novela e pelo próximo debate na casa parlamentar para ver e ouvir “mais do mesmo” o MpD que se prepare.

O país necessita que os Janeiros voltem ao normal, que as instituições sejam preservadas e que o foco esteja exclusivamente no desenvolvimento. Isso deve ser feito com urgência e com o rigor pragmático de quem já deveria saber que o país perdeu muito tempo, e que a estrada para o desenvolvimento é estreita. Com os poucos recursos disponíveis, não há margem para erros. De outro modo, não chegaremos lá.

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Kimze Brito

Jornalista com 30 anos de carreira profissional, fez a sua formação básica na Agência Cabopress (antecessora da Inforpress) e começou efectivamente a trabalhar em Jornalismo no quinzenário Notícias. Foi assessor de imprensa da ex-CTT e da Enapor, integrou a redação do semanário A Semana e concluiu o Curso Superior de Jornalismo na UniCV. Sócio fundador do Mindel Insite, desempenha o cargo de director deste jornal digital desde o seu lançamento. Membro da Associação dos Fotógrafos Cabo-verdianos, leciona cursos de iniciação à fotografia digital e foi professor na UniCV em Laboratório de Fotografia e Fotojornalismo.

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