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Operários da Atunlo denunciam trabalho em baixas temperaturas e com mãos em tinas de água e gelo

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Trabalhadores da Atunlo Cabo Verde procuraram o Mindelinsite para denunciar as condições de trabalho que consideram não ser as mais adequadas nessa empresa de conserva de pescado. Dizem que estão a trabalhar em temperaturas muito baixas e com as mãos em tinas com água e gelo. E já começam a sentir os efeitos: febre, perda de sensibilidade nas mãos, um coro de tosse durante o período laboral, mãos roxas e enrugadas, o que levou alguns destes funcionários a procurar os sindicatos para denunciar a situação.

Tanto o Sindicato da Indústria do Comércio e Serviços (SICS), como o Sindicato da Indústria, Agricultura, Comércio e Serviço Afins (Siacsa) confirmam ter recebido queixas de seus associados. O presidente desta última organização já visitou inclusivamente esse serviço para se inteirar da veracidade das queixas. Gilberto Lima diz que a empresa admite a existência do problema e assegurou que vai procurar a Inspecção-Geral do Trabalho para procurar as melhores práticas, sob pena de encerrar esta linha de produção.  

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O problema, conta uma das nossas fontes que trabalha há mais de dois anos na empresa, começou na segunda-feira da semana passada. Esta revela que antes trabalhavam com uma outra chefia que sabia manejar os produtos, pelo que não precisavam baixar a temperatura e nem colocar gelo na água para evitar a deterioração dos mariscos. “O anterior chefe pediu demissão porque auferia um salário muito baixo. A nossa actual chefia não entende deste serviço e, por isso, já houve perdas importantes. As lulas ficam vermelhas e são descartadas, com prejuízo para a empresa. Mas, como sempre, a corda arrebenta-se do lado do mais fraco e, no caso, os trabalhadores foram responsabilizados. Reduziram então drasticamente a temperatura e passaram a colocar blocos de gelo com muita frequência dentro das tinas para evitar que o produto se deteriore.”

O problema, prosseguem as nossas fontes, é que utilizam apenas luvas de pano ou latex para fazer este trabalho. Por causa disso, no término dos turnos, todos estão com mãos roxas e enrugadas. “Perdemos completamente a sensibilidade nas mãos. Elas ficam enrugadas, roxas e com manchas. Somos mais de cem funcionários nesta linha de produção e ninguém pode recusar trabalhar, sob pena de receber uma advertência ou ser imediatamente despedido. Aliás, já aconteceu com alguns colegas. Recusaram trabalhar e a chefia passou-lhes uma advertência e sofreram processos disciplinares. Alguns já foram mandados para casa”, desabada uma das nossas fontes.

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Diante das queixas dos trabalhadores, segundo uma outra fonte, a empresa distribuiu agasalhos, designadamente casacos e calças, mas dizem que são insuficientes para combater o frio a que estão expostos.  “O frio é muito forte. Alguns trabalhadores sentem febre e hipotermia. Mas não podem parar de trabalhar. Alguns colegas procuraram os sindicatos e fomos aconselhados a unirmos, antes de recusar a trabalhar para evitar penalizações. A questão é que neste sector a maior parte dos trabalhadores tem contratos precários e nunca vão se juntar com os com contratos por tempo indeterminado para protestar.”

SICS e SIACSA confirmam denúncias

Tanto o SICS como o SIACSA confirmam que receberam queixas de funcionários da Atunlo sobre as condições de trabalho. Virtolino Castro diz que agendou de imediato um encontro com a direcção desta empresa para abordar a questão. Já Gilberto Lima, que diz ter tomado conhecimento destes factos Sábado passado durante uma reunião com os trabalhadores, amanheceu na segunda-feira à porta da empresa. Este admite que o ambiente onde os funcionários laboram é frio e que usam apenas uma luva pequena, que não oferece grande protecção para poderem manipular as lulas em grandes recipientes com água e gelo.

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“Os trabalhadores têm de limpar as lulas com as mãos por isso usam luvas de latex para facilitar o trabalho. A empresa alega que têm luvas de diversos tamanhos e modelos, mas são impraticáveis para fazer este trabalho. Também não pode alterar as condições porque os produtos estragam, inclusive já perdeu um contentor de lulas que custa uma fortuna. Aproveitei para alertá-los que, se não encontrarem uma solução, todos os trabalhadores estarão doentes.”

Para tentar minimizar os problemas, segundo Gilberto Lima, a empresa promete experimentar colocar os funcionários para trabalhar em turnos menores para não ficarem longos períodos sob baixas temperaturas e com as mãos no gelo. “A própria direcção da Atunlo pediu-nos para acionar a Inspecção-Geral do Trabalho para ver as melhores práticas que podem ser utilizadas. É que, se formos exigir luvas, deixa de ter produção. E, se fecharem esta linha de produção, que tem mais de 100 trabalhadores, estes vão ser enviados para casa”, analisa Lima, que se fez acompanhar nesta visita a Atunlo do jurista do SIACSA.

A IGT foi surpreendida pelo Mindelinsite com as informações sobre a Atunlo Cabo Verde. Bruno Ferreira garante que não foi contacto nem pelos trabalhadores, nem pelos sindicatos. Ferreira diz que o seu serviço faz visitas periódicas às empresas de São Vicente – pelos menos duas vezes por ano -, mas faltam recursos humanos para um contacto mais frequente. “São Vicente tem cerca de 600 empresas. Com os recursos humanos que dispomos não dá para fazer mais que isso. Mas, se nos tivessem relatado este problema já tínhamos visitado a empresa. E sem qualquer aviso. Vou procurar inteirar-me da situação e tomar as medidas cabíveis. Os sindicatos deviam nos ter pedido para intervir quando souberam do problema”, completa.

O Mindelinsite procurou a empresa para fazer o contraditório, mas esta recusou prestar qualquer informação. Aliás, proibiu determinantemente este site de escrever qualquer notícia sobre a Atunlo, alegando que estamos a prejudicar o nome da unidade com notícias falsas.

Constânça de Pina

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Constanca Pina

Formada em jornalismo pela Universidade Federal Fluminense (UFF-RJ). Trabalhou como jornalista no semanário A Semana de 1997 a 2016. Sócia-fundadora do Mindel Insite, desempenha as funções de Chefe de Redação e jornalista/repórter. Paralelamente, leccionou na Universidade Lusófona de Cabo Verde de 2013 a 2020, disciplinas de Jornalismo Económico, Jornalismo Investigativo e Redação Jornalística. Atualmente lecciona a disciplina de Jornalismo Comparado na Universidade de Cabo Verde (Uni-CV).

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7 Comentários

  1. TEM-SE SIM QUE EXIGIR VESTUÁRIO E EQUIPAMENTOS NECESSÁRIOS PARA ESTE TRABALHO E QUE TAMBÉM TENHAM SALÁRIOS DIGNOS. AGORA TRABALHAR A BAIXAS TEMPERATURAS DADO AO QUE A EMPRESA É NÃO VEJO QUAL É O PROBLEMA.

  2. Tendo em conta a natureza da empresa penso que não se deve centrar as coisa nas temperaturas o problema não é por ai. Agora devem é fazer algum barulho interno e não na comunicação social em termos de vestuário adequado caso não tenham esse requisito.

  3. Ninguém disse que numa empresa destas não se deve trabalhar a baixas temperaturas, por isso, esta não é a questão que está a ser analzada. Ninguém está a exigir temperaturas mais altas.
    O que estão a reivindicar, são das condições que consideram insuficientes para trabalharem nas referidas baixas temperaturas.
    E nisto, estão dentro do seu direito de reclamar.
    Trazer outros assuntos para a discussão, é uma forma enviesada de lhes retirar o poder de discurir os seus direitos.

  4. A participacão do “Cais”, revela e confirma como sempre, os traços identificadores e definidores, o retrato da alma do badiu.

  5. Os Sindicatos tem a confiança dos trabalhadores ? A luta Sindical e’ pra quem entenda de LUTA COLECTIVA .Tanto o representante sindical e o trabalhador tem q cumprir seus deveres e EXIGIR seus direitos .

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