Francisco Assis Martins Antunes, 58 anos, parou de consumir álcool e de fumar, dois vícios altamente debilitantes e exigentes financeiramente que manteve ao longo da sua vida, na força da vontade, com apoio de familiares, membros da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias e dos Técnicos da Delegacia de Saúde da Ribeira Brava, no espaço de seis meses. Este cidadão, natural da ilha de São Nicolau, faz questão de partilhar aqui a sua história, na expectativa de ajudar tantos outras pessoas que estão a enfrentar este desafio titânico.
O Dia Mundial sem Tabaco já vai longe (31 de maio), também o Dia Nacional de Luta Contra o Uso Abusivo do Álcool (1 de julho), mas Francisco Antunes não quis deixar passar em branco os seus seis anos “limpo”. “Deixei de beber no dia 20 de janeiro de 2017. Foi uma estratégia que adoptei porque, para conseguir a vitoria de parar de fumar, primeiro tinha de suspender o consumo de bebidas alcoólicas. Escolhi um dia com alguma referência, Dia dos Heróis Nacionais. Menos de seis meses depois, a 5 de julho, abandonei o cigarro. Eram dois vícios que me acompanharam por longos anos e que tiveram um impacto tremendo na minha vida”, relata este cidadão, orgulhoso deste feito.
Francisco Antunes conta que começou a beber e a fumar quase que em simultâneo, eram ainda muito novo. Mas decidiu deixar de consumir bebidas alcoólicas primeiro porque o cigarro não o forçava a beber, já o álcool despertava o desejo para o fumo. “Foi por isso que decidi parar de usar álcool antes de deixar de fumar. Cada vez que consumia um cálice de aguardente ou outra bebida qualquer, sentia necessidade de acender um cigarro. Era instantâneo. Ao invés de acompanhar a bebida de algum petisco – moreia ou lagosta, por exemplo – preferia fazer um ‘bafa’ com um cigarro.”
Hoje, considera-se também um “herói”, tendo em conta o impacto que deixar de consumir álcool e de fumar teve na sua vida. “Em menos de seis meses consegui abandonar os dois vícios e hoje sinto que sou uma pessoa livre. Ganhei uma nova vida e a minha família passou a viver uma felicidade, que antes desconhecia. Porque por diversas vezes tirei recursos da casa para os vícios.”
Luta diária
Mas esta é uma luta para a vida, segundo Francisco Antunes, até porque passou maior parte da vida nos vícios. “Fumei cigarros e consumi álcool a maior parte da minha vida. No caso do cigarro, fumava mais de um maço de cigarro por dia. Levantava de manhã e era uma das primeiras coisas que fazia.”
Com ajuda da Igreja, que que aconselha seus membros a evitarem os vícios, decidiu mudar de vida. Nos primeiros tempos, ficava alguns dias sem consumir ou fumar, mas voltava depois aos mesmos hábitos. “Comecei a desaminar porque pensei que não conseguiria. Certo dia, eu e um colega da igreja, fixamos uma data para parar de fumar em definitivo e de forma súbita. Senti-me forçado porque, inclusive, assinamos um documento em que me comprometia a nunca mais fumar. Infelizmente, não foi possível.”
Apesar deste percalço, decidiu persistir no seu objectivo. Acordou parar no dia 30 de Abril. Ficava alguns tempos sem consumir, mas recaía no vicio. No dia 1 de maio conseguiu aguentar 12 horas sem fumar mas, no final da tarde, começou a sentir-se indisposto. “A minha tensão arterial subiu e não me sentia bem. Fumei três cigarros ao longo do dia e continuei a sentir mal. Tinha o corpo melancólico durante e a minha tensão arterial não baixava, mas depois que fumei senti-me bem. Entendi que não iria conseguir parar, apesar da minha predisposição. Mesmo assim, não desisti.”
Francisco Antunes conta que decidiu mudar de estratégia. Passou a pesquisar na internet como deixar de fumar e, para sua sorte, encontrou o relato de um ex-fumador que abandonou o vício de forma gradual, estabelecendo uma cronologia em cartões feitos exclusivamente para o efeito. “Decidi adoptar esta experiência e, no dia 2 de maio, comecei por fixar um tempo para fumar um cigarro de hora em hora. Comecei a fumar às 7 horas e fui até às 22 horas. Fumei 16 cigarros naquele dia, reduzindo significativamente a quantidade. Segui esta regra durante uma semana, até o dia 6 de maio”, descreve este cidadão, que decidiu cronometrar e registar toda a sua luta para deixar o cigarro.
Na semana seguinte, aumentou a distância entre um cigarro e outro para uma hora e meia, baixando o consumo diário para 11 unidades. “Começava a fumar das 7h30 até às 22h30. Não sentia ansiedade porque estava empenhado em conseguir parar. Fiquei duas semanas neste ritmo e, na quarta semana, aumentei para duas horas o espaço de um cigarro para outro. Fumava então das 8h às 22 horas, um total de oito cigarros por dia”, diz, lembrando que antes fumava cerca de dois maços de cigarros por dia, e agora apenas oito. Agora dois maços cobriam de segunda a sexta-feira.
Travado nos oito cigarros
Entusiasmado com este progresso, Francisco equacionava continuar a baixar sistematicamente, até chegar aos zeros cigarros. Infelizmente, conta, ficou travado nos oito cigarros e não conseguia de forma nenhuma reduzir. Continuou a fumar oito cigarros de 28 de maio até 04 de julho. “Determinado, planei o 5 de julho como o dia D, de zero cigarros. Era uma quarta-feira e decidi sair da rotina por cinco dias. Pedi dispensa no meu trabalho, com a desculpa de que pretendia fazer uma terapia. Fui dispensado e, no dia 05 de julho de 2017, até hoje, 10 de julho de 2023, nunca mais fumei um único cigarro.”
Para este ex-fumador, o impacto desta sua decisão foi muito positivo a nível fisico e económico. “Senti-me melancólico nos primeiros dias. Retornei ao trabalho na segunda-feira mais concentrado. Usei uma estratégia que me ajudou enquanto executava o meu plano, que acredito me ajudou. Tinha estabelecido às horas que deveria fumar e, quando batia o horário, mesmo sem vontade, fumava um cigarro. Foi uma forma de mostrar que controlava o meu vício. E deu certo. Desde então estou no controlo.”
A nível fisico, este Francisco Antunes acredita que nunca sentiu diferença porquanto, durante o tempo em que foi fumador, sempre esteve acima do peso. Deixou de fumar continuou igual. Já em termos financeiro, a diferença foi enorme. “Digo sempre que se não tivesse parado de fumar e de beber, hoje não conseguiria prover a minha família. Tenho um salário baixo e nunca ia conseguir alimentar os meus vícios, nos preços praticados tanto nos cigarros, na bebida como nos gêneros alimentícios de primeira necessidade”, confessa, realçando que muitas vezes sacrificou alimentos para comprar cigarros.
Servir de exemplo
Apesar de manter o lema “mais um dia”, Antunes admite que gostaria de servir de exemplo para outras pessoas, que também querem deixar de beber e fumar. “Se eu consegui, outras pessoas também conseguem. No meu caso, fui incentivado por muitas pessoas, sobretudo de um dos membros da minha igreja, que me acompanhou durante o dia em que decidi parar. Passamos o dia inteiro juntos, como forma de distrair a minha mente. Tive apoio também de médicos e de uma psicologa, do meu chefe que me dispensou do trabalho. Hoje estou mais feliz e mais saudável, e a minha família também.”
Seis anos depois e, apesar padecer de alguns problemas patológicos, nomeadamente hipertensão arterial, diabetes e de uma doença neurológica que, segundo o especialista que o acompanha tem origem genética, acredita que está melhor. Por decisão da Junta de Saúde, diz, está afastado do trabalho, mas sente-se saudável tanto a nível espiritual como da sua autoestima. “Se eu não tivesse parado de beber e fumar, não sei qual seria o meu estado agora. Mudei o meu estilo de vida por completo por conta o problema neurológico. Se tivesse de a parar de fumar e beber forçosamente por conta dos meus problemas de saúde, o peso seria ainda maior”, remata.