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Um “Gajo Fudide”

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JOÃO MANUEL VARELA reconhecia o hermetismo dos seus versos: “Escrevo assim porque não posso escrever doutra maneira. A estrutura da minha inteligência, da minha memória e da minha sensibilidade […] fazem-me uma leitura do mundo e de mim que não é simples.”  T. T. Tiofe, 1974

Por: João Henrique Delgado Cruz

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Talvez por isso, o Prémio Camões ficou injustamente longe deste poeta que atravessou o mar destas pequenas ilhas atlânticas. Nas palavras de Alexandre Lucas Coelho, “era um negro greco-latino. Tem toda uma obra por revelar.”

Ilustre filho de um pescador. Morreu em sua casa, Mindelo, depois de brilhar pelo mundo. Poeta e homem multifacetado, os de casa chamavam-lhe Djon. Os da ciência chamavam-lhe Varela. Os da literatura chamavam-lhe Timóteo Tio Tiofe, G. T. Didial e, principalmente, João Vário. 

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O sobrinho recorda-o como “um homem extraordinário, de raciocínio quase infinito quando tinha interlocutor”.  Para Germano Almeida que conviveu com ele de perto era um “Gajo fuudide”.

Deixou três frases fortes que ainda fazem escola entre nós:

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1. “Não se pode ser culto e manhento ao mesmo tempo, excepto o diabo por deformação profissional”.

2. “Em Cabo Verde aplica-se o princípio de mais valia inversa, mais pior melhor”.

3. “Em Cabo Verde existe três tipos de gente: 

(1) passadores de pau;

(2) matadores do burrinho do bispo;

(3) discutidores de merdinhas enfeitadas”.

Presto homenagem a este Homem desconhecido por muitos e incompreendido por outros, mas, com certeza, uma das MENTES mais BRILHANTES do Mundo Lusófono.

Eis um excerto do poema “Meia-noite todo o dia”.

E todas as coisas jazendo sobre o pavor da

boca,

hoje finitas ou nossas, amanhã paralelas ao cordeiro

de deus, magníficas,

como sabemos soprar sobre estas achas enquanto velhas,

todas estas coisas que chegam e não sabem como partir,

como sabemos nós evitar o azedar do leite,

ah todas estas fábulas mesmo com o galo molhado

este pão ou este galho com o seu esperma,

tal como não sabemos como a cabeça tocará o pó,

se de leste, de oeste, se lentamente ou

despedaçando-se, rápida, sobre o passado de Édipo,

e vimos os mesmos dias mas sem os mesmos óbolos,

fugindo de tectos malignos ou de areias vis,

e, porque vamos perdendo este dom da terra,

não há melhor fidelidade em toda esta prova

qua a que vem com a simples veemência, 

a desdita de ficar com a boca de outrem,

impassível entre duas chegadas,

mudando a pele dos joelhos

ou deixando o sexo abrir

essa angústia divina, esse sarcófago bento.

Somos, por certo, o que esperam as coisas todas:

nem isto nem aquilo, apenas as melhores trevas.

de Exemplo Relativo (1968) em Exemplos.

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Constanca Pina

Formada em jornalismo pela Universidade Federal Fluminense (UFF-RJ). Trabalhou como jornalista no semanário A Semana de 1997 a 2016. Sócia-fundadora do Mindel Insite, desempenha as funções de Chefe de Redação e jornalista/repórter. Paralelamente, leccionou na Universidade Lusófona de Cabo Verde de 2013 a 2020, disciplinas de Jornalismo Económico, Jornalismo Investigativo e Redação Jornalística. Atualmente lecciona a disciplina de Jornalismo Comparado na Universidade de Cabo Verde (Uni-CV).

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