Cabo Verde, enquanto nação pertencente a este planeta, naturalmente, enfrenta os mesmos desafios globais que impactam direta e indiretamente a nossa vida quotidiana, não fosse este um país de desenvolvimento médio, de baixo rendimento, ainda dependente de ajudas externas onde a importação de bens determina os preços e o consumo.
Por Nelson Faria da Conceição
O Fórum Economico Mundial no Relatório de Riscos Globais de 2023, 18ª Edição, prevê como principais riscos globais nos próximos dois anos, 2023 a 2025, um conjunto de situações interconectados que conseguimos visualizar e vivenciar que condicionarão as nossas vidas, além de razões e decisões internas, ligadas ou não a estes fenómenos, também relevantes. Foram indicados como principais riscos globais os seguintes:
1. Crises com o custo de vida – o aumento da inflação, os déficits de oferta de energia e de alimentos, os condicionamentos com cadeias de transporte impactarão no poder de compra e na capacidade de consumo dos indivíduos e agregados familiares;
2. Desastres naturais e eventos climáticos extremos – de cheias, a secas, terramotos, erupções vulcânicas, sismos, são vários os fenómenos naturais e resultante das alterações climáticas que condicionam a vida dos seres humanos, particularmente nos pequenos estados insulares como é o caso de Cabo Verde.
3. Confrontos geopolíticos e geoeconómicos – as guerras fazem parte da história e do percurso da humanidade, não que deva ser normalizado, pelo contrário, entretanto algumas, pelos países envolvidos, pelos impactos que têm condicionam a ordem mundial e o seu quotidiano, como é exemplo o da guerra da Rússia e Ucrânia que tem subordinado o andamento da vida nos tempos de hoje.
4. Falha na mitigação da mudança climática – a transição energética e mudança de práticas humanas que tem contribuído para as alterações climáticas tem-se mostrado difícil pelo custo dessa transformação e por outros interesses. Apesar de muito se falar em medidas a serem adotadas, poucos avanços significativos e concretos têm-se registrado.
5. Erosão da coesão social e polarização social – o andamento das democracias, a conjetura vivida tem levado que os extremos sejam cada vez mais evidentes e atuantes, provocadores de fissuras sociais resultante da polarização das sociedades, perdendo equilíbrio e sensatez necessários para soluções cooperantes. O Brasil e os Estados Unidos são dois grandes exemplos, porém em menor escala, em outras nações é também facilmente identificável este fenómeno.
6. Incidentes de dano ambiental em larga escala – o desmatamento da Amazónia e a exploração desmedida de recursos e matérias primas em países africanos são apenas exemplos de ações que impactarão com o ecossistema global.
7. Falha na adaptação à mudança climática – as migrações forçadas por razões ligadas às alterações climáticas poderão levar a um aumento significativo de migrantes em situação de vida completamente diferente das que sempre tiveram, podendo gerar situações de tensão por inadaptação. Da mesma forma, o funcionamento articulado do planeta deverá contemplar essas alterações na sua atividade e interação, o que não se configura fácil até porque ainda é visível a negação ou mesmo o desinteresse por este tema por parte de decisores políticos e não só.
8. Crises cibernéticas difundidas e cibersegurança – num mundo digitalizado são cada vez mais os relatos de crimes cibernéticos cometidos, uns com mais outros com menos impactos, sobre pessoas, empresas e o próprio Estado. Pelo contexto e pela natureza da nossa vida ligada a tecnologia, é previsível que esta ameaça ainda continue a pairar no espectro global.
9. Crises de recursos naturais – da exploração excessiva à consequência das alterações climáticas, os recursos per si limitados tenderão a revelar-se exíguos para a procura.
10. Migração involuntária em larga escala – se antes registámos grandes campos de refugiados derivados das guerras e outras situações sociais, atualmente tendemos a ter migrantes resultantes também das alterações climáticas. Este cenário poderá agravar condições possíveis de acolhimento, podendo colocar em causa a dignidade humana.
Estes fenómenos estão interconectados e, certamente, afetarão a nossa vida, pelo que requer resiliência, lucidez e sensatez nas comunicações e ações que tomamos, individual e coletivamente. Por isso, neste cenário, estranha-me ver posicionamentos excessivamente otimistas, irrealistas até.
Não que não se deva “esperar o melhor, preparando para o pior”, contudo, no meu ponto de vista, chega a ser caricato propalar “o maior crescimento económico do país”, neste momento, baseado na reformulação do cálculo do PIB e na retoma após pior recessão de sempre no período das restrições da COVID -19, quando na prática, no dia-dia das pessoas, a constatação será o piorar das condições de vida pela redução do poder de compra.
O meu apelo é de que todos nós tenhamos noção do mundo que vivemos, com lucidez e sensatez, procuremos mais consensos, maior cooperação em vez de competição, melhorar a nossa solidariedade coletiva com base na verdade e no acolhimento da diferença, na procura e implementação de soluções que permitam ultrapassar esta fase. Os egos e as vaidades não cabem neste tempo, muito menos os mesquinhos interesses individuais e de corporação.