A cidadania italiana está novamente no centro do debate entre os partidos do governo e da oposição, em todos os meios de comunicação em Itália. No dia 19 de Agosto, neste jornal foi publicado um artigo sobre os dois modelos da cidadania: ius soli e ius scholae, respetivamente do partido democrático (P.D.) na oposição e Forza Italia (F.I.) partido do governo.
Por – Maria de Lourdes Jesus-
O primeiro modelo defende a tese de quem nasce em Itália é cidadão italiano. O segundo entende atribuir a cidadania só aos filhos de imigrantes menores, após 10 anos de estudos e com bons resultados. Do primeiro modelo já não se fala, por agora. O segundo, cuja proposta ainda não foi apresentada no Parlamento está a competir com a potência e a determinação da nova proposta para a mudança de uma parte da lei de cidadania italiana, através do Referendum.
Quem são os promotores do referendum
Essa iniciativa foi apresentada pelo partido “+ Europa” (Mais Europa). Um pequeno partido, que obteve nas últimas eleições europeias 2,9% dos votos e com apenas dois deputados no Parlamento italiano, lançou o referendo para modificar a lei de 1992, n° 91, em matéria de cidadania italiana. Trata-se de reduzir de 10 a 5 anos de residência necessária para avançar o pedido da cidadania italiana. A dinamizar o debate e a mobilizar a população para a votação do referendo serão os partidos da esquerda, associações em defesa dos direitos dos imigrantes, os intelectuais, a sociedade civil, personalidades da cultura, espetáculo e desporto que aderiram em massa ao projeto.
Segundo os promotores, o referendo é um desafio lançado no dia 6 de Setembro. A proposta incendiou o debate sobre a cidadania italiana que estava quase a desaparecer nos meios de comunicação. Entre 20 dias da apresentação pública, o referendo atingiu o quórum previsto de 500mil assinaturas recolhidas nas praças e “online”, através da plataforma do Ministério da Justiça. No dia 30 de Setembro, o último dia de recolha, as assinaturas atingiram 637.487.
Do Referendo à votação
Segundo um dos promotores, Filippo Miraglia (responsável da emigração da ONG ARCI,) neste momento as assinaturas do Referendo estão a ser examinadas pelo Tribunal de Cassazione e entre 31 de Outubro deveria pronunciar-se. Caso for afirmativo, caberá ao Tribunal Constitucional determinar, até 10 de Fevereiro de 2025, a admissibilidade do referendo. Se assim for toca ao governo convocar as eleições entre Primavera do próximo ano para a votação do quesito referendário.
Vantagens da cidadania
A redução de 10 a 5 anos para adquirir a cidadania representa uma grande mudança na vida de muitos imigrantes e dos seus filhos. Trata-se, segundo as estimativas de cerca de 2,5 milhões de pessoas, que uma vez obtida a cidadania italiana, será automaticamente transmitida aos filhos menores.
Para os jovens significa sentir-se oficialmente reconhecido como cidadão e parte integrante da sociedade italiana, poder sonhar, programar e projetar no futuro sem limitações de fronteiras, poder participar nos programas de estudos no exterior, poder representar a Itália em competições desportivas sem restrições, direito de voto, acesso às competições públicas como os demais cidadãos italianos.
Direitos negados até hoje
Para Itália significa: pristina a Lei anterior a 1992 que exigia somente 5 anos de residência como um dos requisitos para obter a cidadania italiana; adequar-se aos “standards” adotados na maioria dos países europeus; transmitir uma imagem positiva na Europa, sustentada por uma nova política a favor da integração dos imigrantes e de cooperação nessa área geográfica. E por fim significa favorecer o incremento dos dados demográficos e o crescimento do sistema pensionistico em crise financeira.
Obstáculos ao referendo
O percurso do referendo é longo e com obstáculos no seu caminho. O primeiro é o poder do governo de modificar a lei da cidadania italiana, através do decreto-Lei, evitando assim de convocar as eleições sobre o quesito* do referendum. Seria uma derrota total dos promotores e dos partidos da oposição e uma clara manifestação da política do governo italiano orientada verso os partidos da extrema-direita em matéria de imigração a nível europeu.
Segundo obstáculo: A opinião dos votantes. No dia 29 de Setembro, foi publicado uma sondagem no jornal “La Stampa”, onde a maioria dos italianos (52,4%), com direito de voto, é contra a mudança da lei sobre a cidadania. Somente 35,6% declararam a favor.
Limitação do referendum
Não obstante o referendo interessa 2,5 milhões de imigrantes, os debates nos média, excluíram quase completamente os protagonistas. Os entrevistados e convidados são exclusivamente políticos e cidadãos italianos. Essa política discriminatória relativamente ao mundo de emigração já não pode ser tolerada num país que se define democrático. O referendo é para reduzir de 10 a 5 anos de residência para obter a cidadania italiana. Mas não é suficiente porque excepto a redução dos anos de residência, os restantes requisitos da Lei da cidadania italiana permanecem inalterados.
Temos em Itália muitos patrícios, pessoas honestas que vivem, trabalham com filhos e netos, mas até agora não conseguiram obter a cidadania, devido aos requisitos difíceis de atingir. Por exemplo: é suficiente que a renda anual, que aumenta em base à composição da família, seja declarada insuficiente para bloquear todo o percurso da cidadania. Não só. Quem não consegue superar a prova escrita e oral de três exames de língua italiana (oral e escrita), história e geografia deste país, com bons resultados, vai ter que recomeçar novamente todo o percurso para a aquisição da cidadania italiana. Razão que levou muitas pessoas a desistirem do pedido da cidadania, porque não é um direito, mas sim uma concessão que tem um custo muito alto em termos da dignidade da pessoa.
*Quesito é a proposta do referendo, mas a tradução em português é “questão”, mas não é o mesmo significado.