O Banco de Cabo Verde confirma que o processo dos leilões do Instituto Nacional de Previdência Social não foi transparente e é passível ser anulado pelas entidades competentes. Esta reação do BCV surge em resposta a uma reclamação subscrita pela maioria dos bancos que participaram do processo e que alegaram desconhecimento do regulamento do concurso, do racional para a escolha dos rádios elegidos e da sua ponderação. O banco central mostra-se, igualmente, preocupados com os riscos para o sistema financeiro, tendo em conta a natureza do INPS.
De acordo com o comunicado emitido pelo BCV, este considera legítima e procedente a reclamação feita pela maioria dos bancos que participaram do primeiro leilão, realizado em dezembro de 2023. Isto porque, instado para tal, o INPS recusou disponibilizar o regulamento dos leilões, assim como não partilhou, previamente, a fórmula de cálculo da avaliação das propostas. “Este procedimento pode ser objetivamente qualificado como falta de transparência e que não se mostra razoavelmente compatível com licitações promovidas por qualquer entidade, sobretudo quando ela é de natureza pública”, refere.
Entende o banco central que a falta de acesso prévio ao regulamento e à fórmula de cálculo não permite aferir com segurança a legitimidade dos resultados. Mas o mais grave, afirma, é que a fórmula de cálculo para a avaliação dos riscos dos bancos participantes não se mostra correta, visto que três das quatro variáveis não foram normalizadas em escalas comparáveis, resultando no enviesamento dos resultados. “O BCV procedeu a vários cenários, com diferentes técnicas de normalização de dados, e concluiu que os resultados são sensíveis à escolha da técnica utilizada, levando, nalguns casos, à “seleção adversa”, ou seja, os bancos com maiores fundos próprios seriam preteridos”, sublinha.
Afirma ainda que se não tivesse atuado em tempo útil, corria-se o risco de, num curto espaço de tempo, ocorrer a desmobilização de depósitos no montante de 3,5 mil milhões de escudos cabo-verdianos de alguns bancos para um único banco que beneficiaria dos pressupostos/critérios considerados para o apuramento dos resultados dos leilões. “Este facto seria suscetível de acarretar impactos negativos nos principais indicadores prudenciais de alguns bancos”, pontua, realçando que constatou ainda que foram introduzidas novas regras de rateio a meio percurso, incorporadas na carta-convite do 2º leilão, as quais não constam do Regulamento, o que corrobora as conclusões de transparência.
Questiona, por outro lado, a racionalidade económica subjacente à escolha de determinados indicadores prudenciais utilizados pelo INPS no processo de leilões, sobretudo quando favorecem determinados modelos de negócio, o que não promove o tratamento igualitário entre os diferentes participantes. “Determinados indicadores selecionados sequer permitem captar os riscos intrínsecos associados ao perfil de risco dos bancos participantes, como o risco de liquidez, de concentração de depósito, de contraparte e de contágio. Ademais, as instituições de crédito são reguladas e supervisionadas pelo Banco central, nos termos do mandato que a Lei lhe confere, pelo que as decisões de clientes bancários deverão ser tomadas com este conforto.”
Afirma que se o objetivo dos leilões era a rentabilidade dos fundos do INPS, sem descurar da avaliação de risco, o que é compreensível e legítimo, o peso atribuído à componente dos rácios prudenciais mostra-se inadequado, tendo em conta que os bancos participantes apresentam indicadores dentro dos limites regulamentares e de referência definidos pelo BCV. Por outro lado, adverte, os leilões ou iniciativas semelhantes devem proporcionar a igualdade de tratamento às instituições participantes, e basear-se em procedimentos objetivos e transparentes,sendo assim, recomendável uma concertação prévia com a Autoridade de Regulação e Supervisão do sistema financeiro na definição das regras de futuros leilões, de forma a acautelar eventuais impactos negativos para o sistema financeiro.
Por tudo isso, entende o BCV que o processo de leilões, designadamente tendo em conta a violação do princípio da transparência, é passível de anulação. De recordar que os leilões do INPS estão suspensos, por determinação do Governo, após a reclamação efectuadas pelos bancos participantes e das criticas contundentes feitas pela secretaria-geral da UNTC-CS sobre o alegado sequestro de 150 mil contos pertencentes ao Instituto Nacional de Previdência Social pelo Banco Cabo-verdiano de Negócios.