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Simetec frustrado com “soluções prévias” para reforma dos marítimos apresentadas pelo Governo: “Há um retrocesso” 

O Sindicato de Metalomecânica, Transportes, Turismo e Comunicações (Simetec) saiu frustrado e chateado do encontro com o Governo em que se apresentou  as “soluções prévias” encontradas para a reforma dos marítimos em Cabo Verde. É que, segundo Tomás Aquino, o Governo propõe criar um quadro de reforma antecipada no sector privdo para enquadrar os marítimos, quando já existe uma deliberação do Conselho de Concertação Social à espera de implementação. “Trata-se de um retrocesso e não vamos aceitar”, afirma o presidente do Simetec. Já o ministro do Estado, da Família, Inclusão Social e Desenvolvimento, Elísio Freire, fala em avanço importantíssimo.  

Aos jornalistas, Tomás Aquino confirmou que saiu insatisfeito do encontro porque há um ano o Simetec esteve reunido com o Ministro do Mar à procura de uma solução para a redução da idade de reforma dos marítimos. Na altura, disse, Abraão Vicente assumiu o compromisso de procurar os dados relativos aos impactos que esta decisão teria no sistema financeiro e a responsabilidade do Estado. “Por isso, a expectativa para este encontro era terem respostas concretas. No entanto, apesar de o Governo ter trazido uma equipa robusta, constituída pelos ministros do Mar, da Família e da Modernização, e ainda o Secretário de Estado das Finanças e o presidente do Instituto Nacional da Previdência Social, ficou claro que foi mais uma dilação. Ou seja, mais uma vez o processo vai ser adiado”, desabafa este sindicalista. 

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 A única decisão efectiva produzida por este encontro, que se alongou por mais de duas horas, foi o compromisso de se voltarem a reunir dentro de um mês e meio, com os dados concretos sobre o impacto da idade de reforma na Segurança Social ou no Tesouro do Estado. “Vamos aguardar, mas devo dizer que os sindicatos e os marítimos estão cansados deste processo, que se arrasta há 30 anos. E agora o Governo apareceu com a ideia de criar um quadro de reforma antecipada para o sector privado. Trata-se de um retrocesso e não vamos aceitar porque há uma deliberação do Conselho de Segurança Social e vários outros ao longo destes 30 anos a dizer ao Governo para implementar a redução da idade de reforma para o sector marítimo, o que não foi feito. Não vamos esperar para o quadro legal da redução da idade de reforma no sector para ver esta implementação.”

Questionado se, ao pedir para participar no levantamento dos dados sobre o impacto desta medida, o Governo não estará a passar a bola, Aquino admite que, de facto, a intenção pode ser envolver e comprometer o sindicato. Mas, no caso, afirma, o que os sindicatos estão a pedir é a implementação de uma decisão já tomada. “Sobre os estudos de impacto, é o Governo, o INPS e o Instituto Marítimo e Portuário quem têm os dados e os técnicos. É lógico que podemos colaborar. Vamos falar com os marítimos sobre a proposta do governo e aguardar para voltarmos, dentro de um mês, a esta questão.”

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Sobre a alegada informalidade existente no sector, este dirigente sindical defende que existe uma grande confusão. “Não existe informalidade no sector marítimo. Infelizmente, não tivemos a oportunidade de explicar esta questão aos ministros devido ao adiantar da hora. Os marítimos nacionais que não estão inscritos na Segurança Social é porque estão fora do país. Querem se inscrever, mas não existe no país um quadro legal para isso. O Governo diz vai trabalhar para regularizar esta situação, mas ouvimos isso há muito tempo. Estamos a insistir na questão dos marítimos que trabalham no estrangeiro desde 2014. Há 10 anos que estamos a pedir ao INPS/Governo para criar um quadro legal para que estes marítimos possam se inscrever aqui no país para que possam ter Segurança Social para os familiares e, quando da reforma, terem uma pensão”, sublinha.

Exibição de video do trabalho do marítimo durante operação de bunkering

Para Tomás Aquino, uma decisão evitaria o cenário aventado pelo ministro Elisio Freire, que referiu a reforma desses marítimos pela via da pensão social. “Não é admissível e nem aceitável para um profissional que quer contribuir para o sistema de Segurança Social, e não consegue. Depois levantam a questão da sustentabilidade do sistema. Querem alargar a base do sistema contributivo e os marítimos querem se inscrever, mas não se cria o quadro legal para isso. Depende exclusivamente da vontade do Governo fazer a legislação para que os marítimos possam contribuir para a Segurança Social no país.”

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Solução prévia: Alteração da lei 

O ministro da Família e Inclusão Social insiste que foram sim apresentadas “soluções prévias” sobre a reforma dos marítimos, citando como exemplo a proposta de alteração à lei que vai permitir que haja um regime de reforma antecipada no sector privado. “O nosso sistema de Segurança Social é único e temos de criar o regime de reforma antecipada no sector privado. O Governo já tomou a decisão de fazer esta alteração na legislação”, revela o governante, acrescentando que só a partir de então é que se poderá falar do processo de reforma antecipada dos vários sectores de atividades em Cabo Verde.

Na sua perspectiva, no encontro de ontem foi dado um passo decisivo para se resolver a questão da reforma antecipada dos vários sectores de atividades, marítimos incluídos. Mas também dos jornalistas, dos pedreiros e demais pessoas que trabalham na construção civil, na aviação aérea, nos transportes marítimos, rodoviários, enfim, nas vºarias áreas de atividades. “Estamos a abrir um campo para podermos ter de facto uma solução adequada e que queremos seja justa.”

Segundo Fernando Elísio, o Governo trabalha para o interesse geral, ou seja, para que as acções e as políticas de segurança social sejam justas e adequadas para todos os cabo-verdianos. Confrontado com o facto dos dois cenários de reforma antecipada apresentados pelo INPS – dedução de cinco anos à idade normal de reforma com uma penalização de 2% por cada ano (10% nos cinco anos), e dedução de até cinco anos com penalização na taxa de formação anual da pensão, variando gradualmente de 2 a 1,5% – terem sido rejeitados liminarmente pelos marítimos presentes e pelo Simetec, o ministro limita-se a dizer que a discussão de cenários financeiros só tem sentido com alteração da lei.

“Sem a lei, estes cenários caem todos por terra. Portanto, o que vamos fazer é alterar a lei e só depois avançar com os cenários”, tranquiliza, desafiando as partes a fazerem, entretanto, uma comparação com outros países. “Como é em países com sistemas de segurança social evoluídos? Como é que se fazem as reformas antecipadas? E só depois de trazermos para dentro podemos reivindicar algo que, eventualmente, pode não estar tão adequado à nossa realidade económica e social. O que garanto é que o Governo tem a obrigação de defender o interesse geral”, pontua.  

Sobre as três décadas em que a questão vem se arrastando, Freire refere que há 30 anos era um estudante de economia por isso não consegue explicar porque só agora se está à procura de uma decisão. O governante prometeu reunir-se com os armadores e analisar os números, tendo em conta que uma parte ínfima dos marítimos nacionais estão inscritos.

“Ouviram aqui os números: 1.600 marítimos dados do INPS, 2.093, dos Sindicatos, com apenas 600 inscritos. Estes coincidem em uma verdade, a maior parte não está inscrita no sistema de Segurança Social. Agora pergunto se isto é normal? Temos de trazer também para a mesa das negociações os empregadores para que o sistema possa ganhar robustez. Tem de ser uma negociação entre sindicatos, governo e entidade empregadora.”

Sem prazo de conclusão

Instado a precisar para quando a conclusão deste processo, o ministro lembrou o processo de alteração a lei está a arrancar. Disse que o INPS se comprometeu a disponibilizar os números definitivos dentro de um mês, mas a legislação leva o seu tempo. “Depende do Governo, da Assembleia Nacional e do Presidente da República. Não nos comprometemos que em um mês teríamos a legislação. Fui muito transparente quando disse que dificilmente há um processo de reforma antecipada nestes termos de um dia para outro”, enfatizou. Relembra o ministro que a legislação da reforma da Segurança Social tem o seu tempo próprio e precisa ser cumprido. Deste modo não se comprometeu com nenhuma data porque, diz, esta reforma exige negociação, envolvimento do Governo, dos sindicatos e das entidades patronais até a sua concretização. “O que vamos fazer é, o mais rápido possível, trabalhar para termos esta legislação”, respondeu.

De referir que, a par da redução da idade de reforma para os marítimos, Aquino várias questões pendentes, que não foram abordados por causa do adiantar da hora. A titulo de exemplo, destacou a grelha salarial e a carreira contributiva de muitos marítimos que, afirma, não deram entrada no INPS, sendo que descontaram para as Caixas Sindicais. “Estes documentos desapareceram no INPS. Antes os anos de contribuição para as Caixas Sindicais eram calculados para efeito de reforma. Mas, de uma hora para outra, o instituto resolveu suspender o processo. Existiam em Cabo Verde na década de 1970 duas Caixas Sindicais, sendo uma dos trabalhadores do comércio e outra dos marítimos. Com a criação do INPS, o Governo, através de uma decreto-lei, extinguiu as Caixas e integrou todo património, incluindo os trabalhadores no então Instituto de Seguros e Previdência Social (ISSP)”, conta.  

Durante muitos anos, prossegue, o INPS calculou a reforma dos marítimos, incluindo os anos de desconto para as Caixas Sindicais. Deixou de calcular os descontos dos marítimos para reforma, mas manteve os dos trabalhadores do comércio, alegando que os documentos desapareceram. “São documentos que deram entrada no instituto, junto com o dinheiro que havia, mobiliário e trabalhadores. Esta é uma questão pendente que temos de resolver. E tudo indica que vai ser por outras vias.”

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Constanca Pina

Formada em jornalismo pela Universidade Federal Fluminense (UFF-RJ). Trabalhou como jornalista no semanário A Semana de 1997 a 2016. Sócia-fundadora do Mindel Insite, desempenha as funções de Chefe de Redação e jornalista/repórter. Paralelamente, leccionou na Universidade Lusófona de Cabo Verde de 2013 a 2020, disciplinas de Jornalismo Económico, Jornalismo Investigativo e Redação Jornalística. Atualmente lecciona a disciplina de Jornalismo Comparado na Universidade de Cabo Verde (Uni-CV).

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