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ARAP promete analisar e agir em conformidade sobre denúncia de “concorrência desleal” na CM da Ribeira Grande de Santo Antão

A Autoridade Reguladora das Aquisições Públicas – através da Direção de Regulamentação, Formação e Acreditação – afirma que está a analisar a denúncia feita por arquitetos, através de uma reportagem do Mindelinsite, em que estes diziam estar revoltados com a “concorrência desleal”, supostamente praticada pelo vereador do Urbanismo e pelo director do Gabinete Técnico da Câmara Municipal da Ribeira Grande de S. Antão. Perante os factos, a ARAP promete agir em conformidade. 

Decorrido cerca de um mês sobre a data da publicação da reportagem, a ARAP respondeu, finalmente, as questões enviadas pela reportagem do Mindelinsite. Começou por dizer que está perante uma denúncia que terá de analisar e assim agir com base legal.  “Do ponto de vista legal, o artigo 12.º, n.º 3 do CCP, permite a aplicação da lei geral sobre impedimento e suspeições dos titulares de órgãos públicos e de funcionário da administração pública, como forma de garantia de imparcialidade dos membros e funcionários das Entidades adjudicantes, as entidades responsáveis pela condução do procedimento, do júri ou de quaisquer entidades intervenientes no procedimento”, afirma. 

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A entidade reguladora cita ainda o artigo 70.º, n.º 1 alínea c) que, afirma, impede a participação nos procedimentos a quem se encontra impedido nos termos da lei. “O Código dos Procedimentos Administrativos, CPA, no artigo 67.º impede a participação de titulares de órgão da administração pública e os respetivos funcionários ou agentes, bem como quaisquer outras entidades que, independentemente da sua natureza, se encontrem no exercício de poderes públicos. Estes não podem intervir em procedimentos administrativos ou em atos ou contratos de direito público ou privado em que administração pública seja parte, quando nele tenha interesse, por si, como representante ou como gestores de negócios de outra pessoa”, reforça a ARAP.

Tudo isso para concluir que, se a denúncia se confirmar, o processo culmina com a nulidade do ato/contrato, constituindo o prestador no dever de indemnizar a Administração Pública e terceiros de boa-fé pelos danos resultantes da declaração de nulidade do ato ou contrato. Ou seja, nestes casos, os prejudicados devem impugnar o ato ou contrato. “Nos termos do CCP, esta prática configura uma contraordenação muito grave, punível com coima de 50 a 75 contos ou de 100 a 300 contos, consoante seja aplicada a pessoal singular ou coletiva, conforme prevê o artigo 189º nº1, alínea a) do CCP”, ajunta.

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Para o efeito, diz a ARAP, é necessário averiguar por meio da auditoria para efeito de constatação do fato e recolha de provas. Em caso de matéria da concorrência, cabe a Autoridade da Concorrência assegurar a aplicação das regras de promoção e defesa da concorrência nos sectores privados, público, cooperativo e social no respeito pelo princípio da economia de mercado e de livre concorrência, tendo em vista o funcionamento eficiente dos mercados, a afetação dos recursos e os interesses dos consumidores, nos termos previstos na lei e nos presentes estatutos. No caso, cabe ao privado lesado denunciar a situação, com vista a assegurar os direitos e interesses legalmente protegidos.

Denúncia de arquitectos

De recordar que, na denúncia em causa, os arquitetos acusam o vereador e o director de Gabinete da CMRG de elaborar projectos particulares e participar nos concursos lançados pela própria edilidade, através das suas empresas. Lembram ainda que tanto o autarca como o responsável técnico são depois chamados para aprovar estes projetos, num processo em que “jogam e apitam”.

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Socorriam, por outro lado, do Estatuto da Ordem dos Arquitetos, mais precisamente o artigo 81, sobre as incompatibilidades, que diz que “o exercício liberal da profissão de arquiteto ou de urbanista é incompatível com as funções de titular de órgãos de soberania, assessores, membros ou agentes contratados dos gabinetes.” Para os arquitetos denunciantes, este artigo é muito específico sobre a impossibilidade tanto do vereador como do director de Gabinete elaborarem e assinarem projectos. 

Ainda na denúncia, realçavam que este artigo é reforçado também com as alíneas subsequentes, onde referem que tanto o presidente como o vereador a tempo inteiro ou parcial, e ainda o diretor-geral ou membro do Conselho de Administração das empresas públicas, não podem assinar projectos. A estes juntam ainda os membros dos gabinetes das Câmaras Municipais e quaisquer indivíduos ou departamentos públicos independentes da designação que, junto das entidades, desenvolvam atividades relativas à apreciação e aprovação de projetos de arquitetura.

No caso, por conta das suas funções, entendiam estes arquitetos que o vereador de urbanismo e o diretor do gabinete têm acesso antecipadamente e, muitas vezes, acabam por interceptar os projectos. “É preciso lembrar que muitas vezes os projectos são da Câmara Municipal e liderados pelo vereador. Tanto ele como o diretor técnico são os responsáveis pela aprovação dos mesmos. Fazem os projetos de arquitetura e de engenheira e posteriormente lançam concurso para realização da obra. No caso, estamos mais interessados na elaboração do projeto do que na sua execução.” 

Por outro lado, afirmavam que os visados, a priori, sabiam quais os projectos que estão em carteira e preparavam-se para quando a Câmara Municipal lançasse uma shortlist, com prazos limitados, e ganhavam vantagem sobre a concorrência.

Na altura, o director do Gabinete da CMRG, o único com quem este jornal chegou a falar, negou ter assinado qualquer projecto particular de arquitectura, mas confessou que a sua empresa elaborou alguns projectos públicos, por solicitação directa do próprio presidente da Câmara Municipal, Orlando Delgado, ou seja, não resultaram de concursos.  

Instado se este projectos foram certificados pela OACV, como manda a lei, o director do Gabinete Técnico explicou que os projectos da CM não carecem deste procedimento porque o presidente é a autoridade máxima no município.

Posição diferente teve o presidente da Ordem, que confirmou o alto nível de incidência de casos similares, em quase todos os municípios de Cabo Verde. Job Amado lamentou, entretanto, a ausência de queixas formais, e com provas. “Sabemos que quem está nas CMs – arquitetos ou directores de serviços -, têm estado a aprovar projetos sem certificação da Ordem“, acusava, sublinhando que todos os projectos particulares de arquitectura devem solicitar um termo de responsabilidade na Ordem antes de darem entrada nas CMs. E este só pode ser emitido após verificação da questão da compatibilidade. 

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Constanca Pina

Formada em jornalismo pela Universidade Federal Fluminense (UFF-RJ). Trabalhou como jornalista no semanário A Semana de 1997 a 2016. Sócia-fundadora do Mindel Insite, desempenha as funções de Chefe de Redação e jornalista/repórter. Paralelamente, leccionou na Universidade Lusófona de Cabo Verde de 2013 a 2020, disciplinas de Jornalismo Económico, Jornalismo Investigativo e Redação Jornalística. Atualmente lecciona a disciplina de Jornalismo Comparado na Universidade de Cabo Verde (Uni-CV).

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