Rami Hamdan acendeu um fogo de artifício e o segurou acima da cabeça. Não tinha noção de que aqueles seriam seus últimos segundos de vida. Em seguida, três estalos. O primeiro foi um tiro de revólver disparado por um policial, o segundo foi o foguete saindo da mão de Rami e o terceiro foi o som do foguete explodindo sobre o corpo do menino, em uma chuva brilhante de tom vermelho.
Rami al-Halhouli era um menino palestiniano de 12 anos de idade. Nasceu e cresceu no campo de refugiados de Shuafat, na região ocupada de Jerusalém Oriental. Lá, moram cerca de 16 mil pessoas. Na noite de terça-feira, 12 de março, estava brincando com seu irmão e seus amigos em frente à casa da família. Eles então pediram que ele acendesse um foguete de artifício.
As forças israelitas dizem que o adolescente atirou o fogo de artifício na direcção da polícia, no campo de refugiados de Shufat, anexada e ocupada por Israel. Relatos de testemunhas coincidem com um vídeo que mostra o rapaz a lançar o foguete – não sendo claro onde se encontram as forças de Israel – antes de ser atingido e cair. Quase 24h depois, Shufat era cenário de confrontos.
“É exactamente assim que devemos agir contra os terroristas – com determinação e precisão”, afirmou o ministro da Segurança Interna, Itamar Ben-Gvir, de extrema-direita, citado pelo jornal luso Público. Mas o governante não se limitou a elogiar o comportamento do agente.
Deslocou-se ao Departamento de Investigações Internas da Polícia (DIPI) para lhe manifestar o seu apoio e agradecer o “trabalho excepcional”, quando este esperava para ser interrogado sobre o ocorrido. “É escandaloso para mim que o DIPI se atreva sequer a convidar o combatente para um interrogatório”, declarou o ministro, num vídeo publicado na rede X e citado pelo The Times of Israel.
“Um terrorista dispara fogos-de-artifício e quer fazer mal aos nossos soldados, aos nossos combatentes, e dispara o fogo-de-artifício… Um combatente vem e faz exactamente aquilo que é esperado”, acrescentou o aliado de Benjamin Netanyahu. “Que o tenham convocado para o questionarem é o maior escândalo”, repetiu, acusando o DIPI de “destruir a dissuasão israelita”.
Ainda segundo o Times of Israel, a procuradora-geral reagiu a estes comentários numa carta enviado ao ministro da Segurança Interna, lembrando que “investigações criminais, incluindo as de oficiais da polícia, são conduzidas com total independência. Qualquer intervenção sua, directa ou indirecta, viola a lei…e deve ser interrompido imediatamente”, sublinhou Gali Baharav-Miara.
Quase 24h depois, ao início da noite de quarta-feira, os media palestinianos começaram a divulgar imagens de confrontos entre residentes de Shufat e forças de segurança de Israel, que terão sido desencadeados por um ataque israelita. A Faixa de Gaza viveu um nível de violência que já não se verificava há vários dias, com pelo menos 88 palestinianos mortos nos ataques israelitas no território, no mesmo período em que seis pessoas (incluindo Rami Hamdan) eram mortas na Cisjordânia.
C/BBC