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Actores do teatro “gritam” em silêncio contra abuso sexual de crianças em Cabo Verde

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Os actores e atrizes de São Vicente do Mindelo fizeram as 12 horas de hoje uma performance artística nas duas principais artérias do Mindelo – Avenida 05 de Julho e Rua de Lisboa – contra o abuso sexual de crianças, mas também para pedir medidas mais severas e para as pessoas denunciarem os prevaricadores. O gatilho para esta acção, que visa chamar a atenção da classe política e dos legisladores para darem um sinal inequívoco de que o abuso sexual crianças é um assunto de Estado e a protecção das crianças um Direito Humano, foi o caso do Paul em que aos seis indivíduos acusados de violação continuada de uma menor foi-lhes aplicados Termo de Identidade e Residência como medida de coacção. 

Trajados de branco e com a boca amordaçada com uma tira de pano também branco simbolizando o silêncio perante este crime hediondo, mais de 50 actores e atrizes do teatro de S. Vicente ocuparam o centro da via na Avenida 05 de Julho e na Rua de Lisboa, misturando com o transito pesado em plena ‘hora de ponta’. Nas mãos traziam cartazes com dizeres elucidativos como “Não seja cúmplice!”, “Abuso sexual não tem desculpa”, “Intolerância total à pedofilia”, “Penas pesadas para abusadores”, de entre outros. Fizeram um cordão em frente ao Palácio do Povo, com os cartazes voltados para a Rua de Lisboa. Depois de uma paragem de 10 minutos para permitir aos muitos curiosos ler e apreender as mensagens, sairam em direcção a Praça do Liceu Velho, onde depositaram os brinquedos e ursos de pelúcia que traziam nas mãos ao redor do repuxo seco. 

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O silêncio era absoluto mas, ao mesmo tempo, ensurdecedor. Mesmo as pessoas que assistiam a performance e os curiosos que faziam fotos e filmagem falavam em sussurros para não quebrar o clima pesado do momento. No rosto dos presentes, a tristeza era visível. Aliás, uma das atrizes não conseguiu conter a emoção e as lagrimas escorriam como lavas pelo seu rosto. Em declarações à imprensa, João Branco explicou que esta acção foi para colocar a classe artística, sobretudo elementos ligados ao teatro, ao serviço de uma causa. “Estamos a chamar a atenção para um problema que mexe com todos. Todos nos temos irmãos, filhos e outras crianças em nossos meios familiares. Não é de hoje que se fala deste flagelo, desde desastre que é o abuso sexual das crianças e adolescentes”, frisou

A título de exemplo, lembra que, em 2011, estreou-se em S. Vicente a peça “Toerema do Silêncio” em que o autor Caplan Neves, se inspirou em um caso de abuso sexual ocorrido em S. Nicolau, envolvendo um professor e alunos. A peça, segundo Branco, teve enorme repercussão, mas continua tudo igual. “Foi há nove anos e ainda estamos a falar da mesma coisa. Temos de perguntar quantas crianças já foram molestadas, tantos adolescentes. E os prevaricadores, abusadores e criminosos que ficaram impunes, ou porque foi-lhe aplicado o TIR como medida de coacção ou porque as penas são leves?”, declara revoltado, apontando o exemplo o caso do Paul, em que um dos acusados é reincidente, mas saiu em liberdade por “bom comportamento”. “É normal uma pessoa com tendência para abusar sexualmente de crianças ter bom comportamento na cadeia porque lá não há menores. A meu ver, não devia ser permitido liberdade condicional para este tipo de crime”

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Mas, o mais caricato é que desde Fevereiro está no Parlamento uma proposta de alteração ao Código Penal onde se propõe um eventual aumento das penas para este tipo de crime. Branco deixa claro que o facto desta proposta estar agendado não significa que o CP vai ser alterado neste aspecto especifico por isso a necessidade de se chamar a atenção e fazer alguma pressão sobre actores políticos porque as crianças precisam ser prioridade absoluta. “A classe política e os legisladores precisam dar um sinal claro e inequívoco de que o abuso sexual de crianças é um assunto do Estado, de Direitos humanos. Da maneira que está não pode continuar”, desabafa, lembrando que pode “o nosso filho ou nosso irmão a passar por esta situação, que acaba com a vida, com a sua inocência e marca uma criança para toda a vida. Não tem reparação um tipo de trauma como este. Então o Estado tem de ver para esta situação”. 

Reagindo ao comunicado emitido pelo Tribunal do Paul a justificar o porque da aplicação de TIR aos acusados, Branco esclarece que a revolta das pessoas e a acção dos atores do teatro não é contra o tribunal. É sim contra a lei que deixa estas pessoas em liberdade, por isso o apelo para o agendamento da proposta de alteração do Código Penal para que as penas sejam mais pesadas. “Precisamos  ter mão pesada porque as nossas crianças precisam ser mais protegidas”, pontuou Branco, que justificou a realização da performance ao meio-dia como uma estratégia para fazer a mensagem chegar a mais pessoas. Este aproveitou para agradecer a pronta adesão e o engajamento dos actores de teatro de S. Vicente nesta acção. 

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Constanca Pina

Formada em jornalismo pela Universidade Federal Fluminense (UFF-RJ). Trabalhou como jornalista no semanário A Semana de 1997 a 2016. Sócia-fundadora do Mindel Insite, desempenha as funções de Chefe de Redação e jornalista/repórter. Paralelamente, leccionou na Universidade Lusófona de Cabo Verde de 2013 a 2020, disciplinas de Jornalismo Económico, Jornalismo Investigativo e Redação Jornalística. Atualmente lecciona a disciplina de Jornalismo Comparado na Universidade de Cabo Verde (Uni-CV).

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